A seleção de futebol é o Brasil que deu certo (Carlos Alberto Gomes Parreira, técnico).
Fiquei quieto ao ser escolhido símbolo do fracasso em 1990 – a resposta veio à altura (Dunga)
A Copa do Mundo de 1994, nos Estados Unidos, acabou sendo uma das sete com prorrogação na final (após 1934, 1966 e 1978, e antes de 2006, 2010 e 2014), e a primeira das duas decididas em pênaltis, antes de 2006. O capitão do tetra foi Dunga, herói improvável que afinal herdou a faixa de comando, que já tinha passado por Jorginho, após Raí sucumbir à responsabilidade de liderar o time e acabar perdendo inclusive a vaga de titular.
Antes da Copa de 1994, o técnico da seleção brasileira, Carlos Alberto Parreira, tinha vindo a Porto Alegre para uma entrevista à editoria de esportes de um jornal. Na entrada do prédio, ouviu o pedido do porteiro:
– Parreira, manda esse teu time pra cima dos gringos, vamos atacar, jogar bonito, atropelar esses caras – disse o homem, com súbita intimidade e quase mandando.
– Pode deixar! – resmungou Parreira, seco, conformado, alheio (e olhando feio!).
– Atacar, deixar a defesa aberta, jogar bonito, e perder outra vez, mas pode deixar mesmo – resmungou o técnico, já longe do porteiro.
Na Copa nos Estados Unidos, o técnico foi contestado, criticado, vaiado antes de cada um dos sete jogos – pelos torcedores brasileiros! –, mas persistiu no seu pragamatismo durante todo o tempo. Na final, 0x0 no tempo normal e prorrogação, 3×2 nos pênaltis, deu Brasil.
A seleção fez apenas 11 gols nos seus sete jogos na Copa de 1994, modesta média de 1,57, metade dos 3,16 de 1970. Mas levou só três e foi tetra, depois de 24 anos de espera e de muito futebol bonito – aquele que também encantava até os adversários, inclusive porque no fim eram eles que acabavam ganhando mesmo.
A concentração do Brasil para a semifinal com a Suécia e a final com a Itália no Estádio Rose Bowl de Pasadena foi no Marriott, um hotel de seis andares em Fullerton, a 42 quilômetros de Los Angeles. A seleção ocupou todo o segundo andar, entradas pelos elevadores e escadarias vigiadas por seguranças 24 horas por dia, ninguém passava. Havia apenas três jornalistas no hotel, no quinto andar. Os jogadores, que não podiam receber ninguém no segundo, circulavam livremente.
Muito chimarrão foi tomado no apartamento do quinto andar naquela última semana da Copa de 1994, com a gauchada – Taffarel (encantado com a comunicação via computador), Dunga, Branco. Na tarde de sábado véspera do domingo da final com a Itália, Branco chegou nervoso, e começou a olhar de lado para o frigobar no apartamento do amigo. Lá dentro tinha uma coisa que não existia no segundo andar:
– Eu já joguei em 1986 e 1990, esta é a minha última chance de ganhar a Copa, mas a ansiedade de esperar o jogo de amanhã vai me matar antes!
O amigo entendeu: tirou uma cerveja pequena do frigobar e combinou, “só essazinha!”, e fez mais: pegou o celular, ligou para a filha, amiga de Branco, e botou o jogador para falar com ela. Depois de algum tempo, o lateral se despediu da amiga com um pedido:
– Reza pela gente!
Foi uma choradeira só – que se repetiu na madrugada do dia seguinte, quando Branco e Dunga bateram escandalolamente na porta do apartamento do quinto andar do Marriott Fullerton, Estavam (digamos assim) com os pés molhados, mas beeeeeeeeeeeeeeem molhados – os mesmos abençoados pés que no inicio da tarde daquele 17 de julho haviam feito dois dos três gols na vitória por pênaltis sobre a Itália. Nas mãos, traziam nada menos do que ela, sim, a Copa do Mundo:
– Pode abraçar. Ela não é linda?
Muito tempo antes, o jornalista tinha ouvido com inveja distante o relato de um colega mais antigo, que era amigo do grande atacante Zizinho e escreveu que tinha tomado umas doses de conhaque com ele em plena concentração durante um sul-americano no frio do Chile. O jornalista que tinha lido esse relato ficou com aquilo na cabeça até 1994, era a sua sexta Copa, as cinco primeiras havia visto o Brasil só perder, começava a pensar que era pé-frio. Além disso, décadas antes a seleção praticamente só tinha jogadores do Rio e São Paulo, e os jornalistas paulistas e cariocas faziam como se o time fosse monopólio deles, só eles podiam ser amigos dos jogadores da seleção.
No Rose Bowl, taça ao alto, ele lembrou da história de Zizinho e comparou com a cervejinha de Branco. Era uma realização pessoal, também – Brasil campeão e amigo dos caras! No fim, chorão contumaz, se abaixou em prantos sobre o laptop, como se estivesse sozinho no estádio barulhento, enquanto amigos alemães, holandeses, suiços, batiam nas suas costas com mãos de raquete, felizes, gritando “parrabems, parrabems …”. Foi preciso levantar a cabeça para não perder a festa de Dunga recebendo a Copa do vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore – e pensando “esses caras vão me matar”, ficar em pé para não ter alguma costela quebrada por aqueles malucos com seus eufóricos raquetaços.
Isso tudo não é balaca, nem para se prosear, mas o jornalista guarda com saudade e orgulho a chave do apartamento do Marriott, o ingresso número 50 da final no Rose Bowl, a credencial 4167 de 1994, e um presente que recebeu de Dunga tempos depois: uma moldura com a foto autografada do capitão com a camiseta do tetra e levantando a Copa, gritando “é nossa, porra”!
Agenda histórica do futebol gaúcho na semana
1.4, domingo
1917 – Federação Sportiva Rio-Grandense, FSRG, decide que estrangeiros só poderão jogar futebol em Porto Alegre após um ano de residência – Grêmio não aceita a decisão e abandona campeonato da cidade
2.4, segunda-feira
1918 – Primeira mulher sócia do Inter, Maria von Ockel
3.4, terça-feira
1955 – Renner campeão gaúcho (de 1954), 3×0 Brasil de Pelotas, Estádio Tiradentes, esquina Farrapos com Sertório
4.4, quarta-feira
1909 – Fundação do Sport Club Internacional
5.4, quinta-feira
1936 – Festival de inauguração do Estádio do Passo da Areia, do São José, que perde por 3×1 para o Inter
6.4, sexta-feira
1969 – Inauguração do Estádio Beira-Rio, Inter 2×1 Benfica de Portugal, primeiro gol é de Claudiomiro, 19 anos
7.4, sábado
1996 – Grêmio super-campeão sul-americano, 4×1 Independiente da Argentina, em Kobe, Japão