A relativização que mais ouço sobre o vulgar episódio em que Silvio Santos assedia Claudia Leitte ao vivo é que “ele sempre fez isso”.
Verdade.
No Brasil de “Deus Acima de Todos”, que está mais para o “Deus morreu, tudo pode” – citação apócrifa creditada a Nietzsche, que aparece nas palavras do perturbado irmão Ivan Karamázov, de Dostoiévski – tudo se desculpa e qualquer reivindicação de uma evolução civilizatória na relação entre homens e mulheres é vista como mimimi, esquerdopatia ou coisa de feminazi.
Inegável é que o discurso dos poderosos torna-se uma senha, carne fresca para os zumbis do preconceito arrombarem armários. Se o Silvio pode, ou o político mitificado e seu clã autorizam, por que o deseducado, o intolerante, o bully, o misógino, o racista não o fariam?
Qual a diferença entre o famoso apresentador insinuar que fica de pau duro ao abraçar a bela cantora e a postura do covarde que mexe com a menina na rua, ou no ônibus encoxa a irmã, a filha ou mesmo a mãe de você que está lendo? Ou é aceitável, por corriqueiro, o político seduzir a estagiária, ou o professor querer comer a aluna adolescente?
A criação machista não é justificativa para restar um ser humano obscuro e terraplanificado. Talquei?
Mas o objetivo desse artigo não é ocupar lugar de fala das mulheres. Quero alertar para os danos que essa guerra ideológica, e a ditadura do politicamente incorreto, causam no seu bolso. Sim, a economia sofre em sociedades polarizadas! Um país que considera uma vitória arraigar preconceitos, viver num ambiente sem paz social, desestimula os convívios e a alegria. E, consequentemente, a força de trabalho e os empreendedores.
Não sou eu, ou um petralha, quem constata. É Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central na gestão de Fernando Henrique Cardoso e, brasileiro naturalizado norte-americano, um dos economistas mais influentes do país. Um liberal, não um marxista ou gramsciano.
— Hoje, eu diria que uma resposta adequada para os desafios econômicos e sociais do Brasil, que são agudos por causa dessa monumental recessão que está agora se dissipando, envolve questões mais completas. As pessoas precisam de um bom sistema econômico, e esse sistema econômico vive grudado umbilicalmente ao sistema político e à sociedade. Ele precisa dar respostas a vários temas. Mesmo quando falamos de economia, precisamos incluir hoje, aqui no Brasil, temas como Estado de Direito, respeito às minorias, fim da desigualdade, combate à violência, com uma postura de paz em relação à violência. Se não tocarmos nesses grandes temas, estamos deixando algo muito importante de fora — falou em entrevista à Folha de S. Paulo.
Aquele que é um dos queridinhos do ‘mercado’ segue:
— Esses fatores não apenas influenciam a vida das pessoas e como elas se sentem. São fatores que têm grande peso nas decisões econômicas tanto de curto quanto de longo prazo. De curto prazo, afetam decisões diárias de trabalhadores e de empresas. De longo prazo, definem investimentos públicos e privados.
E conclui dizendo esperar que o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), tenha sensibilidade para perceber o quadro político e social complexo que herdará:
— Há um receio, bastante difundido, sobre o que pode acontecer nessas áreas em função de declarações e posições históricas do presidente eleito. Isso é algo que só ele pode resolver.
Agora eu pergunto: custa ter empatia, se colocar no lugar dos outros e aprender a exercer a civilidade? Sermos mimados com um “é o que eu acho, azar!” certamente vai pesar em nosso bolso. É a ideologia da burrice, que independe de direita ou esquerda.
Você não precisa ser mais um velho babão como o Silvio. Afinal, com crise ou sem crise, a quase ninguém resta a opção “Brasil: ame-o ou deixe-o”, com embarque marcado para Miami.