O colega jornalista Rodrigo Becker manda WhatsApp:
– Vivi o dia para concordar com o David Coimbra. Credo.
No link enviado, o artigo O Brasil elegeu o prevalecido do colégio como presidente: a diferença entre coragem e valentia, publicado nesta quinta por GaúchaZH.
Vale a reprodução. Ao fim, comento.
“(…)
Os Estados Unidos se autoproclamam a “terra dos bravos”. O Brasil se tornou o lar dos valentes.
Mas, atenção, não se trata de elogio. Valentia é diferente de coragem. Coragem é fazer o certo, mesmo quando se perde com isso. É assumir a responsabilidade. É colocar a lealdade acima do interesse.
Valentia é outra coisa. O valente, em geral, é temerário ou covarde. O valente temerário, que pode ser um eufemismo para burro, é aquele que enfrenta um inimigo muito mais forte só para provar o seu destemor. O valente covarde é aquele que desafia um inimigo muito mais fraco só para humilhá-lo.
O valente covarde, por exemplo, é o que pratica bullying. Ele sabe que pode bater na sua vítima, então a oprime. Ele não corre nenhum risco, mas se sente grande por poder diminuir outra pessoa.
O governo brasileiro é assim. É um governo de valentões, o governo do prevalecido da escola, do tio que conta a piada constrangedora no almoço de domingo, da madame que fala alto no cinema.
Sob esse governo, a ignorância não aumentou entre os brasileiros, mas se tornou orgulhosa. É uma ignorância que bate no peito e se mostra, radiante. Agora é bonito ser grosseiro, porque a grosseria é confundida com autenticidade.
O chefe do governo, Bolsonaro, se esmera a cada dia para dar exemplos eloquentes desse tipo de comportamento. A diversidade é seu lema, porque ele ataca em praticamente todos os setores, do golden shower às cadeirinhas para crianças nos carros.
Ultimamente, ele tem se dedicado com ardor (mesmo) à área da ecologia. Nosso presidente valentão dispensou os bilhões que noruegueses e alemães mandavam para ajudar na preservação da Amazônia e ainda sugeriu, cheio do sarcasmo típico dos machões, que o montante fosse repassado a Angela Merkel, para que ela cuidasse das florestas da Alemanha, talvez sem saber que esse é provavelmente o país do mundo que mais se empenha na conservação da natureza.
Depois disso, diante dos 72 mil focos de incêndio que neste momento estão consumindo a Amazônia, Bolsonaro disse que essas queimadas provavelmente são criminosas e apontou como culpadas as ONGs que atuam na região.
É grave.
Porque, ora, Bolsonaro é o presidente da República. É a maior autoridade do Brasil. Se ele tem informações de que ONGs estão incendiando a Amazônia, sua obrigação é mobilizar o aparato repressor do Estado para deter os criminosos. Mas, se ele não tem informação, se é palpite ou desejo, sua acusação cai sobre pessoas inocentes, muitas dessas que trabalham com seriedade para salvar a floresta.
A julgar pela forma como se comportam Bolsonaro e seus auxiliares nesse caso, provavelmente a segunda hipótese é a correta: a denúncia é falsa. Você, perplexo, talvez esteja se perguntando: por que ele faria isso? Por que ele cometeria tamanha irresponsabilidade? A razão é óbvia: é porque ele é um valentão. Valentões acham uma frescura esse negócio de ecologia, de ONGs, de preservação da natureza. Bolsonaro, mais uma vez, está apenas sendo quem é. É a tal autenticidade tão admirada pelos brasileiros de hoje. O Brasil elegeu o prevalecido do colégio como presidente. Agora terá de aguentar o bullying.
(…)”
Analiso.
Assino embaixo o texto de David Coimbra no espectro que trata. Mas é preciso ir além, e observar algo que não só 'manda para o SOE', como pauta identitária e vocabulário escatológico. Expulsa, realmente derruba presidentes: é a profundidade do bolso das pessoas. Faltou ao jornalista apontar o principal bullying que comete o ‘mito’: a valentia burra que prejudica a economia do país.
A ameaça de deixar o Mercosul, onde está o terceiro parceiro comercial do Brasil, a Argentina, e, no caso de Gravataí, destino de carros da GM e proteção contra uma invasão de veículos produzidos por montadoras chinesas, virou troco perto dessa crise internacional envolvendo a Amazônia.
É uma queimada de erros, cujo combustível é o discurso bárbaro de Bolsonaro que insufla outro prevalecido, o ‘machão de multidão’. É aquele do jogo de futebol, que sozinho corre da briga, mas quando junto a galera da Popular do Inter, ou da Geral do Grêmio, e mais um goró, xinga, humilha e surra o gurizão, a menina ou o pai de família que caminha sozinho para o estádio.
A palavra do presidente tem força. Ainda mais um líder de seita – mesmo que eleito com 39,6% dos votos e com popularidade em queda livre entre não-convertidos, aqueles mais simpáticos ao antipetismo que às diatribes do ‘mito’.
É Bolsonaro que torra um ativo do país. Em oito meses viramos símbolo da devastação ambiental, mesmo que entre as maiores economias do mundo tenhamos uma das maiores áreas de preservação: 60% da cobertura vegetal original.
Não é pouca coisa na geopolítica Emmanuel Macron tuitar que a próxima reunião do G-7 tem que incluir a crise na Amazônia na pauta. Até porque o Napoleão de Hospício é outro, o presidente da França não vai pedir nenhum tipo de intervenção militar, ou outras loucuras que filhotes do fascismo queriam, por exemplo, para a Venezuela. O napalm pode cair é sobre o agronegócio, origem do que o Brasil mais vende para o mundo. Basta comprarem menos produtos agrícolas e menos carne, que a economia nacional entra em colapso.
O noticiário já mostra que exportadores brasileiros começam a enfrentar desconfiança do ‘mercado’ internacional. Ou é um ‘comuno-petralha’ Blairo Maggi, maior produtor de soja do Brasil que, em 2005, ganhou o ‘prêmio’ Motoserra de Ouro do Greenpeace, como maior desmatador do cerrado naquele ano? É o sujeito que alerta para o risco das chamas consumirem o acordo comercial entre o Mercosul e a União européia.
Não pode o valentão com a faixa presidencial subdimensionar o impacto de, ao lado de ministros e ideólogos malucos, negar evidências científicas do aumento do desmatamento, indicadas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe); ou o aumento das queimadas no Brasil com consequências como a escuridão sobre a cidade de São Paulo dia 19.
O impacto de sanções ao agronegócio seria pior do que a destruição da indústria pesada pela Lava Jato, cuja força tarefa não bastou prender bandidos das empreiteiras, mas exterminá-las, levando a um prejuízo de R$ 55 bilhões e incinerando 500 mil empregos nos últimos quatro anos.
Consumida por uma crise política da baixeza de Eduardo Cunha, Dilma caiu agarrada à pauta de desonerações da Fiesp que não gerou empregos; Michel Temer só não caiu por ser um ‘hábil negociador’ com o Congresso, apesar de sua reforma trabalhista também não ter reduzido o desemprego; e Bolsonaro, ainda estocando esperança com incertos impactos positivos da reforma da previdência de seu ‘posto ipiranga’, arrisca cair ao brigar com o mundo, por pura ideologia, usando para o bullying o que mantém viva nossa economia: o agronegócio.
Diferente do ‘agro é pop’, o ‘mito’, se continuar fazendo bullying com a economia, logo será pop apenas para fanáticos. Que nem com fake news seguram um impeachment no Congresso Nacional.
Ao fim, tornar-se-á literal a máxima de James Carville, estrategista de Bill Clinton:
– É a economia, estúpido!