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Olívia de Havilland, o brilho de uma estrela centenária | Diego Nunes

 

Neste 1° de julho de 2016 a atriz Olivia de Havilland, uma das últimas estrelas dos anos de ouro de Hollywood ainda vivas, completa 100 anos.

 

 

Olivia Mary de Havilland nasceu no Japão, em 1916. Seu seu pai, um advogado inglês, era professor na Universidade Imperial de Tóquio. Sua mãe, Lilian Augusta de Havilland, havia sido atriz teatral, mas deixou a carreira quando mudou-se com o marido para o Japão. Foi lá que nasceu também sua irmã, a também atriz Joan Fontaine.

 

: Olivia de Havilland aos 100 anos

 

Em 1919 Lilian convenceu o marido a mudar-se para a Califórnia, que tinha um clima mais quente e propício para a saúde fragilizada de Olivia, que sofria de uma forte bronquite. A família ficaria pouco tempo, mas após Joan contrair pneumonia, a mãe das garotas decidiu que morariam lá em definitivo, na cidade de Saratoga. Em 1925 o pai deixou a família, fugindo para viver com uma antiga amante japonesa.

Apesar de ter abandonado a carreira de atriz, Lilian ensinava as filhas a apreciarem as artes, e o próprio nome Olivia foi retirado de um livro de William Shakespeare, Lady Olivia, da peça Noite de Reis. Após o divórcio, ela casou-se novamente, com George Milan Fontaine, um homem detestado pelas duas irmãs.

Aos 17 anos Olivia entrou para o clube dramático da escola que estudava, e em 1933 estreou no teatro interpretando o papel título na peça Alice no País das Maravilhas, uma produção dos Interpretes da Comunidade de Saratoga. No ano seguinte, a atriz ganhou o papel de Puck na peça Sonhos de Uma Noite de Verão, de Shakespeare, no teatro da Comunidade de Saratoga. O diretor austríaco Max Reinhardt estava na Califórnia, produzindo a mesma peça no Hollywood Bowl, e convidou Olivia para entrar no seu elenco, substituindo a atriz Gloria Stuart (a atriz que interpretou a personagem Rose já idosa, no filme Titanic, de 1997), que havia deixado a produção após receber um convite para atuar no cinema. Olivia interpretava Hermia.

 


 

: Olivia de Havilland em Alice No País das Maravilhas

 

Max reinhardt foi convidado pela Warner Bros para levar esta mesma peça para as telas de cinema, e chamou Olivia para fazer o papel que ela havia feito no teatro. Foi sua estreia cinematográfica.

Apesar de ser seu primeiro filme, só foi lançado no final de 1935, após o lançamento de outros três filmes em que a atriz também aparecera. A atriz agradou, e a Warner lhe ofereceu um contrato de sete anos, e lhe deu papéis maiores, promovendo-a ao estrelato.

Ainda em 1935 a atriz iviveu sua primeira protagonista, no filme Capitão Blood (Captain Blood, 1935), ao lado de outro novato que despontava no estúdio: Errol Flynn.

 


 

: Olivia de Havilland e Errol Flynn em Capitão Blood

 

O filme fez enorme sucesso, de público e crítica, e a dupla agradou tanto que a Warner ainda os reuníu em outros sete filmes, no período de 1935-1941, incluindo outros grandes sucessos como A Carga da Brigada Ligeira (The Charge of the Light Brigade, 1936), As Aventuras de Robin Hood (The Adventures of Robin Hood, 1938) e A Estrada de Santa Fé (Santa Fe Trail, 1940).

 


 

: Olivia de Havilland e Errol Flynn num descanso entre filmagens

 

Em 1939 Olivia insistiu para que o presidente do estúdio, Jack Warner, deixasse-a tomar parte de um filme que eles produziam, mas para o qual não havia sido escalada. Ela precisou recorrer à esposa de Jack, implorando que intercedesse. E assim, a contragosto, ganhou o papel da doce Melanie Hamilton em …E o Vento Levou (Gone with the Wind, 1939). O filme tornou-se um sucesso instantâneo, e Olivia de Havilland se recebeu sua primeira indicação ao Oscar por este filme, perdendo o prêmio para a colega Hattie McDaniel (a primeira atriz negra a ser indicada pela Academia). Embora não tenha levado o prêmio, a atriz tornou-se se símbolo da doçura em filmes norte-americanos, uma imagem que ela mesmo tentou se desvincular anos mais tarde, na tentativa de conseguir papéis mais desafiadores.

 


 

: Olivia de Havilland em …E O Vento Levou

 

Apesar do sucesso a situação de Olivia na Warner se complicou devido à sua teimosia em atuar em …E o Vento Levou. A atriz foi rebaixada a coadjuvante em um filme com seu antigo partner Errol Flynn, em Meu Reino por um Amor (The Private Lives of Elizabeth and Essex, 1940), uma forma de castigo imposta pelo estúdio. Mas em 1941 foi novamente indicada ao Oscar, por seu papel em A Porta de Ouro (Hold Back the Dawn, 1941), perdendo o prêmio para a sua irmã, a atriz Joan Fontaine, que ganhou por Suspeita (Suspicion, 1941), de Alfred Hitchcock.

 


 

: Olivia de Havilland e Joan Fontaine na entrega do Oscar de 1941

 

Joan Fontaine também estreara no cinema em 1935, fazendo pequenos papéis. Quando estreou, sua mãe a proibiu de usar seu nome original no cinema (Joan de Havilland), dizendo que só poderia existir uma “de Havilland” em Hollywood. As irmãs nunca tiveram uma boa relação, e Joan ter recebido um Oscar antes de Olivia só piorou as coisas ainda mais.

Mesmo sendo indicada a prêmios importantes, Olivia de Havilland se via presa a um contrato, que a obrigava a aceitar o papel que lhe oferecessem. Cansada de interpretar ingênuas donzelas em perigo, começou a desafiar a Warner recusando os papéis que lhe eram impostos, que nada exploravam seu potencial dramático. Como consequência, recebeu uma suspensão contratual de seis meses.

Seu contrato acabou em 1943, e a atriz comemorou o fato de poder aceitar papéis mais desafiadores em outros estúdios, mas foi informada que teria que permanecer na Warner por mais seis meses, para pagar o período que ficou suspensa. Olivia se revoltou, e procurou seu pai advogado, que disse que tal punição era ilegal. Apoiada pelo Screen Actors Guildo (o sindicato dos atores de Hollywood), abriu um processo contra o estúdio.

Durante a batalha judicial, ficou fora das telas por dois anos, mas acabou sendo bem sucedida na ação. Tal decisão virou uma lei batizada de “Lei Olivia de Havilland”, que reduziu o poder dos grandes estúdios e deu maior liberdade aos atores. Assim, Olivia tornou-se pioneira na luta pelos direitos dos atores.

A atriz retornou ao cinema fazendo três filmes na Paramount Pictures: Só Resta Uma Lágrima (To Each His Own, 1946), Champanhe para Dois (The Well-Groomed Bride, 1946) e Tarde Demais (The Heiress, 1949). Sua luta por papéis mais expressivos surtiu efeito, e a atriz finalmente recebeu seu primeiro Oscar, justamente por Só Resta Uma Lágrima. Três anos depois receberia outro por Tarde Demais.

 


 

: Olivia de Havilland e seus dois Oscars

 

Também foi indicada ao Oscar por Na Cova das Serpentes (The Snake Pit, 1948), que fez na Twenty Century Fox. No filme ela interpreta uma paciente com esquizofrenia, internada em um sanatório. Até hoje ela considera que este foi seu melhor papel. Uma curiosidade: na Itália, o filme chamou-se “La Fossa delle Serpente” e um casal que havia assistido ao filme em Roma, comentou que a situação do amigo deprimido era como de Olivia, interna na “fossa”, e assim surgiu a expressão sinônimo de tristeza no Brasil.

 


 

: Olivia de Havilland no filme Na Cova das Serpentes

 

A atriz recusou o papel principal de Uma Rua Chamada Pecado (A Streetcar Named Desire, 1951), pois havia acabado de dar a luz ao seu primeiro filho. Vivien Leigh, sua colega de …E o Vento Levou ficou com papel, e recebeu um Oscar por seu desempenho. Olivia  começou a recusar cada vez mais papéis, parecendo não se interessar mais pelo cinema, e suas aparições começaram a ficar mais escassas na década de 50. Em 1953 ela conheceu em Paris o jornalista Pierre Galante, que trabalhava para a revista Paris Match. Divorciada de seu primeiro marido, Olivia e Galante se casaram em 1955, e ela passou a residir na França. Após alguns anos reclusa, atuou em Luz na Praça (Light in the Piazza, 1962), um filme da MGM rodado na Itália, e co-estrelado pelo astro italiano Rossano Brazzi.

E quando suas antigas colegas da Warner Bross, Bette Davis e Joan Crawford viram suas carreiras serem ressuscitadas após estrelarem o filme de suspense O que Terá Acontecido a Baby Jane? (What Ever Happened to Baby Jane?, 1962), ela não demorou muito para tentar retornar ao estrelato atuando em filmes do gênero. Protagonizou então A dama Enjaulada (Lady in a Cage, 1964), onde fazia uma milionária presa em um elevador, atormentada por uma gangue que invadiu sua mansão para roubar. O filme rendeu muitos elogios a Olivia e ao estreante James Caan (que fazia o lider da gangue), mas foi muito criticado devido as cenas excessivas de violência.

 


 

: Olivia de Havilland em A Dama Enjaulada

 

Olivia faria mais um filme do gênero, Com a Maldade na Alma (Hush…Hush, Sweet Charlotte, 1964), ao lado da antiga colega e amiga Bette Davis. Devido ao seu retorno às telas, foi convidada a presidir o juri do Festival de Cannes de 1965, sendo a primeira mulher a ocupar tal posto.

 


 

: Olivia de Havilland com Bette Davis em Com a Maldade na Alma

 

Na década de 70 acabou atuando nos “filmes catastrofe”, que tanto fizeram sucesso na época, aparecendo em Aeroporto 77 (Airport’ 77, 1977) e O Enxame (The Swarm, 1978).

 


 

: Olivia de Havilland em O Enxame

 

Foi nesta época também que cortou relações definitvas com a irmã. Olivia e Joan tinham problemas de relacionamento desde a infância e, dizem alguns biógrafos, que a mãe fazia distinção entre as duas, preterindo Olivia. A mãe inclusive foi contra a entrada de Joan no cinema, dizendo que não queria que ela se aproveitasse da popularidade da irmã (embora ela mesma tenha atuado no cinema graças à influência das filhas, usando o nome de Lilian Fontaine).

 


 

: Olivia de Havilland e Joan Fontaine nos anos 40

 

A situação das irmãs só piorou quando cada uma recebeu seus respectivos Oscar (até hoje são as únicas irmãs que conquistarem o prêmio de melhor atriz). As irmãs pararam de se falar definitivamente quando a mãe faleceu em 1972 e Joan também cortou relações com as próprias filhas, ao descobrir que elas ainda matinham contato, em segredo, com a tia. Em uma entrevista em 1978 Joan declarou: “Casei-me primeiro, ganhei um Oscar antes de Olivia e se eu morresse primeiro, sem dúvida ela ficaria lívida porque eu também teria ganho dela nisso!" As irmãs nunca mais se falaram, e Joan também conseguiu morrer primeiro, em 15 de dezembro de 2013.

 


 

: Lillian Fontaine, Joan Fontaine e Olivia de Havilland

 

Na década de 80 Olivia de Havilland apareceu com certa frequência em produções feitas para a televisão, e levou um Globo de Ouro por seu papel no telefilme Anastasia: O Mistério de Anna (1986). Seu último papel também foi num telefilme, The Woman He Loved (1988).

 


 

: Olivia de Havilland com Jane Seymour & Anthony Andrews em The Woman He Loved

 

Gozando de boa saúde, a atriz faz aparições públicas regulares, e tem recebido muitas homenagens e honrarias e também é constantemente chamada para participar de homenagens ao filme …E o Vento Levou, sendo uma das últimas pessoas vivas do elenco, junto com os atores Patrick Curtis, Greg Giese e Mickey Kuhn, que interpretaram o mesmo papel no filme, justamente o de Beau Wilkes, o filho de Melanie no filme (recém nascido, com um ano e com 5 anos, respectivamente). Greg Giese, embora não creditado, também fez o papel de filha de Scarlet quando bebê, usando roupas de meninas.

 


 

: Hattie McDaniel, Olivia de Havilland e Viviven Leigh em …E o Vento Levou

 

Para conhecer toda a filmografia de Olívia de Havilland, acesse seu perfil no IMDb

 

Assista ao trailer do filme Na Cova de Serpentes, melhor papel de Olívia de Havilland no cinema:

 

Assista ao trailer do filme Na Cova de Serpentes, que Olívia de Havilland considera seu melhor papel no cinema:

Assista ao trailer do filme Tarde Demais, que deu a Olívia de Havilland o Oscar de melhor atriz:

 

Assista Olívia de Havilland ao receber o Globo de Ouro de atriz coadjuvante por Anastasia: O Mistério de Anna, em 1987:

Assista a apresentação triunfal de Olívia de Havilland durante a cerimônia da 75ª edição do Oscar, em 2003:

 

Diego Nunes, formado em Rádio e TV pela Universidade Metodista de São Paulo, é pesquisador da memória cultural e artística, e sua paixão é o cinema. Além disso, atua como diretor cultural da Pró-TV, Museu da TV Brasileira, e no departamento de arquivo da Rede Record de Televisão.

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