A política é um ouroboros.
Mais de duas décadas depois, Miki Breier (PSB) e Daniel Bordignon (PDT) fizeram as pazes. O prefeito de Cachoeirinha nomeia nesta sexta a esposa do ex-prefeito de Gravataí como diretora administrativa financeira da Procuradoria Geral de sua Prefeitura, comandada pelo advogado Fernando Rodrigues.
É um CC de extrema confiança.
Reputo que, além do fato histórico, muda o 2022 e 2024 na aldeia dos anjos. E restam heróis da resistência da oposição.
Apesar de óbvia, não é análise para se fazer em uma tuitada. É preciso um pouco de contexto, para se entender o tamanho das personagens. Observemos passado, presente e futuro.
Comecemos pelo passado.
Daniel Bordignon e Miki Breier foram eleitos prefeito e vice de Gravataí em 1996 em uma improvável eleição. Eram do PT. Só venceram porque se uniram e é possível creditar a Bordignon ter bancado Miki contra apoiadores seus, como Sérgio Stasinski, que anos depois foi prefeito, mas já conspirava contra Miki.
Prefeito e vice brigaram em menos de dois anos.
Miki, que foi de uma cadeira no cemitério como vice a eleições como deputado estadual, em meio à saga foi para o PSB. Companheira de Miki naquele tempo, Anabel Lorenzi também. E cada um seguiu sua vida política, pouco falando mal um do outro publicamente, mas bastante nos bastidores.
Agora, Miki acolhe Bordignon. E Bordignon, como já descrevi em artigos anteriores, mostra uma darwiniana compreensão política, e humildade, para construir, e se reconstruir.
Voltemos para o presente.
Rosane Bordignon (PDT), que fez 44.195 votos na disputa pela Prefeitura de Gravataí em 2017, e perdeu por apenas 4 mil para o reeleito Marco Alba (MDB), em 2020 abriu mão da candidatura à reeleição como vereadora para concorrer a vice de Anabel Lorenzi.
Luiz Zaffalon (MDB) foi eleito com quatro vezes mais votos, mas a chapa das professoras ficou na terceira colocação e, mesmo fazendo menos da metade dos votos do segundo, segurou a ascensão de Dimas Costa (PSD), outro egresso do PT, que caso fosse eleito engoliria politicamente o PDT.
Algo como a disputa Lula e Ciro.
Nenhum ganhou, mas o PT perdeu menos, porque foi para o segundo turno com Fernando Haddad e manteve a polarização com Jair Bolsonaro. Juntos ganhariam? Sabe-se-lá. Certo apenas que, como dizia Frei Betto, “a esquerda só se une na cadeia”.
Como os lados da ferradura ideológica hoje parecem confusos, parafraseio para o contexto de Gravataí: “a oposição só se une para tomar cerveja” – ou água mineral, já que Daniel Bordignon não bebe.
Aí vamos para o futuro. Após cada um estabelecer seu quadrado na eleição de 2020, a impossibilidade de uma união pode estar mudando. E a conversa acontece na hora certa, não às vésperas das eleições, o que obrigaria a equilibrar amores, ódios e oportunismo.
Siga a leitura sabendo que, conforme as urnas, PDT e PSD são os maiores partidos de oposição em Gravataí.
O que me parece lógico, e não é nenhum QAnon, é que a indicação de Rosane faz parte de uma estratégia conjunta de Daniel Bordignon (PDT) e Cláudio Ávila (PSD) para abrir uma conversa entre a oposição em Gravataí – obviamente incluindo Dimas e seus 35.623 votos recebidos na eleição para a Prefeitura.
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Quem indicou Rosane foi Paulinho da Farmácia (PDT), reeleito para a Câmara de Cachoeirinha. Não é o Paulinho da Farmácia (MDB) de Gravataí, que não foi reeleito. Hoje o vereador de Cachoeirinha não é mais o genérico, como já ironizei anteriormente. Participa de uma operação da alta política junto a um de seus principais apoiadores que é… Cláudio Ávila, vereador de Gravataí!
Aí, se Ávila e Dimas andavam apartados, Ávila e Bordignon – que ganharam nas urnas a eleição de 2016, depois anulada pelo TSE – andavam conversando. Todos sabem que a política tem sua ‘ideologia dos números’ e, sem uma unidade da oposição, que inclui os Bordignons e Dimas, Marco Alba passará de rei a faraó.
É por isso que aposto que a partir da indicação de Rosane em Cachoeirinha a oposição em Gravataí começa a conversar projetando 2022, ano no qual Dimas quer ser candidato a deputado estadual, e, como em política não existe jogo de ganha-ganha, em 2024 Bordignon e Ávila poderiam repetir a chapa vencedora de 2016.
No entreato, resta aguardar o sacrifício do vereador Dilamar Sores, que pode ser o próximo presidente do PDT, e teria que falar com o irmão, Dimas, que é presidente do PSD. Vivem uma relação de Caim e Abel e vice-versa. Como presidentes dos dois maiores partidos de oposição, teriam que deixar de brigar pelo carrinho.
Ao fim, não achem que invento esses roteiros ‘De Dias Gomes’. Tentei ouvir confirmações. Despistaram. Tiraram-me para crente na teoria do astronauta antigo. Respondo: ‘Printe & Arquive na Nuvem’. Diz aquela máxima que o diabo sabe não porque é o diabo, mas porque é velho. Na meia idade, acerto bastante.
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