RAFAEL MARTINELLI

O discurso ‘tchutchuca’ de Bolsonaro na Paulista tem seu representante em Gravataí; O dilema do futuro detento e do policial federal vereador

De Gravataí, Coruja postou react sobre manifestação na Paulista

Nos anos 60 o filósofo canadense Marshall Mcluhan criou o conceito de aldeia global. De certa forma, antecipou a internet ao prever que o avanço nas tecnologias de informação e comunicação encurtaria as distâncias no mundo e o planeta se reduziria a uma organização semelhante a aldeias, onde tudo e todos estariam interconectados.

Sob este prisma, ‘globalizo’ uma personagem da aldeia dos anjos, Gravataí, para analisar a manifestação do bolsonarismo na Paulista.

O vereador Evandro Coruja (PP) – em seu dilema como policial federal – foi Bolsonaro e o bolsonarismo em sua postagem no Instagram, neste domingo em que o ex-presidente confessou seu crime.

Assista ao vídeo clicando aqui.

Começo a análise por uma questão metafísica.

Ao se referir a Lula como “nove dedos” e usar uma deficiência para definir um adversário, Coruja diz muito sobre a alma – e a sanidade – do bolsonarismo. Vídeos do domingo circulam em profusão nas redes sociais.

Porém, e isso é um sintoma da gravidade da situação do inelegível e do desespero dos seus, essa condição moral não restou a essência do que diz o político de Gravataí em seu react, e daquilo que disse seu mito no palanque.

Foram discursos ‘tchutchuca’.

Bolsonaro pediu pacificação e anistia, em sua turnê de despedida como futuro detento. O fez de seu jeito, admitindo não estar falando “tudo que pensa”. Algo como: me deixem livre, para ver o que ainda posso fazer.

Mas, diferente de manifestações anteriores, não houve nem ao menos insinuação de ordem alguma para o dia seguinte dos seguidores. Se alguém saiu da Paulista contando 72h foi para o pastor Silas Malafaia ser preso.

Para piorar, ao admitir a existência da minuta do golpe, sem precondições existentes à época para estado de defesa e estado de sítio, que não fosse perder a eleição democraticamente nas urnas, Bolsonaro confessou seu crime vídeo que, conforme o UOL, a PF já anexou ao inquérito do golpe.

Está lá, no Código Penal, entre os “Crimes contra as instituições democráticas”, a “Abolição violenta do Estado Democrático de Direito”:

Art. 359-M. Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído:

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos, além da pena correspondente à violência.

Por obvio é “tentar”, porque se o golpe fosse consumado, em vez de punições teríamos medalhas aos golpistas.

Coruja, por sua vez, limitou-se a comemorar “um dia histórico para conservadores de todo o Brasil e de nossa Gravataí”, no qual, conforme ele, “a direita retoma as ruas”.

Não fez, porém, nenhuma defesa técnica, ou mais enfática, da inocência de Bolsonaro frente à série de provas, que seus colegas da Polícia Federal já descobriram, sobre a tentativa de golpe de estado.

– Sempre estive ao lado de Bolsonaro – foi o máximo que arriscou.

Nenhum ataque discursivo ao STF, para além de endossar uma manifestação que tinha isso como notório objetivo.

Foi a imprensa o alvo principal da reaparição do vereador em postagens polêmicas neste 2024. Frente à arregada de Bolsonaro, restou apelar para ser assunto.

– Quanto mais batem, mais cresço – disse, numa verdade insofismável, porque hábil é em transitar entre os fanáticos que consideram que o grande erro do golpe foi não dar certo; e, usando da ilusão (clique aqui para assistir ao vídeo imperdível no qual o professor João Cezar de Castro Rocha explica freudianamente o bolsonarismo ), ganha votos como representante-raiz da extrema direita em sua aldeia.

Nem a fake news do milhão aplicou: referiu-se a “milhares” presentes na manifestação.

Conforme grupo de pesquisa da USP, cerca de 185 mil compareceram na manifestação que, em resumo, defendia “liberdade” para dar golpe de estado. A ferramenta é usada cientificamente para medir gado por metro quadrado em negócios da pecuária, conforme coordenador explicou na GloboNews.

Menos do que o bolsonarismo já reuniu, mas muita gente. Dois Maracanãs. Nenhuma surpresa. Lula venceu Bolsonaro por 50,88% a 49,12%, na disputa presidencial mais acirrada da História do Brasil.

Para registro, entre os quase 200 mil de verde, amarelo, muito 60+, pele majoritariamente branca, bastante tintura loiro golpista e luta de classes da Paulista, não estava o vereador Coruja, devido a “problemas pessoais”.

Reputo há explicações para discursos ‘tchutchuca’, em tom bem abaixo dos tigrões do passado recente em que era preparado um golpe de estado, insisto, conforme as provas já levantadas pelo colegas de Coruja na Polícia Federal.

Bolsonaro sabia que poderia ser preso ontem mesmo. E Coruja é policial federal. Quem tem, tem medo, para usar uma linguagem de reunião presidencial do período 2019-2022.

Ao fim, se foram iguais nos discursos neste domingo, Coruja – que quando não sequestrado por pautas da seita bolsonarista é um bom vereador – ainda pode mais que Bolsonaro.

Ao mau militar só resta apelar por anistia enquanto aguarda o julgamento e a prisão por até 23 anos como traidor da pátria. Para Coruja ainda será permitido respeitar sua corporação e não se associar a uma organização criminosa golpista, e a seu chefe, quando a cadeia chegar para Bolsonaro.

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