Agora a bagunça está efetivamente instalada!
Nada é decidido e já se vão 37 dias desde que o pedágio deixou de ser cobrado nas três praças – Santo Antônio da Patrulha, Gravataí e Eldorado do Sul – pela Concepa, período em que houve muita chuva e os buracos, que não existiam, crescem ‘a olhos vistos’ nas pistas antes bem conservadas dos 121 quilômetros de Guaíba até Osório.
Durante os 20 anos do contrato originalmente firmado as autoridades do setor de transporte dos governos do estado e da união não tiveram a mínima competência para preparar sua renovação ou a licitação nos moldes que propuseram à undécima hora, às vésperas do apagar das luzes.
Ou foram incompetentes ou mal intencionados.
Depois do contrato original vencido em 3 de julho de 2017, e prorrogado até 3 de julho passado, as ditas autoridades competentes ainda dispuseram de mais um ano para encontrar uma solução que não prejudicasse os usuários da Freeway e do trecho da BR-290-/BR-116 entre Canoas/Porto Alegre e Guaíba.
E o que foi feito nesse ano? De prático, para os usuários das rodovias, nada…
Apenas debruçaram-se sobre a elaboração de um edital que prevê outros novos pedágios e a entrega de rodovias importantes para o estado, à iniciativa privada. Importantes, sim, porque servem para o escoamento da produção gaúcha em direção ao centro do país. Mas ver isso já é pedir demais!
Há interessados
Depois da casa arrombada, nem tranca de ferro.
O governo federal, ao mesmo tempo em que negocia com o estado, impondo regras absurdas para que a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR) assuma os serviços que eram da Concepa por um período tampão, abre um edital emergencial para contratar uma empresa que faça a manutenção da Freeway.
A EGR quer assumir.
E pelo menos 20 empresas se habilitaram a fazer o serviço nos moldes do edital emergencial da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), apêndice do Ministério dos Transportes.
Mas nada é acertado. Enquanto isso os buracos crescem.
Nada certo
Agora, a Justiça Federal de Brasília concedeu liminar autorizando que a Concepa volte à administrar a rodovia, e possa cobrar de novo os mesmos valores de antes, pelo pedágio. A administração da empresa, na pessoa do diretor Thiago Vitorello, disse hoje cedo na Rádio Gaúcha que a partir do momento em que assumir, em 10 dias, no máximo 12, a rodovia volta a ser o tapete de antes.
Disse que ainda nesta sexta deveria iniciar as tratativas com a ANTT para reassumir nos próximos dias, quem sabe já na segunda-feira que vem, dia 13. Mas, pasmem: a ANTT divulgou que não tem conhecimento da liminar, disse que pode recorrer da liminar, e que não vai sentar à mesa com ninguém da Concepa já que considera as negociações com a empresa encerradas e qualquer decisão, agora, depende da Justiça.
Aliás, o Ministério dos Transportes já anunciou que vai recorrer pedindo a revogação da liminar do ministro Marcelo Albernaz, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Ou seja: tudo certo, nada resolvido.
E ao mesmo tempo em que as horas correm sem que esse imbróglio se resolva, a pista se deteriora, o lixo se acumula no acostamento, o vídeo-monitoramento não é realizado, a iluminação começa a ficar capenga, não há guinchos para socorro de veículos em pane e nem ambulâncias para atender às vítimas de acidentes.
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Erro 1:
Deixaram – as autoridades – que transcorressem os 20 anos do contrato originalmente firmado com a Concepa para administração dos 121 quilômetros de Guaíba a Osório sem que fosse preparado um novo contrato, uma nova licitação, ou encaminhada a renovação do que estava em vigência. Despreparo, má fé ou incompetência.
Erro 2:
Findado o prazo de 20 anos, o Ministério do Transportes e ANTT decidiram pela prorrogação do contrato por mais um ano – que venceu no dia 3 de julho passado – sob argumento de que seria o tempo necessário para lançar edital e definir quem ficaria com a administração das estradas. Não fizeram.
Erro 3:
No ato da renovação, ainda em 2017, o governo decidiu, por canetaço e como se houvesse um acordo de compadres, reduzir as tarifas do pedágio pela metade sem consultar órgãos técnicos como o Tribunal de Contas da União (TCU). Uma decisão açodada e sem embasamento técnico-legal.
Erro 4:
Talvez o mais grave! Ao reduzir as tarifas o governo eximiu a Concepa da realização de novos investimentos. Ou seja, a empresa continuou ganhando para fazer uma manutenção básica que, só agora se sabe, colocava uma camada de asfalto tipo ‘casca de ovo’ nas operações tapa-buracos que empreendia. Enganando bobos.
Erro 5:
Só depois de estabelecida a prorrogação do contrato recentemente vencida é que o TCU se manifestou, dizendo que a redução das tarifas deveria ter sido ainda maior considerando que alguns itens não foram observados, como maior fluxo de veículos e a dispensa de novos investimentos no trecho. O que era uma obviedade aos olhos da sociedade.
Erro 6:
Ministério dos Transportes e ANTT não se entendem quanto à definição de quem vai assumir a conservação da Freeway até que o resultado da licitação internacional seja conhecido e a próxima empresa – ou mesmo a própria Concepa – assuma a função em fevereiro do próximo ano.
Erro 7:
O governo do estado, através da EGR, se propõe a assumir a responsabilidade. Já disse que nem quer cobrar mais, pelo pedágio, do que os valores que estavam sendo praticados. E que quer ‘fazer barba, cabelo e bigode’, ou seja: monitorar e conservar a rodovia. Mas o governo federal não quer isso! Por quê?
Erro 8:
O Ministério dos Transportes negocia com a EGR para que a empresa do estado assuma apenas o monitoramento e serviços de limpeza, guinchos e ambulância, mediante valores de pedágios reduzidos. E que o serviço de manutenção da pista ficaria sob responsabilidade do Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (Dnit), órgão federal que já disse que não tem dinheiro, que depende da burocracia das licitações e que não dá conta sequer das obras sob sua responsabilidade nas demais rodovias federais que tem no Rio Grande do Sul. Inexplicável.
Erro 9:
Está em tramitação na Justiça uma série de ações, principalmente impetradas pela Concepa, tanto para continuar administrando a rodovia por mais uma década como forma de compensar perdas financeiras por investimentos realizados e que não estavam no contrato original, quanto para poder cobrar mais pelo pedágio nas três praças sob sua responsabilidade. E como tudo que depende da Justiça leva tempo…
Quer dizer: trata-se de uma novela que ensejará, ainda, muitos capítulos, já que a perspectiva de que uma empresa efetivamente assuma o controle em fevereiro do ano que vem é, mera e tão somente, uma expectativa. Dependerá da não interposição de obstáculos à vencedora pelas demais empresas participantes do certame.
Enquanto isso eu, o senhor, a senhora, todos nós que usamos esta rodovia, continuamos dependendo da sorte de não cair num dos buracos e não nos acidentarmos no trecho. Porque se isso acontecer ore a Deus, aos orixás, ou invoque seu santo de devoção.
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