No Senado, avança proposta para deixar imposto ainda mais regressivo, baseando cálculo no valor do terreno, não no da construção. Se aprovada, imóveis simples e antigos pagarão mais — e edifícios luxuosos ficarão quase isentos… O Seguinte: reproduz o artigo publicado pelo Outras Palavras
O Brasil passa por momentos difíceis. Questões preocupantes, como a recessão econômica, o desemprego, as reformas centradas em reduzir os direitos dos trabalhadores, e o consequente aumento da pobreza e da desigualdade, foram potencializados com a pandemia causada pela covid-19. Durante estas crises sanitária e econômica sem precedentes a nível mundial, caracterizadas por aspectos inéditos em termos de paralisação das atividades econômicas, verificamos a desvinculação entre as propostas de reforma tributária e de redução das distorções e iniquidades sociais, fiscais e econômicas do país.
Recentemente, o senador Roberto Rocha propôs as seguintes alterações no Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) no relatório da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania sobre a PEC 110/2019 [1]:
a) substituir a sua base de cálculo pelo valor da terra desconsiderado as construções;
b) estabelecer, em lei complementar, alíquotas mínimas e máximas, limites para a concessão de isenções e benefícios fiscais, e critérios para a avaliação dos imóveis.
Um grupo de especialistas elaborou uma Nota Técnica intitulada “IPTU E A PEC 110/2019 (REFORMA TRIBUTÁRIA) [2]” para avaliar detalhadamente tais propostas. Entre outros aspectos, eles alertam sobre a proposta de desvinculação do imposto com o princípio da capacidade contributiva, e que, devido ao perfil extremamente heterogêneo das cidades urbanas consolidadas no Brasil, o imposto proposto resultaria em forte regressividade. A carga tributária seria transferida para os imóveis isolados, em especial, para residências e prédios comerciais de padrão simples e antigos. No caso dos condomínios verticais, a carga tributária iria aumentar para imóveis pequenos, antigos, localizados em prédios sem elevador e sem espaço de estacionamento. Em contraste, haveria forte redução do imposto para apartamentos grandes, novos e de alto padrão construtivo.
Considerando o exposto na Nota, podemos dizer que esta alteração vai em sentido contrário ao que se deseja para o país, que é de cobrar mais tributos de quem possa pagar mais. Devido às elevadas concentrações de renda e de riqueza, como observado no texto, vivemos em um país onde alphavilles estão cercadas de alphafavelas. Desta forma, não é razoável desconsiderar o valor das construções em centros urbanos no cálculo do imposto, posto que fica evidente a alta regressividade resultante de tal alteração.
Portanto, os autores da nota técnica defendem a manutenção da base de cálculo do IPTU, contemplando o valor integral do imóvel, incluindo terra e construções, bem como da autonomia fiscal dos municípios em respeito ao Pacto Federativo. Indicam, também, que há espaço para aprimorar o IPTU no âmbito da Reforma Tributária, a fim de conferir maior equidade e eficiência a este imposto. Estas alterações passam por assegurar aos municípios o direito de atualizar por decreto ou instrução normativa as defasagens no valor venal dos imóveis, e a introduzir a exigência de reavaliar os imóveis em intervalos máximos de 4 anos. É assim que o IPTU poderá contribuir mais para a progressividade do Sistema Tributário Brasileiro e desenvolvimento das nossas cidades.
É este tipo de alteração para o IPTU que apoiamos no IJF e que a imensa maioria dos brasileiros e brasileiras pode almejar.
[1] ver item xix, página 281 do Relatório, que pode ser acessado no link https://congressoemfoco.uol.com.br/economia/leia-integra-do-parecer-da-reforma-tributaria-apresentado-na-ccj-do-senado/.
[2] A Nota Técnica encontra-se disponível em https://ijf.org.br/wp-content/uploads/2020/08/NT_-PEC-110-IPTU_Completa_DeCesare_Fernandes_Oliveira_Carvalho_Jr.pdf