No artigo Justiça e MP emitem nota sobre falta de médicos em Gravataí, publicado sexta, quando o Seguinte: trouxe em primeira mão a manifestação do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) e do Ministério Público do Trabalho (MPT), conclui:
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No mínimo, deu ruído de comunicação entre a Prefeitura, MPT e TRT. A boa notícia da sexta é que se visualiza uma luz no fim do túnel, não só a partir de audiência de conciliação marcada para setembro.
Que a luz não seja a de um trem.
Aguardemos. Se não há concursados querendo trabalhar como médicos da Prefeitura, é preciso uma solução para os joões, marias e cauãs que ficarão com pelo menos mil atendimentos médicos a menos na rede de saúde de Gravataí.
(…)”
Era um trem.
O jornalista Eduardo Torres, do diário Correio de Gravataí, teve acesso ao último despacho dado pela juíza substituta Rachel Albuquerque de Medeiros Mello, que cobre as férias de Márcia Carvalho Barrili, titular da 4ª Vara do Trabalho, sobre a polêmica da proibição de contratações emergenciais que terá como conseqüência imediata a impossibilidade da Prefeitura manter médicos terceirizados.
Pelos cálculos que fiz nos artigos A real sobre a falta de médicos em Gravataí; em 15 dias, o caos, Só justiça evita perda de 45 médicos em Gravataí e Caos na saúde tem data: 1º de agosto; nas mãos da justiça, Gravataí terá a partir desta quinta cerca de mil atendimentos a menos na rede municipal de saúde.
Há coisas sobre as quais não é necessário nem comentar.
Siga a íntegra do despacho, que cita o primeiro episódio de Game of Thrones, ‘The Winter is Coming’, ou “o inverno está chegando”, para desmontar a petição do governo Marco Alba (MDB) que buscava justificar a manutenção de contratações emergenciais.
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Vistos etc.
Inicialmente, cumpre registrar que essa magistrada despacha no presente feito em decorrência das férias da juíza vinculada ao julgamento.
A par disso, assinala-se que referências, na petição do Município, à série de TV Game of Thrones ("O inverno está chegando") não têm lugar na análise da lide. Ainda que possam ser admissíveis como recurso de linguagem em peças publicitárias, por exemplo, não são relevantes e não alterarão o posicionamento do juízo. O inverno tem data de início, no nosso planeta, coincidente com o solstício que ocorre em junho, não sendo necessário relembrar ao juízo acerca desse acontecimento da natureza.
Feito esse esclarecimento, importa salientar a natureza jurídica do presente feito. Com efeito, não se está diante de processo de conhecimento, em que o juízo deve avaliar a legalidade da pretensão do Ministério Público. O presente feito é uma EXECUÇÃO de um título constituído pelo próprio Município de Gravataí junto ao Ministério Público do Trabalho. Nesse passo, desimporta distinguir as administrações que se sucederam no governo, na medida em que o ente federativo permanece com a obrigação que contraiu, ainda que há mais de 10 anos.
Aliás, registro que o Município teve 13 anos para adequar-se ao TAC celebrado com o Ministério Público do Trabalho. Foram 13 anos em que houve inverno – já que ao Município agrada tanto a menção ao inverno – sem que as adequações necessárias fossem realizadas.
A par disso, a decisão cuja reconsideração o Município busca foi proferida em outubro de 2017. Após mais de um ano de inércia, o Município vem aos autos requerer a reconsideração do despacho, sem, contudo trazer fundamentos jurídicos suficientes ao acolhimento de sua pretensão.
Ressalte-se, uma vez mais, que a decisão de 30/10/2017, proferida por essa magistrada, não tem natureza de antecipação de tutela, não está fundada nos requisitos do art. 300 do CPC, não sendo viável sua revogação com base em fatos cuja existência se verifica desde a celebração do TAC exequendo.
O Município, pois, discorre acerca de toda a malha de atendimento médico de sua estrutura, bem como sobre as necessidades atuais da população, sem, contudo, apontar para alguma ação específica no sentido de prover os cargos vagos por meio de concurso, sendo certo que conta com o terceiro melhor PIB do Estado do Rio Grande do Sul. Aliás, o Município não esclarece quando paga para seus concursados e para seus terceirizados e contratados emergenciais, o que poderia esclarecer a dificuldade no preenchimento do cargo. A argumentação de que os concursados aprovados não tiveram interesse em permanecer trabalhando, evidentemente, tem justificativa no valor dos salários pagos aos concursados no município.
O Município também não esclarece, objetivamente, em sua petição de maio de 2019, quantos postos de trabalho estão a ponto de perder seus profissionais e em que data ficariam desguarnecidos por força da presente execução. Aliás, a decisão cuja reconsideração se busca está em vigor desde o final de 2017 e está sendo descumprida desde o final de 2017, não se compreendendo a pertinência de se pretender a reconsideração da decisão desde juízo, sem a ocorrência de nenhum fato idôneo a modificar as premissas em que se baseia a decisão.
Somente em 18/07/2019, o Município vem informar que perderá 64 médicos por força da decisão do presente feito. Decisão, repita-se, proferida no longínquo outubro de 2017 e solenemente ignorada pelo Município.
Os documentos que instruem o pedido de reconsideração do Município não são suficientes a demonstrar a insuficiência dos concursos realizados para o preenchimento das vagas. As listagens juntadas aos autos não contém informações completas e não detém validade oficial.
Da mesma forma, não há nenhum documento relativo ao contrato alegadamente mantido entre o Município e a empresa Serrano, dando conta de data para o término do contrato. Veja-se, por exemplo, o documento ID 96652d0, que não se presta a absolutamente nada. O documento ID 85fc766, por seu turno, sequer indica quem o elaborou, não detendo qualquer validade para o deslinde do processo.
O documento ID 214b4f9, por seu turno, dá conta da enorme rotatividade de médicos atuantes no PAM 24h. Veja-se que há profissionais que, durante o período de um mês, teriam atuado, por, apenas, 12 horas no local, como é o caso de Betina Meazza Oliveira Souza, Camila Penso, Carmem Lucia Gama de Lima e tantos outros médicos. Não são, pois, os 18 médicos pediatras que atuaram no PAM 24h que o município perderia, na medida em que, se houvesse médicos concursados, não seriam necessários 18 profissionais.
Dos 18, apenas o médico Rafael Varela Gonzaga realizou um número de horas de trabalho relevante no período de um mês, superando as 168 horas. Questiona-se, a partir daí, qual foi o valor pago ao referido médico pelo trabalho no período pela empresa Serrano e qual o percentual disso o Município teve que pagar para a empresa Serrado fazer a intermediação. O somatório desses valores, muito provavelmente, é superior ao valor oferecido a um médico concursado em Gravataí. No entanto, essa conclusão não pode ser atestada nos autos, porquanto o Município não juntou documentos idôneos a permitir referida análise pelo juízo.
Muito provavelmente, para cobrir o trabalho dos 18 médicos pediatras terceirizados no PAM 24h, seriam necessários menos de 8, talvez apenas 5 médicos concursados. E tal ocorre com todos os terceirizados da empresa Serrano.
O Município, pois, deve assumir tanto a responsabilidade em relação ao TAC que celebrou como pela escolha de manter contratos emergenciais e contratos com empresas terceirizantes, ainda que, desde 2006, tenha assumido compromisso de assim não proceder.
Causa espécie ao juízo o Município, em alguma de suas manifestações, informar que seus atuais representantes somente tomaram conhecimento da existência do TAC em 2016, na medida em que são mandatários de poderes investidos por toda a população, não sendo possível se excusar de tamanha responsabilidade alegando mero desconhecimento.
Concretamente, esse juízo tem medidas a tomar:
– corrigir o erro material da decisão que fixou a multa em R$1.000,00, para que conste R$100,00 (cem reais).
– acrescer ao decidido que é vigente a exceção prevista no TAC, de possibilidade de contratação emergencial de médicos para enfrentar a rotatividade de profissionais concursados na área da saúde, em quantidade equivalente até 10% do total de médicos vinculados à referida área, seja para suprir necessidade transitória de substituição de pessoal, seja para comportar aumento extraordinário de serviços, conforme cláusula quarta, parágrafo primeiro, alínea "c", do TAC.
Não há, pois, substrato fático à revogação da decisão proferida pelo juízo em outubro de 2017, devendo as partes aguardarem a audiência de conciliação designada ou, ainda, tomarem as medidas processuais que entenderem cabíveis.
Intimem-se.
(…)”
Sobre o despacho, o secretário da Saúde Jean Torman disse que não vai se manifestar. Aguardemos ainda para hoje uma manifestação da Prefeitura sobre como ficará o atendimento a partir desta quinta.