José Rosa, presidente do Sindilojas, enviou ofício ao prefeito Marco Alba pedindo para, em meio à crise do coronavírus, abrir já nesta semana os comércios de Gravataí para vender chocolate para a Páscoa. O Seguinte: teve acesso a vídeo postado pelo empresário no grupo de WhatsApp do 'Chef na Cozinha' (badalação promovida anualmente pela entidade).
– Por mim todo o comércio estaria aberto – diz o empresário, hoje em distanciamento social por fazer parte do grupo de risco da infecção por COVID-19.
O vídeo de Zé Rosa foi em resposta a outro vídeo postado por Vilmar Mattos, fanático bolsonarista que incentiva o que chamo de ‘carretas da morte’, e tratei disso no artigo Parem Gravataí que eu quero descer!; declaro-me Inimigo do Povo, amigo da vida.
– Não podemos estar juntos só na hora de comemorar – instigou o vendedor de carros usados, com uma bandeirinha do Brasil em cima da mesa, alimentando, ao menos no meu imaginário, e talvez de outros participantes do grupo, a zombaria que apelida o Sindilojas de ‘Sindifestas’.
Após os vídeos, Rodrigo Silva, gerente executivo do Sindilojas Gravataí e Glorinha, postou mensagem pedindo “encarecidamente” que o grupo “tenha a finalidade somente para o evento Chef na Cozinha”.
Ao fim, antes que a Prefeitura responda ao ofício, antecipo: nem que se preocupasse mais com o estoque de chocolate, que os lojistas querem vender no balcão, do que com a falta de UTI para atender infectados pela COVID-19, o que acredito não ser o caso, o prefeito teria autorização para abrir o comércio antes do dia 16, data prevista pelo Decreto 55.154 publicado em 1º de abril pelo governador Eduardo Leite – o que José Rosa, ou qualquer pessoa, pode ler clicando aqui.
Ainda hoje, após a publicação do novo decreto no Diário Oficial de Gravataí, volto ao tema, para analisar o que levou Marco Alba a adequar o município às datas estaduais para retomada de atividades econômicas e das aulas (7 construção civil, 13 indústria, 16 comércio e 30 aulas e serviço público).
Por enquanto, compartilho com o leitor a Oração Póstuma, de Millôr:
Cada país tem o discurso de Gettysburg que merece: “Há 448 anos nossos Portugais fundaram neste continente uma nova subnação, baseada na opressão do índio e do negro, dedicada à extração de minérios e outras matérias-primas, e amparada no princípio de que os homens não são iguais e que, decididamente, há cidadãos de primeira e terceira classe. Agora estamos empenhados numa guerra civil para verificar se tal subnação – como outras, assim concebidas – pode existir e perdurar. Estamos aqui, reunidos num campo de conflito dessa guerra. Viemos aqui dedicar uma parte desse campo como último lugar de repouso – uma colônia de férias – para aqueles que tiraram tantas vidas a fim de que essa subnação possa sobreviver. Mas, num sentido mais amplo, não podemos consagrar, nem podemos santificar, este campinho de futebol do Morro da Providência. Os bravos que mataram aqui já o consagraram de maneira definitiva, muito acima de nossa capacidade de dar ou tirar. Todo o mundo subdesenvolvido notará e lembrará para sempre o que dizemos aqui, glorificando e imitando o que esses bravos fizeram. Quanto a nós, os que conseguimos sobreviver, de um lado e de outro, devemos reconhecer os nossos lugares (há os que nasceram para mandar e os que nasceram para obedecer, os que nasceram para gozar e os que nasceram para sofrer) e dedicarmo-nos à obra inacabada que as polícias federais já levaram tão longe. Decidamos aqui que elas não mataram em vão, que esta subnação jamais tornará a cair numa democracia – e que o governo, antepovo, sobrepovo e contrapovo, não desaparecerá da face do Planalto”.
É de 1971.
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