Vai ter holofotes, entrevista coletiva com a cúpula da segurança e, talvez, do governo estadual. Vai ter peso de troféu nos gabinetes, mas não é de todo sem razão. No final da noite de quarta-feira, foi preso na cidade de Encarnación, no Paraguai, Luis Fernando da Silva Soares Júnior, também conhecido como Júnior Perneta, ou Museo, 38 anos, o homem apontado pela polícia como o número 1 da facção criminosa Bala na Cara. A queda do criminoso, que tem contra si sete mandados de prisão por homicídios — e mais outros tantos sob investigação como mandante — certamente não terminará com os conflitos entre facções criminosas na Região Metropolitana, mas completa um cerco a lideranças intensificado no ano passado, e que agora dá segurança à Polícia Civil para afirmar que todo o primeiro escalão das principais facções atuantes nos presídios e nas ruas estão presos.
Se cumprirão suas penas, ou perderão poder, é outra história. Talvez isso só aconteça quando o combate ao tráfico mudar de perfil, e o tema das drogas deixar de ser visto como guerra. Talvez isso só aconteça quando a execução penal for rigorosa na medida exata dos crimes cometidos pelas lideranças, e não na proporção da capacidade dos réus operarem os recursos do judiciário.
A queda do número 1 dos Bala na Cara traz à memória dez anos de uma mudança no perfil do crime na Região Metropolitana. A lógica das facções em guerra explica, por exemplo, o atentado a uma festa ao ar livre na Morada do Vale, ou a execução, depois de fazer as vítimas cavarem suas próprias covas, em Gravataí no ano passado. A partir do Paraguai, onde estava foragido, provavelmente, desde 2015, quando teve a sua saída da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) autorizada por uma trapalhada burocrática, Júnior Perneta era um jogador de outro nível. Tinha o controle na mão graças aos contatos com fornecedores de drogas e armas. E, como confirmam investigações do Departamento de Homicídios de Porto Alegre, seguia autorizando mortes na Capital e região.
Os Bala na Cara mudaram o perfil do crime dentro e fora das cadeias. Eram, mais de dez anos atrás, jovens criados no Bairro Bom Jesus, na Zona Leste de Porto Alegre, que tinham como principal característica — muito pela personalidade do próprio Júnior — a ousadia em assaltos e confrontos com a polícia. Viraram o braço mais arrojado da facção dos Manos, antes de ganharem força também atrás das grades e reivindicarem seu espaço no lucrativo mercado da droga, e das mortes. E aí se tornaram o grupo mais violento da região.
Foi a partir dessa ofensiva que outros bandos reagiram e, há pelo menos três anos, explodiram os assassinatos. Em Gravataí, a guerra mostrou sua pior face em 2017.
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Depois de presas outras lideranças — aliadas e rivais do Júnior Perneta — em ações conjuntas da polícia gaúcha com os paraguaios, naturalmente todo o foco voltou-se para ele. Desde o começo do ano, o seu nome passou a figurar entre os procurados da Interpol. Duas semanas atrás, agentes da Delegacia de Capturas, do Deic, estiveram no Paraguai para cumprirem mandados de busca. Não o encontraram, mas amadureceram as pistas que tinham.
Descobriram a identidade falsa que o cabeça do crime vinha utilizando, o carro que provavelmente guiasse e as ruas por onde deveria circular. O plano era voltar ao país vizinho, aí sim, para uma ofensiva definitiva, na próxima semana. Mas foi uma abordagem dos paraguaios que encerrou, ou pelo menos interrompeu, a carreira de Luis Fernando Júnior no país vizinho. Ele agora será trazido para o Brasil e provavelmente ficará em uma penitenciária federal, onde todo o primeiro escalão dos Bala na Cara e dos principais rivais já estão.
Haverá clima de missão cumprida — e foi mesmo — entre os agentes da segurança, e de bandeira da segurança pública mais do que erguida como carro-chefe do governador José Ivo Sartori (PMDB). Uma pena saber que os investigadores já estão empenhados em saber quem, daqui alguns meses, estará dando as cartas no lugar do Júnior Perneta, e fabricando ainda mais mortes nas ruas da Região Metropolitana.