O Marco Alba das 19h, cantado como “o campeão voltou” no palco cercado de lideranças políticas de peso e abraçado pelo sorriso dos fãs, era o mesmo Marco Alba que até duas horas antes ainda perguntava sobre a urna do Rincão da Madalena, sobre quem estava acompanhando a apuração ou sobre quem cuidava do portão do comitê central da campanha.
Elétrico e atento para uns, chato e perfeccionista para outros, criador de estratégias ou decantador de boas dicas, mas invariavelmente a palavra final sobre quase tudo que o envolveu na eleição que terminou horas atrás, o prefeito reeleito de Gravataí poderia ter feito ali uma ode a si mesmo.
Na terra do ‘Grande Eleitor’ Daniel Bordignon e, piada interna da aldeia, ‘seus postes’, Marco cometeu a façanha de se reeleger quando quem vive a política da ao mesmo tempo global e provinciana terceira economia gaúcha sabe, era há dois anos uma impossibilidade até – ou principalmente – para os seus.
Mas no discurso da vitória, ele preferiu ser o Marco Alba que se apresentou ao eleitor durante os sete meses das duas campanhas. Um cara da paz, ou “do bem e de bem”, como gosta de falar.
Impossível achar que em seu íntimo não fosse instigado intrinsecamente por um desejo de extravasar e gritar:
– Ganhei!
Ou decretar outro ‘game over’ aos que a cada eleição remexem em seu passado processos que o torturam mais por não andar do que por chegar ao fim.
Diferente, o advogado que prefere ser chamado de político preferiu estrelar o palanque mantendo-se ‘de boa’, e por mais de uma vez conteve arroubos de apoiadores de peso, como o sanguíneo deputado federal e "um irmão há mais de 30 anos” Jones Martins, ou de carregadores de bandeiras da planície, que desabafavam ao microfone gritos como de “canalhas, canhalhas” aos adversários.
– Não façamos isso. Se nos tornarmos igual a eles, se propagarmos o ódio, estaremos autorizando-os a fazer tudo aquilo que condenamos – apelou Marco, iniciando um rosário (talvez não a, no momento, mais adequada analogia, já que no discurso buscou elevar o compromisso que assumiu na campanha com os crentes do povo evangélico) de agradecimentos.
Citou deputados e personalidades presentes ou não, fazendo uma menção bem-humorada a Jovir Costela, “agora é Jovir”, e, na figura de Paulinho da Farmácia, creditando a Sérgio Zambiasi e a Gugu Streit, do grupo do vereador mais votado da cidade, um papel decisivo nas visitas à periferia ao final da campanha. Brincou com o interino e carmelendo da Sé vacante Nadir Rocha, "o prefeito que mais inaugurou obras na história de Gravataí", e saudou a volta para casa do Dr. Levi e de Francisco Pinho. Nominou vereador a ex-vereador de sua base, intercalados com velhos companheiros de décadas de PMDB, como Sônia Oliveira, Zé Airton e Paulão Martins, até o momento das lágrimas, ao abraçar a ex-mulher (Marli) e ser abraçado emotivamente pelo filho (Alison) do ex-prefeito Acimar da Silva, assassinado em um assalto em 2015.
– O Acimar foi o primeiro, o avalista junto ao povo de que nosso projeto poderia mudar a cidade – disse, lembrando que, mesmo em um curto ‘mandato-tampão’ de um ano após a cassação da ex-prefeita Rita Sanco (PT) em 2011, o popular ‘senhor gentileza’ foi, duas décadas depois do também falecido Abílio Alves dos Santos, o primeiro peemedebista a sentar na cadeira da sala principal do segundo andar do palacinho rosa da av. José Loureiro da Silva.
Imperceptível talvez aos que não conhecem bem seu jeito de (mesmo sem cobrar a conta de ninguém) guardar sentimentos, ao chamar ao palco Tânia Martins, que apresentou como vizinha e cuidadora dos cinco filhos que estavam ali ao seu lado e foram, conforme ele, “os que mais sofreram com as baixarias da campanha”, Marco Alba disse que contaria um segredo, compartilhado até ali apenas pela companheira Patrícia Bazotti Alba, uma presença – e voz – forte ao seu lado tanto no governo quanto na campanha.
Interpretando pergunta e resposta, ele relatou diálogo com uma interlocutora de um instituto de pesquisa que consultou em janeiro de 2016 para saber suas chances de reeleição.
– Tens quanto tempo de política?
– 34 anos.
– O que planejas para teu futuro?
– Como todo mundo que nasceu pobre e tem que se virar na vida, nunca tive tempo de planejar muito. Sou de pensar um pouco e já executar.
– Se aceitas um conselho, não concorre, ou arriscas sepultar tua carreira política.
Sob os olhares de aliviados (e muitos até bem pouco descrentes) apoiadores, Marco contou ter pedido “dois minutos” para pensar.
– Na hora lembrei minha mãe Suely (falecida em 2013, pouco depois de sua posse como prefeito). Ela dizia que para ser alguém, tinha que ter coragem para não desistir e saber cair de pé. Hoje vocês me fizeram mais uma vez prefeito de Gravataí! – lacrou, passando da voz até ali comedida, a um alto volume que estremeceu as caixas de som.
Com 48.211 votos, 14.791 a mais do que os 33.420 conquistados na eleição anulada de outubro, o menino que antes de começar a viver a política por quase todas as horas do dia foi jardineiro e topógrafo cometeu aos 58 anos a façanha de ser reeleito prefeito da terra onde nasceu.
Numa festa onde os mais empolgados anteviam em seu futuro o Governo do Estado, um Marco sereníssimo parecia apenas sorrir para o momento. Da certeza de que até bem pouco era ‘o maior cabo eleitoral da oposição’, e 'prefeito nota 5', o pai de Bruna, Vitor, Vinícius, Renan e Lorenzo em dois anos virou o jogo e terá os outros (quase) quatro que pediu ao eleitor para completar seu projeto, que sempre lamenta ter sido atrapalhado pelas dívidas do passado e a crise política e financeira vivida pelo país.
Racional, Marco sabe que se mais de 48 mil pessoas confiaram nele como um bom gestor para cidade, outras 68 mil ficaram do lado de fora da casa arrumada. É essa, sem dúvida, a nova façanha que se apresenta para o filho da tão teimosa quanto dona Suely.