É um absurdo o conteúdo, a forma e o momento em que os vereadores aprovaram, na primeira sessão do ano, uma reforma administrativa que cria novos cargos e estágios na Câmara de Cachoeirinha, ao custo de cerca de R$ 10 milhões pelos próximos quatro anos de legislatura.
O Projeto de Lei do Legislativo 3/2025, que vou chamar ‘bonde dos cargos’, entrou em retificação de pauta feita minutos antes da reunião e criou 47 cargos (a maioria para gabinetes dos vereadores), além de também redefinir salários.
O impacto financeiro é de R$ 2 milhões em 2025, R$ 2,2 milhões em 26 e R$ 2,2 milhões em 27. Projetando o mesmo valor em 28 e estimando as reposições inflacionárias, além das bolsas de estágio, é possível chegar à conta dos R$ 10 milhões.
Siga o documento anexo ao projeto.

Até a publicação deste artigo, a presidente da Câmara Jussara Caçapava não retornou contato feito pelo Seguinte: ainda na manhã desta quarta-feira.
Antes da análise, vamos às informações.
O jornalista Roque Lopes, em O Repórter, fez um comparativo entre a estrutura do legislativo anterior e após a aprovação dos projetos.
São 34 novas vagas para CCs (os cargos de indicação política) de vereadores, três para administração da Câmara e 10 para estagiários.
Cada vereador, que hoje tem 5 cargos, poderá contratar mais dois. São os Assessores Comunitários, com uma remuneração de R$ 2,4 mil. Estes CCs poderão trabalhar fora da sede do legislativo.
Foram criados também os cargos de Assessor Especial de Diretoria-Geral (1), com salário de R$ 5.589,46, e Assessor Especial de Apoio Administrativo (2).
Entre aumentos de salários, o principal é a criação de remuneração de R$ 9.335,50 e mais verba de representação de R$ 2 mil para o procurador-geral. O assessor jurídico também terá direito a um adicional, além da remuneração, de R$ 1 mil, como consultoria jurídica.
Clique aqui para acessar o projeto, que descreve as funções de cada cargo, mas não traz justificativa da presidência.
Votaram contra apenas os vereadores Gustavo Almansa (PT) e Leo Costa (PT).
Votaram a favor, pela ordem de apresentação no site do legislativo, Claudine Silveira (PP), Cleo Pereira (MDB), Edison Cordeiro (Republicanos), Ezequiel Knevitz (MDB), Flávio Cabral (MDB), Gilson Stuart (Republicanos), Mano do Parque (PL), Marcelo Mattos (MDB), Otoniel Gomes (MDB), Paulinho da Farmácia (PDT), Pricila Barra (Podemos), Sandra Cunha (Republicanos), Tiago Eli (PP) e Uilson Droppa (Podemos).
Já o projeto dos estágios, que teve aprovação por unanimidade, criou 10 novas vagas com bolsa de R$ 2.135 para acadêmicos de graduação e de R$ 2.785 para os de pós-graduação, além de auxílio transporte de R$ 215.
Analiso.
Começo pela forma. O projeto, aprovado em sessão única, entrou na pauta em última hora, sem qualquer possibilidade de escrutínio pela sociedade e, com certeza, por alguns dos vereadores, que tiveram menos de 40 minutos entre a publicação do projeto e a votação.
Pelo que o Seguinte: apurou, foi feita uma retificação de ata e enviada aos vereadores às 17h19.
O conteúdo também me parece injustificável.
Os vereadores de Cachoeirinha terão 7 assessores, dois liberados para trabalhar fora da Câmara.
Para efeito de comparação, Gravataí, com o dobro da população e de orçamento, e território 10 vezes maior, tem 3 CCs por vereador – e, o principal, o município não enfrenta problemas com as contas públicas.
Aí entro no momento que considero ruim para criar cargos.
Mesmo que o orçamento da Câmara hoje suporte os custos de R$ 10 milhões, Cachoeirinha está no limite de comprometimento com folha de pagamento determinado pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Já tratei sobre isso quando o governo aprovou seu ‘bonde dos cargos’; leia em O efeito do ‘bonde dos cargos’: governo Cristian começa a priorizar salários em Cachoeirinha e links relacionados no artigo.
Fato é que a Câmara só faz aumentar a pressão nas contas públicas. Os gastos com a folha de pagamento de câmaras municipais estão incluídos no limite de despesas com pessoal dos municípios, de acordo com a LRF.
Vou além. A reforma administrativa tem potencial para questionamentos judiciais, mas como todos os vereadores vão nomear os novos cargos, dificilmente alguma ação terá origem no parlamento.
Alerto porque, em Gravataí, o Ministério Público reduziu cargos de vereadores em legislatura anterior devido ao desequilíbrio entre o número de CCs e de concursados.
A desproporção em Cachoeirinham grita: antes da criação dos novos cargos, a Câmara tinha 18 concursados e 95 CCs; agora são 129 CCs.
Ao fim, reputo os vereadores iniciam o ano legislativo permitindo um mau presságio para aquela que chamo “Pobre Cachoeirinha!”.
A prioridade deveria ser ajudar o prefeito Cristian Wasem (MDB) a enfrentar o desequilíbrio nas contas públicas.
Ou, já que questões fiscais não costumam mexem com os humores do povo, imagina que bonito seria, ao fim dos quatro anos, a Câmara ter devolvido estes R$ 10 milhões de seu orçamento para a Prefeitura pode fazer mais obras. Daria e sobraria dinheiro, por exemplo, para reformar as casas de bombas para evitar enchentes.
Porém, parece que a pressa foi em reforçar a ‘República de Vereadores’, que a cada legislatura, com novas ou velhas caras, sequestra governos, mesmo que passe ao largo do interesse público.