Associo-me ao artigo Matinal nas pegadas de Melo, do jornalista e historiador Juremir Machado da Silva. Faz o Matinal um jornalismo de excelência. Reputo simbólico áudio revelado, onde o prefeito de Porto Alegre fala “Doutor Gerdau”. Sigamos no texto.
Fiel ao seu princípio de fazer jornalismo investigativo com foco em Porto Alegre, a Matinal vem publicando uma série de reportagens, assinadas por Gregório Mascarenhas, sobre bastidores da gestão de Sebastião Melo na capital gaúcha. O primeiro capítulo deu o tom do material: “‘A palavra final sempre será minha‘, disse Sebastião Melo em áudio enviado à cúpula da Smed em 2022 sobre decisões da pasta”. A Secretaria Municipal da Educação, como se sabe, passou, nos últimos anos, da seção de ensino nos jornais para páginas policiais e judiciais.
Na matéria desta segunda-feira, 2 de dezembro de 2024, o caldo entorna ainda mais: “’Eu quero amanhã esse processo na minha mesa’”: áudios indicam que Sebastião Melo intercedeu em favor de empresa que venceu licitação conduzida pela Smed”. Bem diferente do bonachão do chapéu de palha da campanha eleitoral aparece um homem falando duro com seus funcionários não necessariamente por boas razões: “Eu volto à tona com a ferramenta Córtex. O doutor Gerdau (referindo-se ao empresário Jorge Gerdau Johannpeter) tem audiência comigo amanhã às 11h da manhã, esse assunto foi tratado com ele em dezembro, os documentos do Richard (Richard Lucht, sócio-fundador e CEO da CRTX, empresa que fornece o software) chegaram no meio do mês de fevereiro, janeiro, e nós estamos hoje no dia 7, 8 de fevereiro, e o assunto não andou. Então eu quero a instrução do processo até amanhã. Se, secretária, a senhora não puder fazer, a senhora delega. Tá? A senhora delega porque eu quero amanhã esse processo na minha mesa às 11h, tá bem? Saúde e paz”. Uau!
A secretária lenta seria demitida. Em outro momento, a fala do prefeito se torna mais popularmente clara: “Sônia, é importante ‘reavisar’ o Dr. Gerdau, ele estava com a data errada, fala com o Richard, ele não pode faltar à assinatura, ele é o padrinho desse processo, tá?” De que se tratava? Da licitação de uma plataforma educacional inicialmente emprestada à prefeitura de Porto Alegre. O resultado seria contestado por empresas que se sentiram prejudicadas.
Alegações: “A MSTECH foi uma delas. A empresa alegou que a prefeitura não justificou a escolha dos três nomes que compuseram a comissão julgadora: ‘(…) não foi destacado qualquer deles com competência profissional para analisar uma empresa, sob o ponto de vista jurídico e societário’”. Parece que o prefeito deve alguma explicação à sociedade. Por enquanto, porém, as mensagens da Matinal não foram respondidas. Talvez hoje surja alguma brecha na agenda de Melo. O emprego de prefeito obriga a dar esclarecimentos constantes a jornalistas de veículos considerados chatos. Que fazer? Está no pacote.
Uma licitação é caso típico de semelhança com a mulher de César: não basta ser honesta (transparente e republicana), precisa parecer honesta (transparente e republicana). Em princípio, em licitações não pode haver padrinhos nem apadrinhados. Deve ser um casamento sem amor ou sem namoro prévio. Nessa linha, não haveria razão de bater na mesa e gritar com funcionários. Bastaria deixar o processo técnico fluir.