eu canto o novo ano
como um pinguim batendo a cabeça na geleira, sem forças pro pulo certeiro
pra escapar do bote do predador com a boca arreganhando
eu canto o novo
como um orfão em cativeiro
eu canto o novo ano
feliz, por que sei que quem me ama ficaria triste por eu estar tão triste
mas estou triste – ela tambem está triste
eu canto o novo ano como um sonâmbulo
em onírico aprendizado
eu canto o novo ano
por que não posso cantar as minhas bravuras
sem ser desmentido ou desvalorizado
eu canto o novo ano
por que a eternidade das madrugadas
é o maior segredo da alquimia
e felicidade doméstica é para os tolos o maior dano
eu canto o novo ano
como um galo que pensou ser um cisne
e ultrajou a paciência da beleza
eu canto o novo ano
como o sino de uma catedral vazia
barulhento e inútil
esperando que o céu atinja como vacina
minhas veias que conhecem a chacina da baixa auto estima
eu canto o novo ano
entre cascas de aveleiras sonhando com suas sombras
eu canto o novo ano
crucificado em cadeiras
entre sabiás e palmeiras
eu canto o novo ano
longe das folhas que correntezam na fonte da juventude
longe das virtudes
longe dos dias dourados porém assombrados
de dor e desdéns
eu canto o novo ano
longe de quem amo
me evadindo como meninos em traquinagens entre as folhagens
eu canto o novo ano como cantei o outro ano
com um fogo de bondade oculto entre viagens circenses.