RAFAEL MARTINELLI

Deixem o cavalo Caramelo em paz!

Resgate foi feito em 5 de maio, em Canoas, pelo Corpo de Bombeiros de São Paulo, acompanhado por veterinários do Exército

Não deixam em paz o cavalo Caramelo, cujas imagens do resgate durante a catástrofe das inundações de maio no Rio Grande do Sul, após quatro dias em pé, de cima de um telhado, rodaram o mundo. Querem que o bichinho, internado há 45 dias no Hospital Veterinário da Ulbra em Canoas, seja atração do acendimento da Chama Crioula no dia 7 de Setembro, no Acampamento Farroupilha, além das festividades farroupilhas durante o mês, em Porto Alegre.

Infelizmente, os animais ainda são tratados como bens no Código Civil, sob o Direito das Coisas, apesar de relatório de alteração no Código Civil propor defini-los como seres sencientes, ou seja, capazes de ter sensações, e que podem ter proteção jurídica própria, devido às suas características peculiares.

A quem se interessa pelo tema, recomendo a leitura de reportagem do Conjur, site de alta respeitabilidade entre os operadores jurídicos, Proposta de alteração no Código Civil não muda status jurídico dos animais.

Mas vamos lá, à espetacularização da exploração do Caramelo, hoje ‘posse’ da Ulbra.

Conforme GZH, o cavalo será a atração. Grifo porque, na mesma reportagem, a médica veterinária residente do Hospital Veterinário da Ulbra, Louise Maciel Fernandes, que acompanha a evolução do animal, questionada se Caramelo tem condições de participar do evento tradicionalista, “explica o que precisa ser testado antes”. 

– Temos que descobrir se ele é acostumado a ser encilhado. Não sabemos como ele responderia, talvez tenha que passar por uma doma antes – sugere, “garantindo que a saúde dele está perfeita”.

Doma. Querem submeter o cavalo à doma.

Está lá, em Símbolo de resiliência, cavalo Caramelo será atração do acendimento da Chama Crioula: “A reportagem de Zero Hora apurou que Caramelo será encilhado com apetrechos como pelegos para o dia de festa no Parque Maurício Sirotsky Sobrinho”.

Acrescenta: “A ideia é o cavalo puxar a fila com a Chama Crioula. Será conduzido por um laçador que foi afetado pela enchente e perdeu tudo durante a inundação. Trata-se de um reciclador que montará o símbolo da resistência do RS”.

Em resumo, vão montar sobre o animal e obrigá-lo a desfilar em meio a milhares de pessoas, mesmo que, ao menos pelo que percebo na reportagem, reste um animal traumatizado.

“Às vezes, se incomoda um pouco com a aproximação repentina das pessoas e até tenta morder”, diz o texto, sentenciando: “Porém, não é um animal temperamental ou violento”.

Associo-me à mensagem de amigo jornalista, que me enviou a reportagem: “exploram-no tanto quanto antes, sempre olhando o animal de forma desrespeitosa, pela perspectiva humana, do grande salvador que pode agora usá-lo como bem entende, para divulgar um romantismo falsificado, artificial, que sob o manto da resiliência só ajuda a desviar o foco dos culpados pelo animal ter ficado lá, sobre um telhado, em um estado inundado de negacionismo ambiental”.

Antes da patrulha acusar hipocrisia, não por me tornar especial informo que o chato aqui luta desde sempre contra exploração de animais, em circos, carroças e eteceteras. Sou vegano, não consumo produtos de origem animal e evito no que posso usar produtos testados em bichos.

Reputo submeter o Caramelo ao estresse de um desfile é um símbolo tão cruel da coisificação dos animais, quanto devolvê-lo ao suposto dono, que reivindica seu ‘bem’ para leiloar e ajudar os vizinhos da vila na Mathias Velho.

Deixem o Caramelo em paz, pastando, correndo ou rolando pelo campo, vivendo longe de domas ou montarias, e sem carroças cheias para puxar. Os vídeos e fotos vocês já tem, para explorar bastante, fazer sorrir, chorar e até usar sua imagem para vender algum produto ou em campanhas eleitorais.

Ao fim, se ainda falta garantir selfie para alguns, nada que uma estátua não resolva. De preferência, longe das casas de bombas, ou dos ‘pobres de sempre’, porque lá não precisa catástrofe para inundar.

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