A inauguração da fase 1 da nova Emergência SUS do Hospital Dom João Becker foi ‘Política 40º’.
A cerimônia, num auditório lotado no novo Centro Administrativo, foi “entrega de um presente de Natal” para Gravataí, como disse o prefeito Luiz Zaffalon (PSDB), mas também lembrou – pelas rivalidades e intrigas, indiretas e diretas de novos velhos amigos ou inimigos, e o inevitável constrangimento do gerente – aquelas ‘festas de firma’ de fim de ano.
No caso, a Firma Gravataí, em meio à crise da III Guerra Política: Zaffa x Alba, pós Abílio x Oliveiras e Bordignon x Stasinski.
Antes, vamos às informações de um dia histórico para a saúde de Gravataí, cuja emergência atual foi construída há seis décadas, quando a cidade tinha quase dez vezes menos habitantes que hoje, quinta mais populosa do Rio Grande do Sul com 265 mil pessoas – conforme o superintendente do HDJB, Antônio Weston, mesmo número de atendimentos já feitos em 2023.
A nova Emergência ganha 20 novos leitos, que permitirão transferir e receber pacientes enquanto os superlotados 16 leitos atuais podem ser reformados caso avance a fase 2.
Até agora a obra custou R$ 10,5 milhões, com recursos dos governos municipal – a partir de orçamento da câmara entre 2021 e 2023 –, estadual, emendas parlamentares.
Para a sequência são é necessária a captação de outros R$ 8 milhões. Com dinheiro, em 300 dias a fase 2 pode ser concluída, conforme cronograma da Santa Casa.
A nova estrutura, que tem como retaguarda a nova UTI entregue há três anos e já com selo entre as 100 melhores do Brasil, além de recursos humanos a partir de um ‘hospital escola’ em convênio com a Unisinos, fica em uma área de 540 metros quadrados no térreo de um prédio de quatro andares em construção, anexo ao HDJB na avenida Dr. Luiz Bastos do Prado, onde são projetados um centro de diagnóstico por imagem e serviços de alta complexidade.
A obra em 1.330m² custaria outros R$ 16 milhões.
– Precisamos desses recursos. A Santa Casa opera hospitais. O Becker é de Gravataí, além de um grande pronto socorro regional – apelou, ao fazer a prestação de contas detalhada dos investimentos, o diretor-geral da Santa Casa, Julio Mattos, convocando políticos e empresários presentes; estes ainda tímidos em fazer doações em troca de impostos na legislação criada por Gravataí em 2021, quando a obra começou.
Aí veio o calorão.
Se ainda sem suador, Antônio Weston homenageou a Congregação das Irmãs do Imaculado Coração de Maria, que administravam o Becker até 2017, as menções de políticos ao papel do ex-prefeito Marco Alba (MDB) como “principal avalista” da negociação para compra do hospital pela Santa Casa subiram a temperatura.
– Fizemos asfalto, pontes do Parque, mas foi a realização de maior impacto social do governo do Marco, que trabalhou para que nenhum grupo de fora do Estado comprasse o hospital. Ampliou o contrato em mais de R$ 10 milhões, chegando a R$ 45 milhões ao ano, para viabilizar o negócio com a Santa Casa – disse Alan Vieira (MDB), que em sua gestão na Presidência da Câmara destinou R$ 4 milhões para obra, anunciando que incluía em seu pronunciamento trechos do discurso da deputada estadual de Gravataí Patrícia Alba (MDB), que teria sido deixada de fora do protocolo de falas da cerimônia.
Neste momento, os vereadores Alex Peixe (PTB), que deve ser eleito nesta terça-feira como presidente do legislativo para 2024, Bombeiro Batista (Republicanos) e Clebes Mendes (MDB), da base do governo Zaffa, levantaram e saíram.
– Que papagaiada – disse o último, alto, ao sair da porta.
Alison Silva (MDB), atual presidente da Câmara, também politizou, ao dizer que Marco Alba “trouxe a Santa Casa”, mesmo que setores do governo alertassem para o “alto custo”, citando “a Fazenda”, secretaria ocupada por Davi Severnini, que foi secretário no governo anterior, mas hoje é, além do responsável pelas contas públicas, também o principal articulador político do governo Zaffa.
– Me orgulho de nunca ter feito vídeo na frente do hospital criticando – disse, repetindo Alan, que antes falou em políticos “caça likes”; ambos mirando em vereadores que faziam oposição, e hoje estão no governo, além do ex-vereador Dimas Costa (PSD), presente na cerimônia como representante do governador Eduardo Leite (PSDB), de quem é secretário-adjunto dos Esportes.
Alison encerrou o discurso repetindo o bordão com o qual Marco Alba sempre encerra suas falas públicas: “Que Deus seja sempre louvado”.
Para amenizar o fervor político, Antônio Weston pediu a inclusão de Patrícia Alba no protocolo.
– Foi um erro do nosso protocolo. Assim que soube, incluímos a deputada, que é sempre muito bem-vinda – esclareceu o superintendente, perguntado pelo Seguinte: ao fim da inauguração.
Chamada, a deputada de Gravataí subiu ao palco, onde insinuou interferência do governo Zaffa para não ter sido incluída no protocolo, mesmo estando “em representação da Presidência da Assembleia Legislativa”.
– (a nova Emergência) É um sonho pensado lá atrás, no governo Marco, quando viabilizamos a vinda da Santa Casa – disse, aumentando ainda mais a temperatura ao dizer que os deputados devem votar aumento de ICMS nesta terça-feira.
Patrícia reafirmou voto contra, “para os gaúchos não pagarem entre 15% e 20% a mais”, também politizando, já que a proposta é do governador do partido de Zaffa.
Governo o qual Dimas ali também representava. E, em sua fala, defendeu, também estendendo o abraço ao anfitrião, Zaffa – alimentando a ‘interminável fofoca’ de que pode restar no governo e apoiar a reeleição do prefeito, apesar de ter-se apresentado como “adversário na última eleição” e “opositor”.
Elogiou Zaffa por “receber a todos”, o que “garante recursos”, como para a Emergência, e disse que a obra era “conquista da população, não de políticos”.
– Prefeitos não são donos da cidade – disse, se autodefendendo, e por extensão a vereadores que já postaram vídeos reclamando do atendimento no hospital e em UPAs, também administradas pela Santa Casa, ao argumentar que “a crítica ajuda mais que a bajulação”.
Fervendo a fala, Dimas defendeu o aumento de ICMS proposto por Leite, “governador que mais investiu na história de Gravataí”, e lembrou apoio de Marco Alba, então como deputado e secretário estadual, a aumento de impostos proposto pela governadora Yeda Crusius.
– Foi responsável, não foi populista – instigou.
Já Zaffa, ao falar, foi um bom anfitrião – ou ‘gerentão’, na alegoria da ‘festa da firma’ – e tentou dar uma esfriada nos ânimos; não sem cometer também seus recados.
Abriu discurso saudando todos os políticos presentes “em nome do Dimas, representante do governador”.
No discurso, disse que a Prefeitura cedia o auditório, “no nosso novo Centro Administrativo” (negócio criticado pelo grupo de Marco Alba a partir da compra do prédio da Ulbra pela Prefeitura), para organização e protocolo da Santa Casa – sem citar nomes, mas isentando o governo da suposta ausência de Patrícia Alba na lista.
Na sequência, saudou colaboração das irmãs que administravam o Becker, da Santa Casa, de Marco Alba, de Dimas e do governo Leite, além dos vereadores e presidentes da Câmara – citando Alison. Só não referiu Patrícia.
– É um presente de Natal para cidade, uma vitória de todos. As coisas se constroem somando – disse, também convocando políticos e empresários para busca de mais recursos para as fases sequentes das obras no HDJB.
– Será que não temos uma Nora Teixeira aqui? – brincou, referindo-se à esposa de Alexandre Grandene que dá nome ao novo hospital da Santa Casa em Porto Alegre, com aporte de R$ 80 milhões e modelo para os investimentos no hospital de Gravataí.
No encerramento, Alfredo Guilherme Englert, provedor da Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, representou na ‘festa da firma’ o veterano embaixador, transparente, mas contemporizador.
– Política é assim. Vamos distensionar – já disse na abertura, lembrando falha também com Patrícia no protocolo do lançamento da pedra fundamental da nova Emergência.
– Aquela vez chamei a deputada para falar, consegui fazer uma jogadinha… Hoje não deu – disse, espirituoso, arrancando risos de todos os ‘lados’, e em seguida elogiando os esforços de Marco Alba “nos convencendo” (a comprar o hospital) e de Zaffa “que faz tudo certo”.
A cerimônia encerrou com o descerramento de uma placa que ficará na entrada da nova Emergência, onde todos que falavam posaram para foto.
Ao fim, reporto o que testemunhei. São os fatos, aqueles chatos que atrapalham argumentos. Não reputo um “não foi nada” e nem um “foi baixaria”, conforme leitura de uns e outros. Restou, entre discursos e erros involuntários e voluntários, não mais que um dos tantos episódios da III Guerra Política que vive Gravataí. E a política passa. A Emergência fica. É o que importa.
– Estamos fazendo os últimos ajustes para começar o atendimento o mais rápido possível – disse ao Seguinte: o superintendente Antônio Weston.
Assista ao vídeo produzido pela SEGUINTE TV com entrevistas feitas na inauguração e, mais abaixo, com imagens dentro da nova Emergência