game of thrones gravataí

O difícil recomeço do PT em terra salgada

Melo, presidente do PT de Gravataí, moendo cana em sua produção orgânica e artesanal

PT escolhe até o fim da semana entre três sindicalistas o candidato a prefeito. Juventude não aceita reaproximação com Bordignon.

 

José João de Melo atendeu ao Seguinte: na tarde desta segunda-feira, enquanto com um facão cortava cana na propriedade rural onde vivia sua bisavó, no Morro Agudo.

Ele é o presidente do PT e um retrato do novo momento do partido em Gravataí, bem longe dos gabinetes.

– Até o fim da semana devemos anunciar nosso candidato a prefeito – informou, enquanto, já curtido da coceira do contato com o joçá, jogava as braçadas do corte em cima de uma velha caminhonete.

– Uns dizem que ter uma candidatura é um ato heroico, outros acham que é tolice. Mas estamos muito felizes, com uma participação espontânea de 50, 60 pessoas nas reuniões, que lembra os primeiros momentos do partido – empolga-se, já vislumbrando na carga o xarope para futuros potes de melado orgânico, que produz de forma artesanal, e a compostagem das pontas da cana para alimentar os animais.

– Essa terra nunca viu uma gota de veneno – orgulha-se o agricultor, que entende que a principal lida da estação eleitoral é enfrentar, a pé que seja, no sol e na chuva, o ódio destilado contra o partido e mostrar que a debandada de líderes não salgou a terra petista duas décadas depois de chegar à Prefeitura pela primeira vez.

– Temos um legado de transformação para o país e para Gravataí que não podemos deixar ser envenenado pela política tradicional. Reconhecemos erros, mas fizemos muitas coisas boas.

– E sofremos dois golpes: um aqui, em 2011, com o impeachment da prefeita Rita Sanco, e outro em Brasília, com o afastamento da presidente Dilma Rousseff – avalia, dizendo que a “resistência e denúncia ao golpe” uniu ainda mais os que restaram no partido.

– As gravações envolvendo a cúpula do PMDB comprovaram o golpe, com a conivência do judiciário. É o maior vexame da história política do Brasil. Um fiasco internacional. Querem colocar no PT a marca da corrupção, mas é o PMDB e outros partidos que estão envolvidos até o pescoço – argumenta.

A candidatura à Prefeitura, que o partido apresenta ininterruptamente desde 1982, será escolhida entre três sindicalistas: Valter Amaral, do sindicato dos professores, Jairo Carneiro, da Federação dos Metalúrgicos e Lírio Segala, do Sindicato dos Metalúrgicos de Porto Alegre.

– É gente de história, que sabe defender nosso projeto em meio a essa política tão atípica de Gravataí.

– Também apresentaremos ideias para o futuro. Nas próximas semanas vamos começar a preparar um plano de governo com a participação popular – projeta Melo, ainda mantendo segredo sobre as estratégias para chegar às comunidades com uma estrutura esvaziada após a saída de Daniel Bordignon (a maior referência da história do PT da aldeia), dos vereadores Alemão da Kipão, Alex Peixe, Carlito Nicolait e Dimas Costa e de filiados e simpatizantes ligados a eles, ou mesmo decepcionados com a crise nacional vivida pelo partido.

– Temos 15 candidatos a vereador. Mas trabalhamos para ter mais – informa.

Entre os nomes, ex-secretários e assessores dos governos petistas, como Adelaide Klein, Paulo Bairros, Antônio Martins, Miriam Barbosa e Fabiani Rios, e caras novas, como Isab-el Cristiana Soares e o jovem Lucas Kirschke da Rocha.

Da Juventude do PT, que é de onde virá parte da organização das campanhas, de forma voluntária e com o uso das redes sociais, vem o grito mais alto por uma candidatura própria.

– Eles não podem ouvir falar em compor com alguma das candidaturas tradicionais já postas – confidencia Melo.

Então o PT de Gravataí já se desapegou de Bordignon? Dá para garantir, peremptoriamente, que é impossível uma reaproximação durante as eleições?

– Impossível é uma palavra difícil de usar na política. Mas é muito difícil. Ao lado dele está gente que participou do golpe contra a prefeita Rita – responde Melo, mexendo nos cabelos brancos como quem sabe que há tipos de cana que dobram mais fácil que outros.

– A forma como o Bordignon saiu do PT, na última hora, levando muitos militantes e pré-candidatos a vereador, nos deixou muito mal. Hoje o que posso dizer é que lançaremos candidato à Prefeitura. Os históricos e a gurizada estão empolgados – diz Melo, e se embrenha na roça da espécie a qual o Brasil já foi o maior produtor do mundo, e hoje vive um ocaso.

Como o PT, que já foi a maior potência eleitoral de Gravataí.

 

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