3° Neurônio | fábula

O gavião e o pinto | João Carlos Pacheco

Um pintinho muito curioso e distraído, um dia se afastou da ninhada de seus irmãos e foi sozinho ciscar longe da sua mãe galinha.

Um gavião faminto, que voava ali perto já de olho nos pintinhos pra pegar algum, vendo aquele sozinho, zás! num voo rasante, mergulhou  e apanhou o distraído pintinho com suas garras afiadas e lá se foi céu acima com ele.

O pintinho, apavorado, começou a implorar aflito:

– Me larga, seu gavião malvado. O senhor não tem medo que Deus, que está vendo tudo, lhe dê um castigo bem grande por você vir caçar um pobre pintinho indefeso como eu? Eu que ainda nem cresci e que poderia ser um grande galo pra alegrar com meu canto as madrugadas das pessoas? Não teme, gavião malvado, que a ira do Senhor lhe quebre uma perna ou o pescoço por esta injustiça?

– Cala a boca, seu pintinho idiota. Não me amole e pare de reclamar. Primeiro porque esta é a lei, eu preciso comer e você não passa de uma boa refeição de gaviões. E segundo porque essa bobagem de Deus não existe. Deus é uma invenção dos homens pra justificar sua soberba de que são os donos do mundo e que podem tudo, inclusive comprar, vender e até matar e comer nós os bichos. Vou te comer sim. Essa é a lei.

O pobre e indefeso pintinho, já ciente de seu cruel destino, tenta espernear pra ver se consegue se livrar das garras do gavião, mas não consegue.

Nisso, ouve-se uma sequência de tiros de espingarda: catapum!,pum, pum… E uma carga de chumbo grosso atinge em cheio o peito do gavião, que despenca do alto mortalmente ferido, deixando o pintinho cair intacto no chão.

Apavorado mas livre, o pintinho se manda correndo rumo ao galinheiro, falando bem alto pro gavião moribundo ainda ouvir:

"Tudo bem que Deus não existe, mas o dono do galinheiro existe, seu babaca. E te acertou em cheio. Bem feito!…"

 

Moral:

O que é do homem, o bicho não come.

 

João Carlos Pacheco é publicitário e humorista, vive em Porto Alegre. Participou da antologia de humor QI 14, de 1975. Para nosso prazer e do leitor, o Seguinte: passa a publicar uma série de suas fábulas, inéditas. 

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