DIA MUNDIAL DA SÍNDROME DE DOWN

O abandono invisível: pessoas com deficiência, a Síndrome de Down e a falta de suporte familiar e social 

Pessoas com síndrome de Down buscam inclusão e quebra de preconceitos

Patricia Lisboa, pessoa com deficiência, bacharel em Direito, estudiosa dos direitos das pessoas com deficiência e que de forma pioneira já ocupou a Secretaria de Governança e Comunicação de Gravataí, escreveu artigo para o Seguinte: para marcar o Dia Mundial da Síndrome de Down, 21 de março


Nos últimos anos, o Brasil avançou na legislação e nas políticas públicas voltadas às pessoas com deficiência. No entanto, há uma questão pouco debatida e que segue como uma lacuna preocupante: o destino daquelas que, por falecimento dos responsáveis ou outros motivos, encontram-se sem suporte familiar e sem perspectiva de acolhimento adequado.

Neste Dia Mundial da Síndrome de Down, uma reflexão importante precisa ser feita: é inegável que muitas pessoas com deficiência conquistam autonomia e protagonismo em suas vidas, superando barreiras e se inserindo na sociedade de forma ativa. No entanto, ainda existe uma parcela significativa que necessita de suporte contínuo para garantir uma vida digna. Muitas dessas pessoas dependem integralmente de seus familiares para cuidados básicos, acompanhamento médico e inclusão social. Quando esses familiares falecem ou deixam de exercer esse papel, o que acontece? A resposta, infelizmente, ainda é a exclusão.

Em um país onde a rede de proteção social é insuficiente, essas pessoas acabam, de forma clandestina, em instituições que não foram projetadas para acolhê-las. Muitas vezes, são encaminhadas para casas de longa permanência para idosos, onde não recebem o suporte adequado para suas necessidades específicas, ou para comunidades terapêuticas destinadas ao tratamento de dependências químicas, espaços que não têm estrutura para lidar com a deficiência. Esse desvio na destinação dessas pessoas ocorre por falta de alternativas e políticas eficazes, agravando ainda mais sua vulnerabilidade.

Uma solução viável e humanizada seria a ampliação das residências inclusivas, que são espaços destinados ao acolhimento de jovens e adultos com deficiência sem suporte familiar. Cada residência tem capacidade para até 10 pessoas e funciona ininterruptamente, oferecendo atendimento personalizado e inserção na comunidade. No entanto, a implementação desse serviço ainda é precária, e a oferta é insuficiente para atender à demanda. Por exemplo, no estado de São Paulo, houve um aumento de 36,63% no número de residências inclusivas nos últimos dois anos, passando de 101 unidades em janeiro de 2023 para 138 atualmente.  Apesar desse avanço, a quantidade de unidades ainda é inferior ao número de pessoas que necessitam desse tipo de acolhimento em todo o país.  Além disso, há pouca divulgação sobre essa política, o que faz com que muitas famílias sequer saibam da existência desse direito.    

O Estatuto da Pessoa com Deficiência prevê que o Estado deve garantir moradia e apoio para aqueles que necessitam, mas, na prática, há um vácuo entre a legislação e a realidade. O que vemos são longas filas de espera, falta de estrutura adequada e escassez de profissionais qualificados. Para agravar a situação, a sociedade ainda carrega uma visão assistencialista, sem compreender que a inclusão vai além da caridade – trata-se de um direito fundamental.

É preciso ampliar esse debate. As pessoas com deficiência não podem ser tratadas como um problema familiar, mas sim como cidadãos que precisam de políticas públicas eficazes. O investimento em residências inclusivas, capacitação profissional e suporte contínuo para aqueles que perderam suas referências familiares deve ser uma prioridade.

O abandono invisível dessas pessoas é uma questão de dignidade humana e justiça social. Como sociedade, precisamos nos perguntar: qual futuro estamos construindo para aqueles que mais precisam de amparo? E o que podemos fazer para garantir que ninguém seja esquecido?

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