Cheguei ao centro de Porto Alegre. Desço no terminal de ônibus em frente ao Mercado Público e vou pelo Largo Glênio Peres. Caminho entre caixotes com frutas, legumes e verduras e percebo que aumentou o número de ambulantes. Reflexo destes tempos.
O homem do gato não estava lá. Nunca gostei de sua encenação travando uma luta com um felino imaginário preso em um saco de ração, sendo provocado por uma taquara. Há quem goste. Desvio das pombas. Eram muitas atrás de migalhas de comida. Não se assustam com a presença de humanos. Pouco se importam com a moça ofertando três caixas de moranguinho por dez reais. Tampouco com o homem com um violão cantando as letras de grandes canções interpretadas por Raul Seixas. Ouvi o refrão de Metamorfose Ambulante “eu prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”.
Ao lado do cantor, na farmácia, um jovem, mesmo usando microfone, grita incessantemente sobre a promoção de cápsulas de cálcio e os seus benefícios, em especial para as mulheres, para prevenir a tensão pré-menstrual (nunca tinha ouvido falar nisso!). Mais alguns passos outro sujeito está ao microfone oferecendo preço especial na aquisição de um ferro elétrico.
Ouvi os sons que ecoavam das buzinas e o arrulhar das pombas. Olhei para a fisionomia dos transeuntes. Apressados, alguns pareciam fugir. Não sei se do Largo ou de seus próprios mundos; outros se esquivam dos vendedores. Segui em frente. Mais adiante, já sob o viaduto Otávio Rocha, mais conhecido como “Viaduto da Borges”, o cheiro de homens e mulheres, seus trapos e farrapos mostram o que muitos não querem ver. Há quem lance olhares de piedade; outros, de medo. Há também quem resmungue sobre a sujeira e o bafo do lugar. Entre colchões, cobertores e cacarecos, os lojistas abrem suas portas. Lojas de artesanatos, discos e de alimentação esperam por clientes.
A paisagem humana e suas diferentes manifestações criam e recriam todos os dias a cidade. A vida pulsa. Vida expulsa, há quem queira. Expulsar resolve?