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O Dia da Mulher e a fonte da fonte | Thiane Nunes

Thiane Nunes (D) e Alice Portlas na exposição do centenário do icônico urinol

Doutoranda em pesquisa sobre misoginia nas artes desvela a verdadeira origem de uma icônica peça: o centenário 'urinol' de Duchamp, eleito a obra artística mais influente do século 20, foi 'roubado' de uma mulher

 

A escultura readymade do urinol de Marcel Duchamp, entitulada “a Fonte”, foi eleita a obra artística mais influente do século 20. Ontem mesmo fui com a amiga e colega Alice B Portlas numa exposição aqui em Porto Alegre que comemora os 100 anos dessa icônica peça de arte, numa terça-feira dadaísta que terminou em tangos no Odeon.

Mas o motivo dessa postagem é dizer que enquanto uma mulher souber de outra roubada, subtraída e esquecida, e enquanto outra quiser saber, a gente vai contar. A Fonte foi, na verdade, obra da artista dadaísta e excêntrica, a baronesa Elsa von Freytag-Loringhoven. Elsa, apesar da genialidade de seu trabalho e vida, nunca teve a fama nem a notoriedade recebida pelos seus colegas dadaístas homens, e foi varrida pra baixo do tapete pelos historiadores da arte…

A história conhecida do urinol é que, em 1917, Duchamp submeteu sua escultura ready made sob o pseudônimo de "Richard Mutt" para a exposição da Sociedade de Artistas Independentes de Nova Iorque, da qual Duchamp fazia parte da comissão julgadora e que tinha como objetivo expor toda e qualquer obra de arte submetida. O urinol, no entanto, foi recusado, então Duchamp saiu da comissão e usou esse caso para questionar os limites da arte e o lugar da obra de arte, como discutimos no primeiro parágrafo. O urinol foi presumivelmente jogado no lixo e o que restou foram as fotografias. A obra voltou a fazer sucesso entre artistas de vanguarda dos anos 50 e 60 e então o artista decidiu começar a fazer reproduções da obra. Em 2004, o urinol foi eleito a obra de arte mais influente da arte moderna.

Mas o que o Guardian e o Independent dizem – que algumas historiadoras hoje já comprovam por mais fatos e evidências recentemente "descobertas" (literalmente)-, é que em 11 de abril de 1917, Duchamp escreveu para sua irmã Suzanne, também artista, que uma amiga com o pseudônimo de Richard Mutt enviou uma escultura de um urinol para ser exibida na exposição. Acredita-se que essa amiga seja a Baronesa Elsa, já que ela estava na Filadélfia na época e a obra era originária do mesmo estado. Além disso, Elsa tinha o costume de achar objetos e proclamá-los obras de arte, ou seja, Elsa fazia ready mades antes de Duchamp dar-lhes esse nome.

R. Mutt para Elsa, significaria armut, alemão para pobreza ou, no contexto da exposição “pobreza intelectual”. No contexto da Primeira Guerra Mundial e de um sentimento anti-alemão que tomava conta dos Estados Unidos. O urinol, um símbolo masculino, foi virado de lado, revelando curvas e lábios femininos. O humor e a androginia eram outros traços marcantes do corpo de trabalho de Freytag-Lonringhoven.

Caído no esquecimento, Duchamp teria surrupiado uma ideia genial de uma amiga/amante e conseguido se consagrar como artista genial nas próximas décadas. Parece familiar pra você, mulher?

Se você quiser saber mais sobre essas e outras histórias, pesquisadas atualmente por um grupo de colegas doutorandas do Instituto de Artes da UFRGS, teremos um seminário aberto bem legal que vai ocorrer nas tardes de quinta e sexta-feira que vem, no Santander de Porto Alegre.

Mais infos em breve!

 

Thiane Nunes é publicitária, mestre em História da Arte e doutoranda em pesquisa sobre misoginia nas artes. Você acha ela no Facebook aqui.

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