Ser chamado nas esquinas por onde passa, na escola ou entre amigos e conhecidos como “Robin Hood”, uma referência ao arqueiro de túnica verde que, nas histórias em quadrinho, roubada dos nobres ricos para dar aos plebeus pobres, é encarado com bom humor pelo educador social Cristiano Vaz Zarichta.
O porto-alegrense de 37 anos, que há 34 mora em Cachoeirinha, coordena o projeto social “Alvo no Futuro”, da Secretaria Municipal de Cultura, Esporte, Lazer e Turismo, que concentra pelo menos a metade dos cerca de 30 atletas que atualmente praticam o “Tiro com Arco”, nome olímpico do esporte popularizado como Arco e Flecha.
E no projeto se destaca, atualmente, Rafael de Lima Roxo, 17 anos, morador da Vila Imbuí e aluno na Escola Estadual Rodrigues Alves. O jovem, que sonha representar o Brasil na olimpíada de 2024, já ganhou nada menos que 25 medalhas estaduais, mais seis de campeonatos nacionais e tem três troféus conquistados por estar entre os ponteiros do ranking gaúcho.
Meta ambiciosa
Nascido em uma família de seis filhos (ele tem mais cinco irmãos), Rafael Roxo conta que despertou para esta modalidade modalidade esportiva de pouquíssima visibilidade e quase nenhum patrocínio em 2014, depois de experimentar o futebol na escolinha do Genoma Colorado e, o futsal, na RS Cachoeirinha.
— Como jogador de futebol sou bem melhor no arco e flecha — diz, bem-humorado, o filho da dona de casa Jacqueline e de Augusto, já falecido.
Sobre participar de uma olimpíada, admite que é uma meta ambiciosa, mas que espera conseguir.
— É o sonho de qualquer atleta. Quem, entre os que praticam alguma modalidade de esporte olímpico, não tem vontade, o sonho, de disputar uma olimpíada? — questiona o jovem, que tem mais duas irmãs e dois irmãos, nenhum deles adepto do esporte que escolheu.
Custo elevado
Em casa o apoio da família é total. Rafael conta que a mãe, Jacqueline, o ajuda no custeio de passagens, alimentação e até no material que utiliza para treinar e competir. O arco que o atleta – categoria juvenil – utiliza atualmente, quase todo em fibra de carbono, custa cerca de R$ 8 mil.
Um jogo de 12 flechas, número 8 que é a categoria top, também em fibra de carbono, não baixa de R$ 2,2 mil. E tudo isso é importado porque, segundo o treinador Cristiano não há fabricantes brasileiros. E o custo fica maior por conta dos altos impostos de importação, na faixa dos 60% sobre o valor do bem adquirido, explica.
— O arco que estou usando atualmente é emprestado porque o que eu tinha quebrou — conta Rafael.
O equipamento, segundo ele, pesa originalmente em torno de dois quilos, mas…
— Quando chega no final de um dia de treinamento já está (pesando) uns 20 quilos — diz, referindo-se ao cansaço decorrente do treino puxado que realiza pelo menos cinco vezes por semana, no turno inverso ao das aulas, em uma área cedida pela direção do Colégio Agrícola Daniel de Oliveira Paiva (Cadop), em Cachoeirinha.
Pedágio no sinal
De acordo com o coordenador do projeto Alvo no Futuro, o treinador da equipe de Tiro com Arco e Educador Social Cristiano Zarichta, o esporte foi introduzido em Cachoeirinha pelo ex-vice-prefeito e empresário Gilso Nunes, ele mesmo um praticante da modalidade. Foi no ano de 2013. E logo surgiram adeptos, muitos deles praticantes até hoje.
Segundo Zarichta, que tem formação como técnico pela Confederação Brasileira de Tiro com Arco, que começou a atirar em 2013 e já participou de competições estaduais e nacionais, o esporte tem um custo elevado e só não tem mais praticantes – e atletas em condições de disputar campeonatos – pela exigência financeira e a falta de patrocinadores.
— O empresário, de modo quase geral, é muito imediatista. Quer que seu investimento tenha retorno a curto prazo. Como o Tiro com Arco não tem apoio da mídia, não tem quase divulgação, um investimento publicitário acaba tendo um retorno muito pequeno ou de longo prazo, e isso afasta potenciais investidores — explica.
E é justamente esta falta de apoio financeiro que leva os pais e familiares dos atletas a realizarem inúmeras e diversos tipos de promoções com a finalidade de arrecadar o dinheiro necessário para que um familiar-atleta possa viajar para outras cidades, ou outros estados, a fim de participar das competições.
— Não gosto da palavra, mas ela reflete a nossa realidade! Chegamos a cair na humilhação de ter que ir para o sinal (semáforos) fazer pedágio para bancar a participação dos nossos atletas em algum evento, por total falta de patrocínio — conta o treinador.
: Cristiano (esquerda), treinador, com o arqueiro Rafael Roxo
Rio de Janeiro
Rafael de Lima Roxo, o arqueiro de Cachoeirinha que quer ir para a olimpíada de 2024 e diz que só não tem como alvo a do ano que vem porque necessita de um maior e melhor aprimoramento técnico, garante que o Tiro com Arco é o esporte que quer “levar” para o resto da sua vida.
— Eu ainda espero poder ganhar a vida com isso. Vencer campeonatos, quem sabe um mundial, para ter maior visibilidade como atleta e obter patrocínios — afirma o “Robin Hood” – do bem! – de Cachoeirinha que, de 6 a 13 de maio próximo, vai participar no Rio de Janeiro de uma seletiva que pode levá-lo ao Mundial de Base que se realizará ainda este ano em Madrid, na Espanha.
As categorias
A modalidade esportiva Tiro com Arco é disputada de forma individual ou por equipes, que se dividem em categorias, tanto masculino quanto feminino:
Infantil – Até os 14 anos
Cadete – Dos 15 aos 17 anos
Juvenil – Dos 18 aos 20 anos
Adulto – Dos 21 aos 49 anos
Master – Acima dos 50 anos
Distâncias
1
As disputas são realizadas principalmente em áreas cobertas (in door) e abertas (out door).
2
Em áreas cobertas – disputas in door – a distância entre o arqueiro e o alvo é sempre de 18 metros;
3
Nas áreas abertas – ou out door – a distância entre o arqueiro e o alvo pode ser dxe 50 metros, 60 metros e 70 metros.
Confira no vídeo a reportagem do Seguinte: sobre o esporte (Tiro com Arco) em Cachoeirinha clicando na imagem abaixo.
QUEM ERA
Robin Hood era um herói mítico inglês, fora-da-lei, que roubava da nobreza para dar aos pobres. Teria vivido no século XII, nos tempos do rei Ricardo Coração de Leão e das Grandes Cruzadas.
Era hábil no arco e flecha e vivia na floresta de Sherwood, onde era ajudado por um bando de amigos, do qual faziam parte João Pequeno, Frei Tuck, Allan Dale e Will Scarlet, entre outros moradores do bosque.
Prezava a liberdade, a vida ao ar livre, e o espírito aventureiro, e ficou imortalizado como "Príncipe dos ladrões". Tenha ou não existido tal como o conhecemos ou reza a lenda, "Robin Hood" ainda é, para muitos, um dos maiores heróis da Inglaterra.
O esporte no Brasil
O Tiro com Arco no Brasil teve uma longa história até a criação da Confederação Brasileira de Tiro com Arco, em 1991. Chegou ao Brasil graças a um idealista, comissário de voo da Panair do Brasil, Adolpho Porta, em 1950, quando se encontrava baseado em Lisboa, Portugal.
Na Feira Popular, evento anual em Lisboa, Adolpho conheceu um marceneiro chamado Arlindo que tinha um estande de tiro com arco. Notando o interesse do brasileiro pelo esporte, convidou-o para ser sócio do Glória Atlético Clube, onde praticava.
Em 1955, quando Rodolpho Porta regressou para o Rio de Janeiro, trouxe com ele alvos, arcos e flechas fabricados por Arlindo, além de um regulamento da Federação Internacional de Tiro com Arco – FITA – que recebeu do presidente da Federação Portuguesa de Tiro com Arco, capitão Manoel da Silva.
Para divulgar o esporte, foi ao Fluminense Futebol Clube, onde conheceu Rocir Silveira. Este o apresentou a Waldemar de Oliveira, do Clube Carioca de Tiro e comerciante de artigos de caça e pesca. Fez amizade com os filhos de Waldemar, Mazinho e Waldir, que se interessaram imediatamente em divulgar o Tiro com Arco.
A primeira prova no Brasil foi realizada em 5 de novembro de 1955, no atual General Dutra, na Quinta da Boa Vista, patrocinada pelo Clube de Tiro e Diário de Notícias. O Fluminense foi representado por uma equipe feminina. A prova foi disputada na distância de 25 metros e o vencedor, Adolpho Porta, com 119 pontos.
O Jornal O Globo instituiu a prova “Flecha de Prata”, com cartazes espalhados pelas vitrines do comércio do Rio de Janeiro. Desta época é possível recordar exímios arqueiros praticantes por muito tempo: Adolpho Porta, que atualmente mora em Brasília, Jamil Ajuz, Bento Belpomo e Nelson Bastos, já falecidos.
Os primeiros clubes a promoverem este esporte foram o Clube Carioca de Tiro, Andaraí Atlético Clube, Clube de Regatas Vasco da Gama, Riachuelo Tênis Clube, Fluminense Futebol Clube e Clube Municipal. Em 19 de novembro de 1958 foi fundada a Federação Metropolitana de Arco e Flecha, no Rio de Janeiro.
Desde os anos 50, quando Adolpho Porta criou as primeiras associações no Rio de Janeiro, o tiro com arco rompeu barreiras e chegou a Minas Gerais e São Paulo, onde outros abnegados como Sudário Ribeiro Gonçalves e Otto Alfredo Rehder, respectivamente, fundaram as federações de seus estados.
Não é errado considerar o início da década de 70 como o grande passo para o reconhecimento do tiro com arco brasileiro em âmbito internacional. Nesta época o esporte era ligado à CBF – Confederação Brasileira de Futebol – que possuía um departamento que atendia a alguns esportes, incluindo o Tiro com Arco.
Também neste período o Brasil promoveu, entre outros, o Primeiro Torneio Internacional com a participação de Argentina, Uruguai e Brasil. O campeão individual foi o brasileiro Renato Joaquim Emílio. A Confederação Brasileira se filiou à Federação Internacional de Tiro com Arco (FITA) em 1972, quando o Brasil teve sua primeira delegação enviada a um Campeonato Mundial, formada pelos arqueiros Renato Joaquim Emílio e Arcy Kempner.
Posteriormente, os esportes que compunham o departamento da CBF tiveram condições de criar sua própria confederação, a CBDT, Confederação Brasileira de Desportos Terrestres.
Sob a coordenação da CBDT e filiada à FITA, atletas do Tiro com Arco tiveram a oportunidade de disputar vários torneios, como Jogos Pan-Americanos, mundiais e Olimpíadas (quatro edições: 1980 em Moscou, URSS. Em 1984 em Los Angeles, USA. Em 1988 em Seul, na Coreia do Sul, e em 1992 em Barcelona, Espanha.
O crescimento de federações estaduais e do número de atletas possibilitou a criação da Confederação Brasileira de Tiro com Arco, em 1991, oportunizando condições para o desenvolvimento do esporte de maneira mais específica e efetiva. Atualmente a CBTArco busca patrocínios para projetos de fomento ao esporte bem como seleção permanente e revelação de novos talentos. (Fonte: CBTArco)