O Brasil começou com trabalho informal (ninguém nas caravelas de Cabral tinha carteira assinada) e o trabalho informal vai acabar com o Brasil (logo cada brasileiro será seu péssimo patrão de si mesmo).
O IBGE, cujas estatísticas tomam Rivotril para parecerem estáveis, não atina mais como recensear a população trabalhadora. A dúvida do IBGE é a seguinte: o que restou nesse território informal de 8 milhões km2? Ainda há algum trabalhismo coletivo ou o empreendedorismo individual já tomou conta da nação?
De carro, moto, bike, patinete ou a pé, a informalidade avança sem parar, e sem nunca avisar que vai dobrar à direita. A partir desse beco sem saída chamado mercado, a uberização empregatícia se infiltra. Por onde menos se espera, com o fardo da sobrevivência profissional nas costas, milhões circulam. Entregues à faina, entregam de tudo a todos, descomunal delivery nacional.
Além da vasta classe entregadora, vem a extensa classe prestadora: serviços cuja habilitação maior do prestador é um APP qualquer.
Uma credencial eletrônica a certificar mão de obra desqualificada, tipo ensino à distância, só que mais remoto. Desempregados que só encontram ofícios bem-sucedidos na plena precarização.
E o improviso é sempre genial: o curandeirismo vira medicina acessível, a gororoba ganha rótulo de produto gourmet, o faz-tudo de antigamente agora é múltiplo know-how, o trambiqueiro se tornou digital influencer, o passeador de cães se anuncia como dog walker,
o pistoleiro de aluguel foi promovido a milícia. Cada um se vira como pode, e todos podem cada vez menos.
E o mercado informal imita o capitalismo formal: o catador de sucata, esse herói da reciclagem, é explorado pela máfia do lixo,
o Uber explora motoristas, o tráfico na periferia explora crianças e adolescentes, os políticos exploram os laranjas, enfim, explosão de exploração.
Apertem os cintos: o trabalho sumiu!