RAFAEL MARTINELLI

EXCLUSIVO | A entrevista-bomba de Juca: “Temi por minha vida, fui abandonado por políticos e tentaram me comprar”; Vereador de Cachoeirinha cassado e preso por mais de um ano por suposto envolvimento com facção se defende e faz acusação

Juca Soares foi eleito em 2020 para o mandato 2021-2024, mas foi cassado ano passado

E, finalmente, Juca Soares falou ao Seguinte:.

O ex-vereador de Cachoeirinha, cassado em 2022 por suspeita de ter a campanha financiada por facção criminosa supostamente comandada por seu irmão, após um ano e dois meses preso foi solto e resolveu quebrar o silêncio em uma entrevista-bomba, na semana em que teve seu nome envolvido na crise no PP entre o vice-prefeito Delegado João Paulo e o vereador e secretário da Segurança Marco Barbosa.

Para quem não acompanhou, listo os artigos que detalham a polêmica ao fim deste artigo.

Como escrevo desde a Operação Cidade de Deus, que teve como consequência a prisão do líder comunitário da Vila da Paz, não sou policial, investigador, promotor ou juiz, sou jornalista; e consagro a sagrada presunção de inocência – e, são os fatos, aqueles chatos que atrapalham argumentos: Juca ainda não resta condenado a nada.

Tenho como regra profissional, e de vida, que melhor do que fazer justiça é não cometer injustiças, e não sou dos caça-cliques que permitem aos políticos, a qualquer um, e principalmente aos mais pobres, a presunção de culpa.

Então, com a palavra, o senhor Jose Francisco Soares da Silva, 50 anos, que falou ao Seguinte: por cerca de duas horas e não fez nenhuma exigência sobre o conteúdo das perguntas e da publicação.

Siga os principais trechos da entrevista.


Seguinte: Tento entrevista-lo há mais de dois anos, desde a operação feita em teu gabinete e tua casa que, depois, teve como consequência a prisão. Por que resolveste falar agora?

Juca Soares Primeiro, porque desde que tudo isso começou foste justo e tiveste respeito por mim e minha comunidade em teus artigos. Sempre escreveste a verdade, que não fui condenado a nada. Nas últimas semanas, quando fui envolvido nessa briga entre o vice-prefeito e o vereador, muitas declarações e comentários nas redes sociais me trataram como bandido, envolveram minha família, meus amigos e toda comunidade com a qual trabalho há 30 anos. Falam como se todo mundo que vive em vila tivesse ligação com crime. Como se muita gente não se esforçasse para evitar que jovens sigam esse caminho. Achei que era hora de contar a minha história, o porquê de entrar para a política para ajudar uma comunidade que não tinha nada e, também, revelar algumas coisas para as pessoas saberem como agem alguns políticos. O Juca era bom, era inocente, só quando podia ajudar a chegar ao poder? Cheguei em 1993 na ocupação da Vila da Paz, morei sempre a duas casas da 1ª DP (Delegacia de Polícia Civil) e nunca fui investigado por nada. Foi só entrar na política que pedalaram minha porta, me prenderam, me cassaram e quase destruíram minha vida e minha família.

Seguinte: O processo criminal o qual respondes, e pelo qual passaste um ano e dois meses preso, tramita em segredo de justiça, mas, conforme o que foi apresentado até agora pelo sistema judiciário, és acusado de fazer parte do braço político de uma das principais facções criminosas do Rio Grande do Sul, que seria chefiada pelo teu irmão, que está preso, e teria relações com tráfico de drogas, jogos de azar, extorsão e homicídios. Uma das acusações é de que recebias mesada da facção, que além de amedrontar adversários políticos, financiou tua campanha.

Juca Soares Recebi 889 votos e entrei na conta da sobra dos votos. Se tivesse facção financiando, dinheiro do crime, não seria um dos mais votados? Sou vítima de uma falsa delação. Não há nada que me ligue a facção. Na última audiência na justiça meu advogado perguntou se tem gravação de conversa entre mim e meu irmão falando de política, de financiamento de campanha, de ligação com tráfico, ou sobre qualquer benefício que eu tenha tido, oferecido ou proporcionado para facção, se tinha provas de que clonei carros… e não tem nada. Sou mecânico há 25 anos. O advogado disse: “então meu cliente está numa cela política”. Fui solto sem tornozeleira, nada.

Seguinte: Teu irmão é o líder da facção?

Juca Soares Ele está respondendo as coisas dele na justiça. Não gostaria de falar por ele. Fomos criados sem pai, o tenho como um filho. Nunca o abandonei. Se você for ver nos registros, fui visita-lo em todas as cadeias que passou. É meu irmão.

Juca diplomado vereador em 2020

Seguinte: Por que resolveste entrar na política em 2020?

Juca Soares Sou de uma família muito pobre, de Tapes. Toda manhã eu e minha irmã pegávamos uma fronha e saíamos pedindo comida, um pãozinho, para tomar café antes de ir para a escola. Quando chegamos na Vila da Paz, me envolvi nas lutas da comunidade. Não tínhamos saneamento, nada. Sempre precisamos apoiar políticos para reivindicar as coisas para a comunidade. Até que o pessoal começou a dizer: “por que tu não concorre, gordinho?”. Tenho só a sexta série primária, mal sei me expressar, mas conheço o que é passar dificuldades, como é para uma criança ficar numa fila para ganhar um brinquedo no Natal. Trabalho desde os 9 anos. Resolvi encarar. Fizemos uma campanha com poucos recursos. Bastou ser eleito para começar a viver um inferno. No primeiro dia, a polícia na porta, celular e coisas apreendidas, depois prisão, cassação. Quando estava preso ficava pensando: “se soubesse seria assim, não tinha me metido em política”. Hoje digo que me fortaleceu. Nem recorri da cassação, mas não vou mais apanhar quieto, ouvir mentiras que prejudicam não só a mim, mas a minha família e toda nossa comunidade, sem me manifestar e defender a mim e aos meus.

Juca com sua comunidade, em foto que enviou após a entrevista

Seguinte: Como foi ficar preso por mais de um ano? Temeste ser um alvo devido às acusações que pesam sobre teu irmão?

Juca Soares Foi um horror. Fui preso às vésperas do Dia dos Pais. Tenho quatro filhas, de 17, 19, 23 e 25, e um de 28, formado em contabilidade. Disse: “o pai volta logo”. Achava que seria solto em três, quatro, dias. Fiquei um ano e dois meses preso, sem condenação nenhuma. No primeiro mês mal dormia. Era pandemia e só podia receber visitas do advogado. Temia pela vida sim. Passei por quatro penitenciárias. Você nunca sabe com quem está convivendo. Quando fui solto, estava muito deprimido, não queria sair de casa.  Minha família e minha comunidade me ajudaram a levantar a cabeça. Hoje tento reconstruir minha vida. Devo empréstimos que tirei no Banrisul e no Banco do Brasil para a campanha, moro de aluguel, não tenho carro, nada.

Seguinte: No período da prisão recebeste algum apoio de políticos?

Juca Soares Fui completamente abandonado.

Seguinte: Apoiaste a reeleição do prefeito Miki Breier (PSB) em 2020. Restou alguma mágoa?

Juca Soares Quando tentaram o impeachment do Miki chamei o prefeito para ir até nossa comunidade, ver de perto nossas dificuldades. Ele disse que ia ajudar. Nos mobilizamos, fomos até a Câmara de Vereadores com cartazes onde escrevemos “deixa o homem trabalhar”. Mas as coisas não aconteceram. Pelo contrário. Foi até a polícia, encontrou delegada, ajudou a me prejudicar. A comunidade ficou muito revoltada.

Seguinte: Também tiveste um papel decisivo na eleição de Cristian Wasem (MDB) como presidente da Câmara, o que, com a cassação de Miki e do vice Maurício Medeiros (MDB), levou o vereador a assumir interinamente a Prefeitura, até ser eleito pelas urnas em 2022. Votaste nele para presidência por videoconferência, de dentro da cadeia. No fim de semana passado li post teu denunciando que foste visitado por emissário da outra chapa oferecendo vantagens para trair o acordo que tinhas assinado em 2020.

Juca Soares Sim, aconteceu. Está registrado no presídio. Na véspera da eleição para presidência da Câmara, em dezembro de 2021, recebi durante a tarde a visita de um advogado em nome da chapa que tinha o Felisberto Xavier concorrendo a presidência, com apoio de Marco Barbosa. Me ofereceram uma secretaria, porque teriam apoio do prefeito (então Maurício Medeiros, devido ao afastamento de Miki), mais cargos. Eu disse que tinha assinado um documento lá em 2020, que definia a presidência de cada ano, e honraria meu compromisso. O advogado voltou às 22h30 oferecendo duas secretarias, cargos, ajuda na minha defesa e dinheiro. Eu disse que não aceitava, que tinha palavra, que não queria dinheiro nem nada. Veja que nunca me procuraram antes, desde que tinha sido preso. Essa é a política. Para o senhor Marco Barbosa, naquele dia, para chegar ao poder, eu não era bandido, traficante, né?

Juca, na sessão em que, por videoconferência da prisão, decidiu eleição para Cristian

Seguinte: Li em post teu e de apoiadores que acionariam a justiça pelas associações ao crime feitas sobre ti e apoiadores. Vais processar Marco Barbosa?

Juca Soares Sim. Ele e pessoas ligadas a ele me caluniaram em sessões da Câmara, em postagens nas redes sociais e em grupos de WhatsApp. Terão ao menos que se retratar. Já não chega terem demolido minha vida? Tenho dificuldades para dormir, minhas filhas também.

Seguinte: Vais seguir no PP depois dessa crise?

Juca Soares Sim. Nosso grupo apoia o Delegado João Paulo.

Seguinte: E com o prefeito Cristian, como está sua relação? Além da secretária da Habitação, Neka Fagundes, que te acompanha na entrevista, quantos cargos tens indicados no governo?

Juca Soares Acho que oito. Acreditamos neste governo, que olha para as pessoas. Vamos seguir na luta. Aprendemos pela dor. Não vão nos derrubar. Não vou mais me calar.


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