Analiso a nota oficial da Prefeitura sobre o Mato do Julio, assinada pelo prefeito Miki Breier, o vice Maurício Medeiros e o secretário de Planejamento e Captação de Recursos, Elvis Sandro Valcarenghi.
Siga cada trecho comentado.
“(…)
As negociações para composição de um acordo que contemple os interesses do povo cachoeirinhense e dos proprietários da área sempre existiram e ora avançaram mais, ora menos. Na etapa atual, chegou-se ao maior avanço entre todas as outras tentativas, considerando a vontade da atual administração municipal e a disposição dos proprietários.
(…)”
Antecipei em 9 de julho, no artigo O que será feito do Mato do Julio publicado pelo Seguinte:, que o acordo estava próximo. Políticos, jornalistas, ambientalistas e outros preocupados com o futuro da mega área verde em zona urbana começaram a investigar, até que o jornalista Roque Lopes, de O Repórter, trouxe informações sobre o projeto na reportagem Os detalhes do estudo do Mato do Julio que vazou.
Bastou para a demagogia campear tipo macega.
Sigamos.
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Destaca-se o fato de que a área em questão é PARTICULAR e não pertence ao município, não podendo ser negligenciado a eles o direito de usufruir da propriedade. Atualmente esta área não possui Zoneamento Urbanístico sendo este o principal aspecto de inflexão entre as partes e o ponto de partida para o acordo.
Salientamos que os campos da fazenda estão localizados em perímetro urbano em bairro densamente urbanizado e a Lei Municipal do Plano Diretor estabelece a necessidade da elaboração de um Plano Setorial do Mato do Júlio. Com o passar dos anos, diversos estudos técnicos foram realizados, mas para a conclusão do Plano Setorial, é importante que algumas diretrizes sejam ajustadas com os proprietários, uma vez que não se trata de Propriedade Pública e que a população pode se beneficiar destes ajustes.
Foi formada uma comissão com a participação de representantes dos proprietários, procuradores do Município, técnicos da Secretaria da Fazenda, técnicos da Secretaria do Planejamento, que debateu os cenários e uma proposta foi encaminhada contemplando os cinco eixos, tendo como ponto de partida o Zoneamento Urbanístico.
Importante salientar que o Zoneamento Urbanístico não é licenciamento.
Praticamente todo o território do Município pertence a uma ZONA URBANÍSTICA e nenhum empreendimento, desde uma casa a até uma grande indústria, estará licenciado sem que sejam aprovados os projetos de engenharia e obtida a licença ambiental.
(…)”
É o obvio ululante.
Mas uma explicação necessária já que, como alertei acima, a demagogia abriu uma picada principalmente na Câmara, que criou uma elogiável Frente Parlamentar, mas cujos discursos já começaram errados, num clima de ‘nós contra eles’, ‘mocinhos e bandidos’ e etc.
Certo é que não sai nada no Mato do Julio sem ajustes no Plano Diretor, que dependem de audiências públicas e aprovação da Câmara, além de um longo caminho para a liberação das licenças ambientais.
Mas manter o Mato do Julio apenas como ‘pulmão de Cachoeirinha’ é ilusão. Grosseiramente, o Mato do Julio já era. É só questão de tempo. A área é particular. Avaliada próximo a R$ 1 bi. A dívida de R$ 25 milhões dos proprietários em IPTU, contestada na justiça e em negociação com a Prefeitura, é um troco nessa negociação.
Insano imaginar que a Prefeitura poderia desapropriar a área, por exemplo. Corresponderia ao orçamento de três anos somados.
Sigamos.
“(…)
Sobre os eixos: Eixo 1 – Zoneamento, com definição de índices construtivos. E, para tanto, foram exigidos: Eixo 2 – Definição das Diretrizes viárias, estabelecendo por aonde passarão as futuras ruas, independentemente do projeto que será proposto e se será proposto. Eixo 3 – Aceitação pelas partes da antecipação da doação de área Institucional, sendo 6,3 hectares no entorno da Casa dos Baptista, a ser deduzida do cômputo geral das áreas institucionais a serem designadas, conforme legislação. Eixo 4 – Antecipação da doação de uma faixa de 60 metros de largura, dentro das diretrizes viárias, para construção de uma interligação perimetral à freeway que una o Parque da Matriz a Rua Papa João XXXIII, a ser deduzida do cômputo geral das áreas viárias a serem designadas, conforme legislação. Eixo 5 – IPTU- Composição entre Dívida Vencida e Dívida Vincenda através de DAÇÃO em pagamento utilizando-se de áreas dentro da propriedade.
(…)”
As exigências da Prefeitura são uma forma de garantir o pagamento dos R$ 25 milhões, salvando o patrimônio histórico da Casa dos Baptista (ainda não tombada regularmente) e garantindo área suficiente – e de forma antecipada, ou seja, antes do período de vendas do empreendimento – para construção de uma perimetral ligando a chamada Região 1 ao Parque da Matriz, o que ajudaria a solucionar um dos gargalos no trânsito da cidade.
Não vejo os tantos que se importam com o destino do Mato do Júlio apenas como oportunistas de véspera de ano eleitoral, ou ‘secadores de governo’. São justas as preocupações, já que, mesmo que seja atraído um público de maior poder aquisitivo, se na região tem pai que leva filho de Camaro na creche pública, como tratei em É preciso comprar vagas em creches, enquanto chegam de carroça ou de Camaro, é uma exigência projetar que os moradores de futuros empreendimentos habitacionais terão que se deslocar por, e usar os serviços públicos de, Cachoeirinha.
Os impactos ambientais também precisam ser medidos. Em Gravataí, por exemplo, se queria tanto o shopping que riram da prefeita Rita Sanco que encomendou o ‘estudo dos ventos’. Anos depois, o shopping alagou.
Esse negócio é coisa séria. Para ser acompanhado bem de pertinho, cobrando total publicidade dos atos de governo e observando quem tenta fazer uso político da polêmica, vendendo dificuldades para receber facilidades. Que a demagogia tenha ficado só no calor de discursos anteriores e seqüentes à instalação da Frente Parlamentar, apenas como um dano colateral pelo governo ter tentado barrar a aprovação.
Ao fim, o destino da área de 256 hectares, mesmo particular, não tem como ser decidido em um gabinete. Miki sabe, e nunca quis isso. Mas que o Mato do Julio já era, é só uma questão de tempo.
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