É sambar sobre os túmulos de mais de 500 mil vidas perdidas escolher qual vacina tomar contra a COVID-19. A decisão é de cada um, mas a culpa é coletiva. Permito-me chama-los covidiotas.
Sou testemunha. Recebi a primeira dose nesta manhã e fique chocado com o número de pessoas que desistiram da fila ao saber que a imunização seria feita com a Coronavac. Na minha conta, 2 a cada 10. Conforme o secretário da Saúde Régis Fonseca o fenômeno acontece nos 29 pontos de vacinação de Gravataí; e, acrescento, no Brasil zap-zapeado afora.
– É Coronavac. Quem não quiser tomar não ocupe lugar na fila e atrapalhe a vacinação ficando em dúvida quando chegar sua hora – avisou, indignada, uma enfermeira no posto onde eu estava.
Minutos antes, imitei Humberto Gessinger e respondi a um covidiota que me perguntou qual era a vacina do dia:
– É uma que aplicam no braço.
A fake news começa no descrédito imputado à Coronavac. Conforme dados do próprio Ministério da Saúde (disponíveis no sistema OpenDataSus), a nossa vacina é a vacina que mais protege contra casos graves da COVID-19, prevenindo 97% das mortes de pessoas infectadas.
O levantamento mostra que idosos com 80 anos ou mais que receberam a segunda dose da CoronaVac, cerca de 28 dias antes do início de sintomas, tiveram taxa de cura bem mais alta do que idosos na mesma faixa etária não vacinados ou com vacinação incompleta.
Pior é a irresponsabilidade coletiva.
Associo-me a Luiz Carlos Dias, professor titular do Instituto de Química da Unicamp, membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico e membro da força-tarefa no combate à COVID-19 daquela que está entre as 50 universidades de maior reputação da Terra; que não é plana.
– Não acredite nas fake News que rolam pelos grupos de WhatsApp e em outros aplicativos de redes sociais, dizendo para tomar a vacina A ou B e não tomar a vacina C. Nós não estamos no momento de escolher vacinas. Nós não temos vacinas suficientes para a população ficar escolhendo. Se você deixar de se vacinar, esperando escolher um imunizante com maior eficácia baseado nos estudos clínicos de fase 3, você corre o risco de se contaminar, de precisar de um leito de enfermaria ou de UTI e de contaminar os seus familiares.
– Tome a vacina que estiver à sua disposição no posto de saúde, a melhor vacina é aquela que pode ser aplicada imediatamente, a que chegar primeiro no seu braço. Não tome individualmente uma decisão que pode ter impacto no coletivo, pois a vacinação em massa é chave para controlar a pandemia, mantendo as medidas não farmacológicas – apela.
O cientista explica que o conceito de imunização é coletivo, de modo que precisamos atingir ou chegar próximo da marca de 75% da população brasileira vacinada, com qualquer vacina disponível, desde que aprovada e autorizada pela Anvisa. A proteção de todos depende do conjunto total de vacinados. Ter tomado as duas doses de qualquer uma das vacinas disponíveis, não garante que você não seja infectado, caso você relaxe nas medidas não farmacológicas e tenha contato com pessoas infectadas:
– Todas as vacinas em uso no Brasil passaram por testes clínicos que mostraram segurança, eficácia e vieram para salvar vidas. Quando você se vacina, você tem um grau de proteção individual após a primeira dose, mas seu corpo ainda está sendo treinado para combater o vírus Sars-Cov-2. Com a segunda dose a resposta é mais robusta, nós temos um grau de proteção individual, mas a imunidade coletiva só será atingida com cerca de 75% da população sendo vacinada, ou talvez um pouco mais do que isso.
Para efeitos de comparação, Gravataí, mesmo liderando o ranking da eficácia na vacinação entre as 10 maiores cidades gaúchas e com 150 mil doses aplicadas, atingiu 15% da população vacinada com as duas doses.
Todos os grupos prioritários definidos no Plano Nacional de Imunização (PNI) já foram vacinados e, nesta sexta, com a chegada de 7,7 mil novas doses foi retomada a vacinação a partir dos 47 anos. Neste sábado abre para 46. Os horários e locais você acessa no Facebook da Prefeitura.
O momento me remete ao artigo “Cobrir falsidades com verniz científico é insustentável, como nos ensinou o regime mais abominável da história”, no qual Cristina Bonorino lembra história de jantar de cientistas na Alemanha onde Max Planck, físico ganhador do Nobel, tentou persuadir que eliminar os cientistas judeus seria perigoso pois esses eram responsáveis pela esmagadora maioria da produção científica alemã. Ao que Hitler teria respondido: “Ah, tudo bem, então ficamos sem ciência por alguns anos”.
Ao fim, agradeço a bênção de ter sido vacinado e lamento pela covidiotia. Feliz, voltei para casa cantarolando Raul:
“Eu não sou besta pra tirar onda de herói
Sou vacinado, eu sou cowboy
Cowboy fora da lei
Durango Kidd só existe no gibi
E quem quiser que fique aqui
Entrar para história é com vocês”
Trágica história.
Viva o SUS!
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