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O Santo Graal da física teórica: a fórmula mágica do gênio Stephen Hawking

Stephen Hawking, fotografado em Cambridge em 1988

S=A/4, físico encontrou sua fórmula mágica como um anti-herói. O Seguinte: recomenda e reproduz o artigo publicado pelo El País

 

Stephen Hawking nos ensinou que, embora os buracos negros possam se formar rapidamente em uma catástrofe do espaço-tempo, se desintegram com tamanha lentidão que na verdade evaporam ao longo de incontáveis eras do universo, mas guardando até o final os segredos da sua estrutura. Parece uma metáfora da própria vida do famoso físico, que viveu sua própria catástrofe temporal aos 21 anos, quando foi diagnosticado com uma variante da esclerose lateral amiotrófica (ELA) e alcançou a fama mundial enquanto suas faculdades físicas iam evaporando lentamente, mantendo até o final o segredo da sua incrível fortaleza como ser humano.

A honra máxima de um físico teórico é alcançar a imortalidade através de uma fórmula fundamental, uma dessas raras ocasiões em que a natureza revela uma engrenagem do seu mecanismo oculto – um resultado nítido e contundente, ao estilo E=mc2, que muda tudo. Stephen Hawking encontrou sua fórmula mágica, a que aparece no título deste artigo, como um anti-herói. Tentando refutar uma ideia extravagante de Jacob Bekenstein, um visionário físico israelense de origem mexicana, Hawking acabou lhe dando razão. Mediante uma complicada análise matemática feita de forma puramente mental, sem a ajuda de papel e lápis, estabeleceu a equação S=A/4. A chamada fórmula de Bekenstein-Hawking diz que a quantidade de informação oculta num buraco negro, que os físicos chamam de entropia e denotam com a letra S, é igual à área da borda externa do buraco divida por quatro.

Nesse caminho, Hawking demonstrou que os buracos negros, as cataratas de espaço vazio previstas na teoria da relatividade geral de Einstein, não são para sempre, e sim que evaporam lentamente, emitindo partículas quânticas. Entretanto, Hawking foi além e provocou uma crise nos fundamentos na física teórica ao propor que os buracos negros não só ocultam informação como também a destroem, contrariando os princípios básicos da mecânica quântica. Iniciou assim uma batalha conceitual contra os defensores da ortodoxia quântica, capitaneados pelo prêmio Nobel Gerardus ’t Hooft, que recorda em muitos aspectos os velhos debates entre Einstein e Bohr sobre o papel da teoria quântica nos fundamentos da física. Assim como no passado, o partido ortodoxo é o vencedor oficial desde que Hawking finalmente admitiu, em 2005, que os buracos negros afinal de contas não destroem a informação. Mas a batalha mudou o panorama da física teórica ao mostrar que a fórmula de Bekenstein-Hawking é a porta de entrada para a teoria da gravitação quântica, algo como o Santo Graal da física teórica. Hoje, centenas de físicos teóricos de todo o mundo buscam elucidar as consequências últimas dessa expressão, que relaciona dois mundos separados: a informação e a geometria, a linguagem da física do novo milênio.

A evaporação quântica do buraco negro, demonstrada em 1975, é provavelmente o grande legado de Hawking. Mas então já era um físico muito respeitado por seus trabalhos incisivos na matemática da relatividade geral. Em uma famosa colaboração com Roger Penrose durante a segunda metade dos anos 1960, os dois britânicos demonstraram uma série de teoremas que estabeleciam rigorosamente os limites do conceito de espaço-tempo de Einstein, tanto no interior de um buraco negro como no Big Bang, no início da evolução de nosso universo. Mais tarde, nos anos 1980, Hawking foi um dos pioneiros de uma ideia fantástica: que as galáxias que povoam o universo se originam em flutuações quânticas da energia escura, pressupondo que o universo passou por uma fase de expansão exponencial, conhecida como era da inflação cósmica. Recentemente, Hawking compartilhou com o cosmólogo russo Viatcheslav Mukhanov o prêmio BBVA Fronteiras do Conhecimento (2016) por suas contribuições para esse resultado.

Durante toda a sua carreira, Hawking sempre se distinguiu por ser um pensador com uma originalidade férrea e obstinada. Com frequência nadou contra a corrente e sempre encontrou pérolas no fim do caminho. Desde os anos 1990 se tornou uma celebridade mundial como divulgador da física e personagem midiática extravagante, recriando em parte o papel que o próprio Einstein havia desempenhado como o paradigma do gênio. Era dotado de um senso de humor negro e provocador, na melhor tradição britânica, que com frequência despejava sobre os incautos jornalistas e fãs. Sua tremenda estatura intelectual e midiática, conseguida em uma situação de adversidade extrema, transformou-o em um campeão da raça humana. Trabalhou até o final, mas principalmente abriu caminhos que continuaremos explorando durante muito tempo.

 

José Luis Fernández Barbón é pesquisador do Instituto de Física Teórica IFT UAM-CSIC.

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