Em Gravataí, uma das ‘capitais da falta de água’ no Estado, polêmica não vai faltar no segundo semestre. No que depender de Marco Alba (PMDB), a Prefeitura não assina o contrato com a Corsan para a Parceria Público-Privada (PPP) que projeta tratar até 2029 o esgoto de nove municípios da Região Metropolitana, num investimento previsto de R$ 1,8 bilhão.
– O prefeito não quer nem ouvir mais falar neste projeto, porque não acreditamos nele. Nossos planos são outros. O edital está pronto e, em 15 dias, a Prefeitura vai decretar a caducidade do contrato com a Corsan para licitar a concessão da água e do esgoto – informou com exclusividade ao Seguinte: Luiz Zaffalon (PMDB), secretário de Projetos Especiais, Saneamento e Habitação de Gravataí.
Com um currículo por altos cargos em estatais e empresas privatizadas, presidente da Corsan entre 2009 e 2010 durante a gestão de Marco como secretário de Saneamento do governo Yeda Crusius (PSDB), Zaffa é um expert tanto na parte técnica, quanto política, que envolve o tema. O que o leva a prever talvez uma longa batalha judicial.
– Vai dar uma boa briga. A Corsan deve tentar reverter nosso decreto na justiça, alegando que a saída de Gravataí desequilibra a capacidade de atendimento da estatal em municípios menores. Mas vamos cancelar o contrato e já licitar, porque não estamos recebendo os serviços adequados da companhia – antecipa, confirmando as informações que já revelamos de que a proposta da Prefeitura prevê um contrato de 35 anos onde a empresa vencedora da concorrência terá que garantir acesso a água tratada para todas as pessoas em cinco anos, esgoto cloacal em 10 anos e a recuperação do Rio Gravataí em 15 anos, para garantir a capacidade do abastecimento com captação no manancial local.
– Não há chance de recuo. É uma decisão do prefeito – garante Zaffalon, ‘gerentão’ desde o primeiro governo e o principal colaborador de Marco nas últimas duas décadas, que revela que o governador José Ivo Sartori será o primeiro a ser informado da decisão nos próximos dias.
Em entrevista exclusiva ao Seguinte: sobre os primeiros 60 dias de governo, o prefeito antecipou que o edital de Gravataí guardaria uma surpresa, ainda mantida sob sigilo, tanto por Marco, como por Zaffalon.
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Uma gigante como parceira
A idéia da PPP começou a ser gestada no governo Tarso Genro (PT) e foi ressuscitada agora por Sartori para tentar melhorar os indicadores na região que concentra 1,3 milhões de pessoas e onde menos de duas, em cada dez, tem esgoto tratado.
A parceira da vez deve ser a Aegea Saneamento e Participações S.A., que propôs diluir em 11 anos o investimento em Gravataí, Cachoeirinha, Viamão, Alvorada, Canoas, Esteio, Sapucaia do Sul, Guaíba e Eldorado do Sul. Seu presidente, Hamilton Amadeo, já projetou inclusive as apresentações das propostas para setembro, em entrevista dada ao jornal Valor Econômico em 20 de fevereiro.
A Aegea é uma holding que hoje atua em 48 municípios, em 10 estados brasileiros, como operadora de concessões públicas de saneamento. A receita líquida no primeiro trimestre foi de R$ 282 milhões – alta de 11,4% em comparação ao mesmo período do ano anterior. O EBITDA (sigla de Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization, que significa 'Lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização') atingiu R$ 149,2 milhões.
– Nada impede a própria Corsan, ou a Aegea, de disputarem a licitação aqui – observa o secretário de Projetos Especiais e Saneamento de Gravataí Luiz Zaffalon.
Conselho Gestor de PPPs aprovou
A proposta da PPP da Corsan – que, é bom lembrar, prevê a terceirização de toda operação de esgoto nestas cidades, mas não o fornecimento de água potável como a licitação de concessão pretende estender em Gravataí – foi aprovada na semana passada pelo Conselho Gestor do Programa Estadual de Parceria Público-Privada do Governo do Estado.
32,5 mil empregos
Nos estudos apresentados, além da ‘universalização’ do esgoto para toda população e a conseqüente diminuição da incidência de doenças transmitidas pela falta de ligação das residências às redes coletoras, a Corsan e a parceria projetam a geração de 32,5 mil empregos diretos, indiretos e induzidos.
E as tarifas?
Na PPP, pelo que informa a Corsan, as tarifas de esgoto já cobradas hoje seguiriam determinadas pela agência reguladora (Agergs) e, pelo menos num primeiro momento, não sofreriam reajuste — seriam apenas repassadas à empresa vencedora da licitação para custear o serviço proposto.
Além das obras, o futuro contrato prevê a operação integral do sistema de esgoto, de modo a garantir os investimentos à ampliação dos serviços.
É o que Sartori quer
A decisão de Marco Alba de não aceitar a inclusão de Gravataí na PPP bate de frente com a concepção do governo Sartori sobre a Corsan.
De acordo com o diretor-presidente Flávio Ferreira Presser, com essa parceria o governo do Estado quer também que a Corsan possa aumentar seus investimentos em outros municípios.
— Na Região Metropolitana, onde há grande concentração populacional, os recursos serão privados e não endividarão a companhia. É uma parceria para o futuro. Todos ganharão. Serão recursos privados para manter a Corsan pública – argumenta, defendendo a idéia da PPP como uma política do governo Sartori.
— A aprovação da PPP é uma grande evolução para o Rio Grande do Sul do ponto de vista da saúde e da qualidade de vida. Significa a manutenção da Corsan como companhia pública e um avanço extraordinário no esgotamento sanitário. O Rio Grande do Sul só trata e coleta 14% do esgoto. Nós, com esta medida, poderemos universalizar toda a Região Metropolitana – associou-se o secretário de Obras, Saneamento e Habitação gaúcho, Fabiano Pereira (PSB).
Rios despoluídos
Conforme a Corsan, com a implantação da infraestrutura de coleta e tratamento de esgoto, os rios Gravataí e Sinos (que estão entre os dez mais poluídos do país) e também o Lago Guaíba serão beneficiados.
— Isso vai permitir que a população da Região Metropolitana tenha condições permanentes de abastecimento — sustenta o presidente.
A ‘Parceria pelo Futuro’
No projeto apresentado ao Conselho Gestor, a Corsan explicou que buscou a parceria público-privada no modelo de concessão administrativa, quando os serviços são prestados à administração e não têm relação direta com os usuários, garantindo que 100% da Companhia se mantenha pública. Na operação, estão previstos um contrato de 35 anos e a realização das obras pelo parceiro, com recursos privados.
A água está fora do pacote
A PPP é limitada a serviços de esgoto, com execução de obras de infraestrutura, ampliações e melhorias. Estão incluídos alguns serviços acessórios como gerenciamento das obras do plano de expansão tanto da Corsan quanto da SPE e dois programas comerciais: de gestão do parque de hidrômetros (instalação e substituição com a aquisição dos aparelhos) e identificação e eliminação de fraudes em água e esgoto.
Os serviços de água continuarão sendo totalmente operados pela Corsan.
Combinando com os russos
O cronograma da Corsan prevê o que seu presidente chama de ‘alinhamento com os municípios’. Ou o popular 'combinar com os russos', como dizia o Garrincha. É aí que Gravataí vai driblar a companhia, com a decretação da caducidade do contrato pelo governo Marco.
Se houvesse o aceite de todos, a idéia da companhia era abrir uma consulta pública pela internet, com prazo de 30 dias. Depois, seria marcada uma audiência pública. E por fim, será iniciado o processo de licitação para as obras.
A confirmação do decreto do prefeito, nos próximos 15 dias, vai parar todo processo.