Secretário da Fazenda de Gravataí por quase uma década, Davi Servergnini é avesso a fake news. Mesmo que, em comparação com o Rio Grande do Sul e o Brasil, vivamos em uma ‘ilha’ de equilíbrio fiscal e, consequentemente, investimentos, é conservador e temente à ‘ideologia dos números’ ao fazer projeções de crescimento nos orçamentos anuais; que invariavelmente acerta – e, não por acaso, são sempre abaixo da superestimação feita pelas equipes econômicas do governo federal, de Dilma, a Bolsonaro, passando por Temer.
Procurei-o, mas hoje nem Davi consegue ainda medir os efeitos da guerra Rússia-Ucrânia em Gravataí.
Faço eu um exercício simples, ‘extraoficial’, então, com alguns dados oficiais.
O primeiro impacto é na GM, o que reportei pela última vez em Como preocupação da China com nova onda da covid afeta a GM de Gravataí; Fábrica segue em ’férias coletivas’. A tempestade – quase – perfeita soma a política de ‘covid zero’ da China, que decretou novos lockdows em províncias produtoras de componentes eletrônicos necessários à indústria automobilística, à interrupção da produção também em fábricas ucranianas que também pararam a Toyota no Japão e a VW, na Alemanha.
Em uma média, o complexo automotivo que tem 5 mil funcionários, incluindo as 18 empresas sistemistas, ficou completamente parado por 10 meses entre 2020 e 2022. As ‘férias coletivas’ que começaram em 21 de fevereiro terminam na próxima segunda-feira. São cinco reais perdidos por minuto; R$ 5 milhões a cada mês.
No total da pandemia, são perdas de pelo menos R$ 50 milhões em impostos que retornariam em 2022 aos cofres da Prefeitura.
Essa redução na produção corresponde a 40% dos R$ 200 milhões recebidos de todos os impostos recolhidos pelo município.
Há, ainda, as dificuldades de circulação de produtos de passagem pelo Oriente, principalmente pelo mar. Olhando a balança de exportação de 2021, se não há relação comercial significativa com a Rússia, Gravataí vendeu US$ 10,4 milhões para China e US$ 6,22 milhões para Índia, para ficar entre os maiores atores daquela região. Em reais são cerca de 100 milhões.
Com a produção parada, restrições ao transporte e embargos, a cadeia de insumos para a agricultura já é penalizada, como nos fertilizantes ucranianos e russos, por exemplo. Não atinge diretamente Gravataí, cuja produção rural é zero depois da vírgula no PIB, mas colabora com as perdas já prevista com a estiagem – uma conta a ser dividida com todos os municípios com a queda de arrecadação estadual.
Com o perdão de usar a expressão ‘ganho’ com a guerra, Gravataí pode ter uma compensação das perdas no aumento da receita com royalties. Os R$ 12 milhões projetados podem crescer, já que variam conforme consumo e preço.
Com a sanções econômicas à Rússia, e sem comprar dela petróleo, países do Ocidente estão aumentando suas quotas de produção, além da escassez momentânea do combustível forçar o aumento de preços.
Nem é preciso falar sobre os efeitos negativos no bolso dos gravataienses, com a alta do preço nos combustíveis e, consequentemente, na conta do supermercado.
Ao fim, é o obvio ululante. Sem mocinhos, só com vilões, midiáticos ou ocultos, protegendo seus interesses (justos e injustos), a guerra tem efeitos negativos em Gravataí; e principalmente nos mais pobres.
Reputo é possível entender a natureza de um crime; mas um crime continuará sendo um crime. Pagam hoje civis ucranianos, assim como desde 2014 já pagaram mais de 14 mil pessoas de etnia russa alvo dos neonazis no Donbass.
Fato é que, entre tantos especialistas em geopolítica, das tvs ao Grande Tribunal das Redes Sociais, parece ter ficado feio ser tipo miss, “a favor da paz mundial”.
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