A nossa relação com o mundo das imagens é complexa. Estamos acostumados com fotografias, filmes, pinturas, esculturas, mapas, etc. As imagens podem trazer informações sobre o mundo. Podem provocar sentimentos, agradáveis ou não. Dizem os estudiosos que sua função primeira é estabelecer nossa relação com o mundo visual. E a imagem que vemos nos espelhos?
Entre as muitas histórias da minha infância lembro que a madrasta da Branca de Neve consultava o espelho mágico todos os dias e perguntava: “Espelho, espelho meu, há no reino alguém mais bela do que eu? E o espelho não mentia, sabia a rainha. Respondia que ela era a mais bonita, mas quando Branca de Neve cresceu, também disse a verdade e enfureceu a rainha/bruxa.
A ideia de que o espelho só fala a verdade ficou gravada em minha mente. Não pela proposta estética, mas pela perspectiva de que aquela lâmina de vidro metalizado tem a capacidade de mostrar até o que não quero olhar. Por vezes fico em frente a ele e me pergunto o que ou quem estou vendo. Travo diálogos intensos com a imagem refletida. Algumas conversas são duras, outras condescendentes.
Nas solitárias conversas que entabulamos conto coisas alegres e outras nem tanto. Ao longo do tempo, mostrou-me a inconveniente espinha na ponta do nariz, lágrimas escorrendo, olhares esperançosos, sorrisos, ares de ironia, expressões de raiva. Treinei com ele jeitos e trejeitos.
Tem dias que me surpreendo. Vejo a menina dos contos de fada ou a adolescente cheia de dúvidas. Se ele não mente, o que enxergo é a adulta que, apesar dos pesares, não perdeu a sua essência.