entrevista com Marco Alba

O futuro começou

Marco Alba, prefeito de Gravataí

Prefeito falou com exclusividade para o SEGUINTE: sobre gestão, crise, novos investimentos e política. Ele aposta na Gravataí do amanhã

 

Não é nenhum fã da esquerda, é Marco Alba (PMDB) quem cita uma frase do icônico ex-presidente uruguaio José Mujica para descrever o pensamento com que governa Gravataí:

– Estou aqui para servir, não para me servir.

O custo político de curto prazo, com medidas por vezes impopulares, o homem de 57 anos, que na quinta tentativa chegou à Prefeitura com 51.283 votos, não se importa em bancar.

– Já tenho muita estrada. Não estou aqui para usar o governo para fazer carreira política. Meu compromisso é com o futuro de Gravataí. Estou enfrentando problemas que nunca foram enfrentados.

– Não vai ser a eleição que vai mudar isso. Não sou candidato a mais simpático ou mais querido – resume.

Coragem não lhe falta para fazer coisas que contrariam o senso de preservação tão comum aos políticos. Às vésperas do aniversário de Gravataí, Marco mandou postar no Facebook da Prefeitura um vídeo mostrando que documentos históricos comprovam que a data correta para as comemorações não é hoje, 8 de abril, e sim em 23 de outubro. E não são 253, são 136 anos.

– É a verdade. Por que fugir da verdade? – argumenta.

 

 

O buraco e o rombo

Se a política é a arte de vender esperança, a esperança que Marco vende não é a de tapar os buracos da cidade amanhã de manhã. É sim cobrir um rombo nas contas públicas, encerrar o primeiro mandato com uma Prefeitura gastando apenas o que pode gastar e com dinheiro em caixa para novos investimentos.

Que, se tudo der certo, não são pouca coisa.

– Com responsabilidade, Gravataí tem tudo para dar novamente um salto de crescimento. Não somos como o Rio Grande do Sul, por exemplo, que levará uns 30 anos para se recuperar – avalia.

O SEGUINTE: foi ouvir o prefeito e traz trechos da conversa de mais de uma hora, realizada no fim da tarde de ontem, na Prefeitura, onde Marco também fala de política.

– Se não mudarmos o jeito de fazer política em Gravataí, vamos morrer todos abraçados. Eu não briguei com ninguém, mas continuo vendo muito o ‘um contra o outro’ e pouco a favor da cidade.

 

Marco comemora bons indicadores de gestão

 

A ESPERANÇA DE MARCO

“O sacrifício da austeridade, estamos fazendo. Que o futuro será melhor, não é uma esperança, há indicadores para mostrar isso. Hoje a Prefeitura tem ferramentas de gestão, tem um gerenciamento moderno e capacidade de atrair financiamentos e investimentos novos. No ranking das melhores cidades do Brasil, da revista IstoÉ, ficamos no primeiro lugar do Rio Grande do Sul em sustentabilidade financeira, em quarto na gestão em educação e em quinto nos indicadores sociais entre os municípios de grande porte”.

 

SEM CARTÃO DE CRÉDITO

“Nunca houve gerenciamento adequado. A Prefeitura funcionava na base da ficha, da nota na gaveta, da despesa autorizada por telefone. Hoje temos um sistema integrado, com uma gestão onde os secretários assinam contratos de metas, e não se permite gastar mais do que se arrecada. Sem reserva de saldo, nenhuma secretaria pode empenhar nada. Minha esperança é que um dia todo cidadão vai poder ir lá na internet, ver as contas públicas e questionar aqueles que prometem o que sabem que não vão cumprir: como tu vai fazer isso? Será o fim das mentiras na política”.

 

OS EXs

“Não trabalhamos com a lógica eleitoral. Arrumamos a casa e profissionalizamos a gestão. Todos os governos que passaram usaram a Prefeitura para impulsionar carreiras políticas e construir partidos. Nós não misturamos partidos e eleições com a gestão. Prefeitura não é comitê eleitoral. E isso não é só discurso. Na campanha disse que o perfil do secretariado seria técnico e cumpri. Tanto que apenas três saíram para concorrer. Historicamente a gente via todos os secretários saírem para concorrer”.

 

A DÍVIDA-MONSTRO

“Temos uma dívida consolidada de R$ 300 milhões e mais R$ 200 milhões judicializados, ali no Fórum esperando para cair na conta. Foram despesas feitas sem garantia de saldo, que a Prefeitura não pagou. Isso sem contar os R$ 750 milhões de dívida com o Ipag (o instituto de previdência e assistência dos servidores)”.

 

A IMAGEM DO CALOTE

“Gravataí era a imagem do calote. Em qualquer negociação para pagamento de dívidas pela Prefeitura já era determinada judicialmente a retenção de recursos direto na fonte, nos repasses do FPM (fundo de participação dos municípios). Aí foram R$ 50 milhões sequestrados no nosso primeiro ano, mais R$ 40 milhões no segundo e… chegou-se aos R$ 130 milhões. A boa notícia é que estamos honrando os pagamentos. Ano que vem, por exemplo, serão R$ 15 milhões a menos em dívidas com precatórios, que são uma verdadeira indústria em Gravataí”.

 

DILMA DEVE

“O governo Dilma tem R$ 38 milhões em dívidas com Gravataí, que seriam investidos na saúde e em obras de pavimentação, praças e quadras esportivas. Só no segundo mandato da presidente, de R$ 20 milhões em repasses conveniados, não chegaram mais de R$ 3 milhões”.

 

A CRISE COMEU

“Gravataí costumava ter um crescimento real de 10% ao ano. A crise, iniciada em 2014, no ano da eleição da Dilma, nos pegou em cheio. O crescimento caiu pela metade e, ano passado, o crescimento foi negativo. Se o ritmo de crescimento tivesse se mantido, teríamos R$ 850 milhões, e não os atuais R$ 680 milhões. São R$ 170 milhões a menos. Os R$ 7 bilhões da GM viraram R$ 4 bilhões no bolo do ICMS do Estado, o que nos fez perder ainda mais que outros municípios. São questões contábeis, chatas, que às vezes as pessoas não querem saber, mas que tem influência na vida de todo mundo. Gravataí foi crescendo e adaptando a esse crescimento os serviços oferecidos, muitos deles permanentes, como na área da saúde. Aí, de repente, esse crescimento caiu de 10% para abaixo de zero. Não há fórmula mágica. Você precisa cortar investimentos, cortar serviços. Com a Lei de Responsabilidade Fiscal, não há mais como o prefeito do momento se autofinanciar, como muitos fizeram, deixando de pagar a conta com a RGE, com a Corsan, com o Ipag, ou deixando de recolher o FGTS”.

 

O BOM PAGADOR

“Gravataí chegou ao absurdo de ter mais de 100% da receita comprometida com dívidas. Em 2003, a conta chegava a R$ 108,3 milhões, e a receita era de R$ 107,5 milhões. Em 2012, tínhamos um comprometimento de 56% da receita, que reduzimos para 39% no ano passado. Estamos falando de R$ R$ 227 milhões para R$ 189 milhões”.

 

AGRADECIMENTO À CÂMARA

“Um governo só é austero quando tem sustentação política. Sou um prefeito sem medo de fazer as mudanças e a Câmara honra sua parte. Agradeço muito aos 14 vereadores da nossa base, que foram firmes na aprovação de medidas que eram mais do que necessárias, eram urgentes. Só com o Ipag tivemos que apresentar dois projetos de aumento de contribuição, para cobrir o rombo previdenciário. Sem isso, não teríamos nenhuma certidão para contrair financiamentos ou receber recursos estaduais e federais”.

 

Prefeito projeta obras sociais ainda este ano

 

100 MILHÕES PARA OBRAS

“Austeridade não significa deixar de gastar, e sim gastar bem o que se tem para gastar. Graças aos nossos bons indicadores conseguimos do Banco de Desenvolvimento da América Latina um financiamento de mais de R$ 100 milhões para asfaltamento de uma centena de ruas e estradas vicinais, recapeamento de 50 outras via, obras em escolas, no Parcão e mais 15 praças, além de abrigos de ônibus e também investimentos na saúde. É dinheiro que vai para obras, não para o caixa único da Prefeitura. Se tudo der certo, começaremos as obras ainda este ano. Mas dá para brincar que o próximo governo está resolvido, seja quem estiver aqui. É um legado que deixaremos para a cidade”.

 

Inauguração do Centro Obstétrico no Hospital

 

PRIORIDADE: SAÚDE

“É verdade: não fizemos praticamente nada em infraestrutura. Não foi possível tapar os buracos nas ruas. Mas investimos muito acima das exigências constitucionais em saúde, educação e assistência social. São R$ 190 milhões em educação, R$ 170 milhões em saúde, R$ 20 milhões em assistência social, em comparação com R$ 50 milhões em obras e R$ 40 milhões nos serviços urbanos. Não tínhamos recursos e fizemos uma opção. Podíamos investir 15% da receita em saúde, mas usamos mais de 23%. Há quem prefira investir o mínimo em saúde e gastar mais em asfalto, porque investir na saúde para alguns é enxugar gelo, e o asfalto, de repente, dá mais votos… Há quem prefira distribuir em outras ações o dinheiro que investimos para que todas as crianças ganhassem uniforme escolar. Na campanha nosso slogan era “uma cidade mais humana e mais moderna”. No governo, foi isso que fizemos. Modernizamos a gestão e, no momento de crise, priorizamos o uso do dinheiro que tínhamos na área social, principalmente na saúde. A mortalidade infantil caiu a 6,96 a cada mil, enquanto o Estado comemora a marca histórica de 10,1 para cada mil nascidos vivos, por exemplo. Isso é um dos principais indicadores para medir a atenção na saúde. Enfim, olhamos para as pessoas, não para os votos”.

 

UMA UPA EM 180 DIAS, OUTRA ATÉ O FIM DO ANO

“Na UPA (unidade de pronto atendimento) da parada 75 foi preciso trocar a empresa que fazia as obras. Mas a UPA vai abrir em 180 dias. Serão 120 para conclusão, mais 60 para mobiliar. Já a UPA da Morada do Vale começa na semana que vem e será concluída até o fim do ano”.

 

REFORMAS EM 10 POSTOS

“Inauguramos neste sábado a reforma no posto de saúde da Morungava, e em 60 dias a reforma do posto da Cohab C, além de termos previstas reformas em mais 10 unidades de saúde”.

 

SEIS CRECHES

“Há coisas sobre as quais não temos como achar soluções de curto prazo. Tínhamos previstas 15 Emei’s (escolas de ensino infantil), mas a empresa que faria as obras quebrou. Ela tinha obras com uma série de prefeituras, que ficaram devendo porque não receberam os repasses do governo federal. Ao fim, devemos ter concluídas seis Emei’s. As outras estamos renegociando”.

 

Inauguração da duplicação da Avenida Itacolomi

 

ROTA TURÍSTICA

“Vamos fazer uma rota turística que será o principal acesso à Serra, da BR-290, passando pela GM, Arthur Soares da Costa e Morungava”.

 

FUNCIONALISMO E INTERESSES

“Minha relação é de muito respeito com o funcionalismo. Corrigimos algumas distorções, o que por vezes fere interesses. Um exemplo é a extinção da RDE (regime de dedicação exclusiva), que permitia ao prefeito dar ou tirar vantagens de servidores que por vezes correspondiam ao dobro do salário. O critério poderia ser conceder o benefício a um servidor necessário, ou a um aliado do prefeito. Quem poderia medir isso? Mexemos bastante também nas horas extras, que muitas vezes eram depois incorporadas nos salários e aposentadorias. Só para dar uma ideia: em 2012 o gasto com horas extras foi de R$ 7 milhões. Hoje é de R$ 2 milhões”.

 

O TROCA-TROCA DE PARTIDOS

“O quadro político segue o mesmo, focado das pessoas e não dos partidos, o que não acho certo. Avalio que o governo não ganhou, nem perdeu. Começamos com 14 vereadores na base e perdemos um (Dilamar Soares), que já esperávamos. O que critico são as mudanças na lei eleitoral. Uma piada. Acabar com a fidelidade partidária só piora essa crise moral e política que vivemos. Para mim, bastavam duas leis: fidelidade partidária, para que os partidos se acostumem a apresentar e seguir seus programas, independentemente das circunstâncias de momento das pessoas, e também a coincidência dos mandatos. Hoje o prefeito é eleito no primeiro ano e vai tomar pé da Prefeitura; no segundo ano o presidente e o governador são candidatos e a lei eleitoral não permite que invistam nada; no terceiro ano é o presidente e o governador que estão tomando pé e no último ano tem eleição para prefeito. É insano isso. O certo seriam todos – presidente, governador e prefeitos – começarem os mandatos juntos e se responsabilizarem pelo que se comprometeram com os eleitores”.

 

Ao lado da esposa Patrícia na festa da vitória

 

IMPEACHMENT DE UM MODELO

“Como prefeito, não é uma questão de ser contra ou a favor. Espero é que as coisas melhorem para Gravataí e para os municípios, que sempre serão o lado mais fraco. O modelo político atual está esgotado. E não estou falando apenas do governo federal, mas de tudo que nos cerca. Os políticos morrem de medo de mudar, mas se não mudarem morrerão todos abraçados. Ah, então o Abílio, o Mota, o Bordignon, o Stasinski, a Rita, eram todos ruins? Não. Mas aquele modelo de fazer política está esgotado”.

 

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