O evento de abertura do ano letivo de Gravataí, organizado pela Prefeitura, nesta sexta-feira, restou polêmico em relação à estrutura e conteúdo.
Vamos às informações e, abaixo, analiso.
O encontro aconteceu na igreja evangélica iVales, que cedeu gratuitamente o local, no bairro Santa Fé. Conforme a Secretaria da Educação, o público foi de 2,5 mil pessoas. O palestrante, contratado por R$ 9 mil, foi o filósofo, psicanalista e educador Lucas Bitencourt.
O Seguinte: recebeu uma série de reclamações, fotos e vídeos, registrados por profissionais da rede de ensino, que consideraram a estrutura do local inadequada ao porte do evento. Entre as queixas, calor, filas em banheiros e saída de emergência trancada por um tapume, além de falta de ambulância e problemas de trânsito e estacionamento.
A realização em uma igreja, com fala de abertura do pastor responsável, Oseias Pereira, também foi alvo de crítica, por ferir o estado laico. O discurso de agradecimento do prefeito ao pastor, assim como o conteúdo da palestra ministrada pelo filósofo, também, por conterem citações religiosas.
A Prefeitura divulgou vídeo do evento, que você assiste clicando aqui, e Zaffa elogiou, ao lado da secretária da Educação Aurelise Braun, em vídeo que você assiste clicando aqui.
O Seguinte: questionou a secretária sobre as reclamações, e se não foi inadequado um pastor participar da abertura do ano letivo.
“Minha avaliação sobre o evento é que o objetivo geral foi atingido, em ser uma manhã de reencontro, conexão, reflexão e aprendizado. Conseguimos nos reunir nesse grandioso evento para dar as boas vindas aos educadores e funcionários das escolas municipais e também para refletirmos sobre a importância de desenvolver o pertencimento em busca de aprendizado e transformação”, respondeu, em mensagem.
Seguiu: “Atualmente, em Gravataí, o único local com capacidade e estrutura para comportar mais de 2 mil pessoas é a iVales, que nos cedeu o espaço gratuitamente. Nenhum recurso público foi repassado para a igreja, a qual somos muitos gratos pela gentileza e receptividade. Em nenhum momento houve pregação religiosa. O pastor participou da abertura do evento, com uma fala de 8 minutos sobre a importância da educação e dos educadores na sociedade. Quem está reclamando, não deve ter prestado atenção”.
E concluiu: “Inclusive vi que o grupo que reclamou foi embora no início e não ficou para assistir a palestra principal com o psicólogo e educador Lucas Bitencourt. Infelizmente, algumas pessoas se incomodaram com o espaço, por ser uma igreja. Acho uma pena isso, que não tenha ocorrido a compreensão necessária por parte de um pequeno grupo. Quem estava realmente interessado e permaneceu, conseguiu aproveitar a palestra de maneira construtiva para sua ação como profissional da educação”.
O sindicato dos professores de Gravataí vai reunir o conselho geral no início da semana para manifestar uma posição oficial.
– Recebemos denúncias, queixas e reclamações – confirmou ao Seguinte: a presidente do SPMG, Vitalina Gonçalves.
Atualizando: nesta segunda, o sindicato publicou nota que você acessa clicando aqui.


Analiso.
Sobre a suposta falta de estrutura, não testemunhei o evento, então me restrinjo a reportar as queixas que recebi e o contraponto do governo.
O mesmo vale para a palestra. Não assisti, então não comento o que falou, cantou e tocou o palestrante que, em Gravataí, tem experiência como professor de religião do Colégio Dom Feliciano – e que lançou neste ano “No princípio era o desamparo”, livro onde se propõe a estudar como Freud interpreta o fenômeno religioso a partir do sentimento de desamparo constituinte da experiência humana.
Avalio, porém, foi um erro político o evento ter acontecido em uma igreja. Com pastor discursando e, por conseqüência, o prefeito impelido a agradecer sob as luzes a caridade pela cedência gratuita da iVales.
Sem outro local adequado em Gravataí, conforme alega a secretária, a Prefeitura poderia ter alugado o Teatro da Fiergs, em Porto Alegre, por exemplo. O custo? R$ 39,5 mil, conforme orçamento feito pela Prefeitura de Cachoeirinha.
Leitores mais atentos podem estar se perguntando: mas em Governo Cristian cancela evento de recepção a professores de Cachoeirinha que custaria R$ 250 mil; As versões e a polêmica o jornalista criticou o evento que era produzido por Cachoeirinha para receber os professores devido ao custo, e agora cobra que a Prefeitura deveria fazer o mesmo?
Nada mais desigual do que tratar da mesma forma os diferentes, entendo. A Prefeitura de Cachoeirinha enfrenta uma interminável crise financeira, Gravataí não. E o custo do evento vizinho era de R$ 250 mil, para uma rede três vezes menor.
Gravataí tem um orçamento de R$ 1,2 bilhão para 2025, Cachoeirinha nem metade. Só para Educação são estimados mais de R$ 250 milhões no orçamento da educação de Gravataí para este ano.
Mas vamos ao ponto.
É inegável que se trata de uma categoria cuja relação de altos e baixos é histórica não só com o governo Zaffa, mas com todos os governos. Que recentemente passou por uma reforma da previdência, trabalha em escolas que o próprio prefeito, no discurso de posse do secretariado, referiu como precárias e, nesta semana, tinha apresentado ao prefeito uma pauta de reivindicações alegando defasagem salarial de 25% – ou um quarto dos salários – só com perdas inflacionárias; mesmo o governo pague o piso do magistério e não considere haver defasagem, sustentando que os índices não concedidos entre 2016 e 2020 foram a forma de evitar o agravamento do déficit do IPAG, hoje IPG, o instituto que garante as aposentadorias dos servidores públicos municipal.
Quem achar que é só mimimi, talvez não conheça tanto quando acha a segunda maior rede de ensino do Rio Grande do Sul, e como as coisas reverberam no chão da escola. É, foi, e sempre será, uma relação delicada, cuja governança talvez caiba na frase do político gaúcho Pinheiro Machado, em 1915 instruindo o seu cocheiro sobre como conduzir a carruagem diante de uma multidão feroz: “Nem tão devagar que pareça afronta, nem tão depressa que pareça medo”.
Reputo não precisava a Secretaria da Educação trazer para a equação pastor, igreja e cruz cintilando na parede em foto publicada nas redes do município. É uma crise desnecessária, por evitável. Até porque até onde sei o prefeito acredita no estado laico. E, para além da organização de evento de abertura do ano letivo, deve estar mais preocupado por Gravataí figurar em 358º entre os 497 municípios gaúchos no Índice Municipal de Educação (IMERS).