meio ambiente

COM VÍDEO | A nossa lista vermelha da extinção

Pelo menos 20 espécies listadas como ameaçadas de extinção resistem no Vale do Gravataí

Em uma das curvas do Rio Gravataí, o curso antigo forma uma pequena ilha à margem do canal. Localidade, ainda no território de Gravataí, isolada pela água e, talvez por isso, com a vegetação preservada. Foi deste local, lá no alto das copas das árvores que partiu o ronco alto e típico, que logo alertou criançada a bordo do barco-escola da Associação de Preservação da Natureza (APN-VG) na semana passada. A empolgação dos pequenos tinha razão de ser. Estava ali, diante deles, uma das causas essenciais de se aprender a proteger os recursos naturais que restam na região.

Era um bugio-ruivo, primata que já foi abundante nesta área, mas que sofre com o fim das áreas contínuas de floresta e hoje faz parte do livro vermelho das espécies ameaçadas no Brasil. Pararam o barco não só para "tietar" com fotos o bugio escondidinho entre as folhas, lá no alto, mas para constatarem que estavam diante de um dos representantes no nosso livro vermelho do Vale do Gravataí.

O Seguinte: teve acesso à revisão de 2018 do livro vermelho, organizada pelo Instituto Chico Mendes (ICMBio), para o Ministério do Meio Ambiente, e concluída na semana passada. Em todo o país, 1.172 espécies seguem sob ameaça de extinção. Destas, a reportagem listou pelo menos 20 que ainda podem ser vistas — e protegidas — na bacia do Gravataí. 

 

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O bugio é considerado uma espécie vulnerável, conforme os critérios do instituto, que contou com 1,7 mil especialistas en fauna de todo o Brasil. 

— Era provavelmente um filhote que estava de sentinela para um grupo deles no meio da mata preservada da ilha. Foi a segunda vez que deparamos com bugios desde que iniciamos as viagens com o barco, há dois anos — conta o presidente da APN-VG, Sérgio Cardoso.

 

Cervo no topo da lista

 

Este primata é um dos pelo menos seis mamíferos avaliados pelo livro vermelho e que resistem especialmente no Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos. Entre as espécies está a mais preocupante nesta região: o cervo-do-pantanal. Mesmo que no país esta seja considerada uma espécie em situação vulnerável, no Rio Grande do Sul, a classificação é de criticamente em perigo.

 

 

Pudera, os últimos registros do cervo no Estado estão justamente no refúgio. E isto ainda carece, conforme o relatório, de melhor comprovação científica. No livro vermelho, ainda não consta uma precisão sobre o número de indivíduos na população de cervos-do-pantanal na área preservada nas nascentes do Rio Gravataí.

Nos últimos nove anos, o gestor do refúgio e especialista em cervos, o biólogo André Osório, dedica-se a este levantamento a partir de armadilhas fotográficas. E tem obtido excelentes resultados. Estima que há entre 30 e 40 cervos na área do refúgio, um volume três vezes maior do que se pensava ter no último estudo oficial sobre o assunto, publicado na década de 1980.

— O levantamento do livro vermelho ainda está baseado naquele estudo antigo. Se comprovarmos que realmente há mais indivíduos da espécie por aqui, isso será de grande importância, mas não vai alterar a condição de espécie criticamente em perigo de extinção — avalia o biólogo.

Por outro lado, a necessidade de publicação de estudos comprovando a ecologia da espécie proporcionará mais visibilidade à preservação. Há um programa nacional de proteção aos cervo-do-pantanal. O refúgio, no entanto, não está na lista de áreas favorecidas, inclusive com recursos, por não ter cumprido ainda este dever de casa.

Daí a importância de ver concretizado o plano de manejo do refúgio e da Área de Proteção Ambiental (APA) do Banhado Grande, que abrange todas as nascentes do Rio Gravataí. Será este estudo que balizará a forma como deve ser mantida ou recuperada a natureza local.

— Determinar não só a ecologia desta espécie, mas de diversas outras, até mesmo endêmicas (que só existem no refúgio) está no topo da lista de pesquisas prioritárias a serem definidas no plano de manejo da unidade de conservação — explica Osório.

Segundo ele, já houve inclusive uma tentativa de mapear os cervos usando drones. Não deu certo. Enquanto isso, as câmeras do André Osório captam raridades. Além de determinar os hábitos trasnformados dos cervos, já flagraram tamanduás e até o tuco-tuco, um roedor endêmico da Coxilha das Lombas, uma das formações naturais no Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos, que passa a maior parte da vida debaixo da terra. O tuco-tuco, por ser endêmico, está na lista vermelha como uma espécie em perigo de extinção.

 

A LISTA VERMELHA DO GRAVATAÍ

Mamíferos

 

 

: Cervo-do-pantanal (Vulnerável no Brasil; Criticamente em Perigo no Rio Grande do Sul)
Originalmente, a espécie se desenvolve nas áreas alagáveis próximas a grandes rios, cada vez mais pressionadas pelas atividades humanas na agricultura e outras obras, como a construção de hidrelétricas. Estima-se que, em todo o Brasil, há em torno de 25 mil indivíduos.  Na bacia do Gravataí, não passariam de 40 cervos.

No Rio Grande do Sul, originalmente, havia registros em uma grande faixa de banhados ao longo do Pampa, mas a destruição destes territórios ao longo do tempo para o cultivo, principalmente, de arroz, acabou com o habitat da espécie. A criação do Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos teve como principal causa a proteção dos cervos. E tem surtido efeito. Além de recuperar e preservar áreas de banhado, faixas de mata nativa estão sendo ampliadas a partir da unidade de conservação, mas o ambiente pressionado fez com que os cervos daqui adquirissem hábitos diferentes dos indivíduos da região do Pantanal.

Aqui, conforme levantamento do biólogo André Osório, o cervo adquiriu hábitos noturnos e alimenta-se de maricás, e não de aguapés. A proteção futura da espécie depende da recuperação do seu habitat, com a formação de corredores ecológicos além do refúgio e ao longo do Rio Gravataí.

 

 

: Bugio-ruivo (Vulnerável)
O bugio é uma espécie tradicional das áreas de mata no limite entre a Mata Atlântica e o Pampa, como acontece na região do Rio Gravataí. No entanto, o bugio sofre diretamente o impacto do crescimento urbano, que destroi o seu habitat.

Especialistas sugerem, para a sua preservação, a criação de corredores ecológicos, com o plantio e preservação de áreas de mata nativa ligadas entre si.

 

 

: Gato-maracajá (Vulnerável)
Associados a florestas ou pequenos ambientes de savana, como se verifica no refúgio. São ameaçados tanto pela perda de habitat, quanto pela transmissão de doenças no contato com animais domésticos pela expansão urbana.

É uma espécie ainda vista em diversas regiões do país. Estima-se que haja 4,7 mil gatos-maracajás no país. Para preservação deles, é recomendado estimular a criação de corredores ecológicos.

 

 

: Gato-pequeno-do-mato (Vulnerável)
Depende de um habitat semelhante ao maracajá, mas com registros também em áreas menos preservadas. Ele só permanece nos locais, porém, onde há manutenção da vegetação nativa, como no refúgio.

 

 

: Tuco-tuco (Endêmica, Em Perigo)
Corre sério risco de extinção, pela limitação do seu território. O roedor é endêmico da área conhecida como Cosilha das Lombas. A área de ocorrência da espécie não ultrapassa 4 mil km².

Uma das sugestões para a preservação do tuco-tuco é a expansão do refúgio, ou alguma forma de ligação entre ele e o Parque Itapuã, também em Viamão, onde também há indivíduos da espécie. 

 

 

: Tamanduá-mirim (Pouco Preocupante)
O tamanduá-mirim foi pesquisado desde o início do levantamento para o livro vermelho e, ao longo dos anos, deixou de ser considerado uma espécie Vulnerável para ser vista como Pouco Preocupante para a extinção.

No Refúgio de Vida Silvestre, porém, há algo especial. Julgava-se até o começo deste século que o tamanduá-mirim não existia mais por aqui. Pois as câmeras instaladas na região localizaram o tamanduá-mirim.

 

Répteis

 

 
 

: Jacaré-do-papo-anarelo (Pouco Preocupante)
O jacaré-do-papo-amarelo é encontrado em praticamente todas as bacias hidrográficas do sul e sudeste do Brasil. No refúgio, ele é símbolo da resistência dos ambientes alagados e remanescentes do Rio Gravataí.

 

Aves

Descrevemos duas espécies, mas a estimativa é de que até 12 constam no livro e existam por aqui.

 

 

: Gavião-cinza (Vulnerável)
É endêmico no Rio Grande do Sul. São menos de 2,5 mil indivíuos. É uma ave que depende do banhado para reprodução. A perda deste habitat é a principal ameaça à espécie.

 

 

: Macuquinho-da-várzea (Endêmica, Em Perigo)
Vive em capinzais altos, com áreas úmidas. O Banhado dos Pachecos concentra uma das maiores populações da espécie no país. A perda do habitat, com a drenagem da área de banhado é o principal obstáculo para a sobrevivência do macuquinho.

 

Peixes

 


 

: Peixe-anual (Endêmico, Em Perigo)
Duas espécies de peixes anuais foram descobertas no refúgio. Uma delas, endêmica, foi descoberta em um local com a poça bem próxima do Rio Gravataí.

Os peixes anuais vivem em áreas que alagam no período de chuva, desovam neste solo ainda molhado, e morrem. O ovo só eclode quando volta ao período de chuva e forma-se a poça onde a espécie vive. 

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