Desses crimes que estão nos chocando em 2016, talvez o mais bárbaro repercutido pela mídia, tenha acontecido essa semana. Um pai foi morto, executado impiedosamente à luz do dia, dentro do seu automóvel, no estacionamento movimentado de um supermercado, em frente à filha de quatro anos, que, dos ferimentos que vai levar para a vida, os estilhaços que machucaram o seu rosto foram os mais leves.
Esse crime entra no hall das barbáries de 2016 junto de milhares de outros crimes no Estado, como a mulher que saía do aeroporto, a que estava em frente à escolinha aguardando a sua filha, a adolescente arrastada por cem metros na Cidade Baixa, o jovem morto no saguão do aeroporto Salgado Filho. Mas esse tem um ingrediente cruel: a testemunha ocular da história é uma criança de quatro anos que viu o seu pai executado por outros homens. Tiveram que quebrar os vidros do carro para tirá-la lá de dentro. Tente imaginar aqueles minutos em que ficaram apenas ela, machucada, e o corpo ensanguentado do seu pai à sua frente e você pode imaginar o quanto isso vai interferir na vida dessa menina.
Essa semana a minha filha quebrou o dentinho da frente e possivelmente terá de passar por um tratamento de canal, que eu nem sabia que era possível fazer em crianças até seis anos. O seu dentinho de leite pode escurecer com o tempo, e só isso já me deixou apavorado, com receio de que, até mesmo um pequeno problema estético até vir o dente permanente, pode afetar na sua autoestima e personalidade. Agora imagine essa menina. Que não vai mais ter o pai para leva-la para a cama, contar histórias, fazer a mamadeira, assistir filme, passear. E que viu esse pai ser executado a centímetros de onde estava. A que preço?
Nós entramos numa era perigosa onde já não medimos mais as consequências e, talvez, já nem nos abatemos mais pelos crimes brutais, de tão corriqueiros que se tornaram. Esse crime é o mais cruel de todos porque semeou a infelicidade numa criança de quatro anos. E essa criança não é apenas uma vítima do tráfico, da insegurança, mas da falta de investimentos, de políticas públicas, afetada pelos milhões, bilhões da corrupção que deixam de ser reinvestidos na base da pirâmide do Estado: saúde, educação e segurança. Essa criança é uma vítima de todos nós. Até mesmo, de quem vota errado.