O Seguinte: testemunhou os momentos em que Daniel Bordignon recebeu a notícia de que a justiça eleitoral, após impugnações em 2008 e 2012, confirmou sua candidatura a prefeito, e também conta como foi a festa de lançamento que trouxe Ciro Gomes e o presidente nacional do PDT a Gravataí
Anoiteceu e, quando já estava no quarto cafezinho da tarde de plantão no Fórum, o advogado Cláudio Ávila recebeu a confirmação do que confiava cegamente e o fazia aceitar o desafio de amigos para que quebrasse a carteirinha da OAB se não tivesse sucesso.
A juíza Keila Tortelli tinha uma decisão sobre os pedidos de impugnação de Daniel Bordignon (PDT) feitos pelo Ministério Público, pelo PMDB de Marco Alba, pelo PSB de Anabel Lorenzi e pelo PSD de Levi Melo.
Bordignon estava livre para concorrer a prefeito nas eleições de 2 de outubro.
– Diante do exposto, julgo improcedentes as impugnações apresentadas, com fundamento no artigo 487, I, do CPC, deferindo o registro da candidatura do candidato Daniel Bordignon – dizia o despacho, que também atribuiu às coligações “Gravataí Melhor Para Se Viver” e “Unidos Por Uma Nova Gravataí” a litigância de má fé sobre os pedidos de impugnação – que é quando a Justiça entende que a ação promovida não encontra razão no direito.
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O candidato a vice buscou no celular, quente de tanto falar, o nome do ex-prefeito e clicou.
Desabaram os dois, em lágrimas.
– A justiça foi feita! – repetiam, como um Galvão narrando Ouro, de um lado a outro da linha conectada entre o Centro e o Parque dos Anjos, onde Bordignon aguardava em casa uma decisão, vestindo a jaqueta preta impermeável, comprada por R$ 23 pela esposa Rosane, que usou em mais um dia de campanha e parecia pesar nos ombros as duas impugnações – 2008 e 2012 – das eleições anteriores à Prefeitura.
O sentimento de todos era de que, naquele instante, a campanha eleitoral começava de verdade em Gravataí.
: Cláudio Ávila, Daniel Bordignon e o advogado Viníciu Alves, na casa do ex-prefeito ontem à noite
– Uma injustiça é corrigida. Sempre ajudei aos outros, nunca roubei nada de ninguém – dizia um Bordignon de barba branca, minutos depois, com o rosto vermelho de gringo quando chora muito, ao receber Cláudio no portão de casa, ao lado da filha Danielle e do fiel escudeiro Diego Pereira, coordenador-geral da campanha e companheiro de pelo menos 18h por dia, que ali chorava junto com seu segundo pai.
– Confiei em ti, quando todos desconfiavam, e foste digno de toda confiança. Foi uma dádiva termos cruzado nossos caminhos. Se não fosse por ti, não estaríamos aqui – disse Bordignon, olhando nos olhos de Cláudio e abraçando o jovem advogado, que desde 2009 atuou em causas políticas gigantes como o impeachment da ex-prefeita Rita Sanco, onde era adversário do agora parceiro de chapa e partido, mas que pela primeira teve que tomar rivotril para dormir nos dias que antecederam o julgamento.
– Impugná-lo seria uma aberração jurídica. Foi um duro golpe o pedido infundado feito pelo Ministério Público. Mas ganhamos na boa técnica, sem orquestrações políticas. É o povo quem tem que te julgar – devolveu Cláudio, revelando também em lágrimas uma emoção que guarda para poucos.
O longo abraço na esposa Rosane Bordignon, que apressada pela notícia chegou do dia de campanha a vereadora com a companheira de Cláudio, Natália Fonseca, deu a deixa para largar as taças do vinho Alfredo Roca sobre a mesa, ou ao lado do tabuleiro de xadrez, e correr para a festa, que já bombava no CTG Aldeia dos Anjos.
O desde já candidato a presidente da República Ciro Gomes, herdeiro do estilo e fiel depositário do legado de Leonel Brizola, o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, e o presidente do partido no Rio Grande do Sul, Pompeo de Mattos, estavam lá para lançar oficialmente a candidatura de Bordignon à Prefeitura que, para os trabalhistas, é a mais importante em disputa no Estado.
– É Django livre! – já brincou uma amizade, na chegada ao CTG, lembrando o filme de Tarantino com o qual Bordignon se diverte e gosta de ver e rever com amigos.
Apagava-se ali um filme de terror, estrelado em 2008, naquele mesmo lugar, no mesmo dia do lançamento de Bordignon a prefeito, quando a justiça eleitoral decidiu minutos antes por sua primeira impugnação, num calvário que levou até a renúncia da candidatura a uma semana da eleição. Passados oito anos, e outra impugnação em 2012, Bordignon e muitos que estavam ali, e sofreram esse épico com ele, podiam comemorar uma história de final feliz e enfim responder, sem dúvidas, aos tantos que perguntam, que “sim, teu voto, desta vez, vai valer”.
– Foi muito sofrimento para chegar ao dia de hoje. Agora, a vida fica mais bonita – resumiu Bordignon, sorrindo, antes de subir ao palco e, entre uma comoção de gritos de ordem e batucada da charanga, ser saudado por Ciro:
– Fico honrado de ser o porta-voz dessa notícia. Um homem de bem como tu, Bordignon, não será golpeado. Num momento de trevas, em que tanto desrespeitam a vontade das urnas, em Gravataí será dado ao povo o direito de julgar.
O Seguinte: traz mais 12 da festa:
1.
Com discurso de candidato a presidente, Ciro previu, “com dor no coração”, o aprofundamento da crise no Brasil.
– E quem vai pagar é o povo – alertou o candidato a presidência em 1998 e 2002, governador do Ceará aos 32 anos, prefeito, deputado federal, e, como ministro da Fazenda de Itamar Franco, criador do Plano Real.
Sem palavras bonitas, listou projetos do governo de Michel Temer que já chegaram ao Congresso e, conforme ele, “rasgam a Constituição de 88”.
– O teto de gastos reduzirá investimentos em educação e saúde, e a revogação da CLT permitirá que patrões, ao negociar acordos com empregados, usando o desespero da ameaça de desemprego, cortem férias, 13º, licença maternidade e outros direitos.
2.
Crítico ao impeachment da presidente eleita Dilma Rousseff, aos gritos, o ‘cabra da peste’, pindamonhangabense radicado em Sobral (CE), chamou Temer e os aliados de “golpistas salafrários e traidores da pátria”.
3.
Carlos Lupi, presidente nacional do PDT e ex-ministro de Lula e Dilma, confirmou a importância da eleição em Gravataí também para os planos do partido chegar à Presidência da República.
– Aqui será uma das nossas vitrines!
4.
Entre seus repentes e trovas características, Pompeo de Mattos seguiu a mesma linha:
– A eleição aqui é a mais emblemática para o PDT gaúcho. O povo fundará a República Socialista de Gravataí!
– Temos orgulho de apresentar ao eleitor uma figura histórica como o Bordignon, que trouxe a GM e reconstruiu a cidade.
5.
Miguelina Vecchio, vice-presidente do PDT nacional, ouviu de Bordignon o compromisso de que, eleito, “50% do secretariado e dos CCs serão compostos de mulheres”.
6.
– A única proposta dos nossos adversários era impugnar nossa candidatura. Pois agora o Bordignon é o único que já tem a homologação de seu registro – repetia Cláudio Ávila, a cada intervalo, e logo após lia a decisão da justiça eleitoral.
7.
Quebrando o protocolo, Bordignon surpreendeu ao chamar do público para o palco o ex-vereador José Amaro Hilgert, histórico pedetista e companheiro do falecido ex-prefeito José Mota, mas que até o momento não tinha aderido à campanha.
– Onde está a luta do povo, está o PDT. E onde está o PDT, eu estou. A história não se constrói do dia para a noite – disse Amaro, lembrando a eleição de Mota, “um sapateiro que enfrentou as elites”.
– E aqui temos Ciro, nosso futuro presidente, que do mesmo jeito que o Brizola, diz o que pensa porque não tem rabo preso!
8.
Bordignon lembrou a infância pobre dele, “um menino da roça e do Caça e Pesca”, e de Cláudio Ávila, “criado no Beco do Mijo”, para apontar o que considera “perseguição histórica dos poderosos”:
– Alguns que se acham deuses da cidade não aceitam o governo popular que fizemos e vamos fazer.
9.
Novamente em seu discurso Bordignon lamentou o PT não ter aceitado o convite para estar junto ao PDT e o PCdoB.
– Aqui está unida a esquerda que tem humildade e pensa primeiro no povo.
10.
Também estiveram presentes os deputados Gilmar Sossela (PDT), Adroaldo Loureiro (PDT) e Juliano Roso (PCdoB).
11.
A festa teve também a participação dos 64 candidatos a vereador e os sete partidos da coligação “A Esperança Está Presente” (PDT-SD-PCdoB-PTdoB-PHS-PSDC-PR).
12.
Ao final, em frente ao CTG, ao lado de um banner com a foto e a frase de Brizola “Nossos caminhos são pacíficos, nossos métodos democráticos, mas se nos tentam impedir só Deus sabe nossa obstinação”, Bordignon se despedia de um a um, resumindo o dia:
– Agora a campanha começou.
É isso.