RAFAEL MARTINELLI

É uma vergonha vereadores se submeterem à ‘resolução da mordaça’ em Gravataí; Mexeu com eles, mexeu comigo – e contigo

A Câmara de Gravataí tem sua ‘resolução da mordaça’. Reputo ilegal e uma violência contra a Constituição Federal, que garante a inviolabilidade dos parlamentares.

Podemos conversar, presidente Roger Correa (PP)?

A Resolução Mesa Diretora 5/2022, que “dispõe sobre as regras a serem observadas pelos agentes públicos da Câmara Municipal, diante das eleições de 2022, para Presidente da República, Deputados Estaduais e Federais, Senadores e Governadores” diz, em seu artigo 3º, inciso V, que são vedadas, “aos agentes públicos da Câmara Municipal”, condutas como “realizar pronunciamentos, manifestações de apreço ou desapreço (…) que caracterizem propaganda eleitoral de qualquer candidatura ou candidato em sessão plenária”.

Acontece que a interpretação que tem sido dada pelo senhor é que, nos debates, os vereadores não podem falar em, por exemplo, Bolsonaro ou Lula, Marco Alba ou Daniel Bordignon, Patrícia Alba ou Dimas Costa, porque são potenciais candidatos na eleição de 2022.

Só que estabelece a CF que os deputados e os senadores, desde que no exercício ou desempenho de suas funções, dentro da Casa legislativa respectiva ou fora dela, são invioláveis (intocáveis, imunes ou, mais adequadamente, penalmente impuníveis) em quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

Como explicam Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini, em “Das imunidades e prerrogativas dos parlamentares”, essa inviolabilidade abrange todas as manifestações funcionais do parlamentar, sejam escritas (pareceres etc.) ou orais (discursos, entrevistas, votos orais etc.), dentro ou fora do Parlamento, nas Comissões etc.

Antes da EC 35/2001 a inviolabilidade parlamentar penal estava prevista no art. 53, caput, da CF, nestes termos: “Os Deputados e Senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos”. A atual redação do mesmo dispositivo constitucional diz o seguinte: “Os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.

Significa que, anteriormente, a inviolabilidade era (literalmente falando) exclusivamente penal. Agora também está prevista (de modo expresso) a inviolabilidade civil, que significa a impossibilidade de indenização por danos materiais e morais (STF, Pleno, RE 210.907-RJ, Sepúlveda Pertence, Informativo STF 118, j. 12.08.1998).

“Qualquer pedido nesse sentido (danos civis) contra o parlamentar, desde que preenchidos os requisitos e respeitados os limites da inviolabilidade, seria juridicamente impossível. Antes mesmo da EC 35/2001 impende sublinhar que a jurisprudência já reconhecia em favor dos parlamentares a inviolabilidade civil: STJ, ROMS 8967-SP, José Delgado, DJU 22.03.1999, p. 54. Embora o texto tenha feito referência expressa à inviolabilidade civil, é de se concluir que também a administrativa e a política estão compreendidas no texto da Carta Magna (RTJ 161, p. 777). No que diz respeito à inviolabilidade civil do parlamentar cf. STF, AI 473.092-AC, rel. Celso de Mello; STF, Inq. 1.958-AC, rel. Carlos Britto; STF, Pet. 3686-DF, rel. Celso de Mello”, explicam os juristas.

Único porém é o “nexo funcional”: é absolutamente imprescindível que a manifestação do parlamentar (opinião, palavra e voto) tenha nexo funcional com o cargo que desempenha.

“Manifestações da vida exclusivamente privada do parlamentar (numa reunião de condomínio, num estádio de futebol etc.) ou que venha a atingir a vida privada das pessoas (sem nenhum nexo com o interesse público) não estão acobertadas pela inviolabilidade penal constitucional do art. 53. Nesse caso o parlamentar responde criminalmente. Mais: ainda cabe indenização civil”, explicam.

Como poderia, presidente Roger, um vereador analisar, ou mesmo criticar um governo, sem citar o prefeito, o ex-prefeito, o atual ou o ex-presidente da república, a deputada ou o candidato a deputado, que julga responsáveis pelos feitos ou malfeitos?

Dos Grandes Lances dos Piores Momentos é que, conforme a Lei Eleitoral, neste momento não existem candidatos. As convenções ainda não aconteceram. São apenas pré ou potenciais candidaturas.

E, mesmo após a homologação das candidaturas, os parlamentares seguirão sob a proteção da Constituição. Para questioná-los existe a justiça comum e eleitoral. Não podem os vereadores aceitarem se submeter a uma resolução de parlamento, ou a interpretação – seja casuística ou não – de um presidente e seu jurídico.

Ao fim, menino do Rincão, uma das regiões mais pobres de Gravataí, ex-chão de fábrica, Roger Correa tem feito, contra previsão preconceituosa de muitos, uma gestão equilibrada no balanço entre governo e oposição, além de responsável com as contas da Câmara. Mas, na Resolução 5, foi mal orientado.

O vereador Cláudio Ávila (PSD), que é um dos advogados mais famosos de Gravataí e além, pediu na última sessão que os vereadores se reúnam para alterar a ‘resolução da mordaça’. Ou vai judicializar a pauta. Acerta o líder da oposição; não só por uma questão política, mas como operador do direito e defensor das garantias individuais.

Parlamento é para parlar. E, goste-se ou não, a Câmara representa, no critério da proporcionalidade, 100% dos votos de Gravataí. Mexeu com eles, mexeu comigo – e contigo.

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