histórias do fidel

Pai paraquedista, agente funerário e turista

 

Meu pai paraquedista

 

Esta aconteceu lá na praia de Imbé quando eu era adolescente.

Havíamos acabado de almoçar, a mãe se acomodou em uma rede com um livro e, como de costume, minha irmã, as primas que estavam passando uns dias conosco e eu fomos direto à cozinha, para lavar a louça.

Logo depois, bateram na porta dos fundos, abrimos, o pai entrou e passou para seu quarto, dizendo que ia "tirar uma soneca".

Quando estávamos acabando nosso trabalho e planejando o que faríamos pela tarde, bateram de novo. Abri e dei de cara com o pai. Só de cueca, ele friccionava o antebraço direito, como se tivesse alguma dor.

Perguntei: "Ué, pai, tu não estavas dormindo no teu quarto?" E ele: "Estava sim, mas, de repente, sonhei que estava viajando e que o avião incendiou. Então, me joguei de paraquedas pela janela."

Menos mal que a casa era térrea, não é?

 

 

Meu pai agente funerário  

 

Um dia o pai chegou em casa, morrendo de rir, e, enquanto preparava um vermute para ele e capilé (vinho tinto com água e açúcar) para nós, depois de ter picado em cubinhos um naco de queijo parmesão para o aperitivo, veio com esta história, que não posso jurar que seja 100% verdadeira, porque ele costumava dar uma enfeitada na conversa.

Pois bem, o que ele contou foi que, ao chegar, naquela manhã, em um loteamento de Cachoeirinha, cujos lotes estava vendendo, deu de cara com o corpo de um burro esticado no meio da rua. Alguns moradores lhe disseram que o animal havia morrido, por ali, no dia anterior, mas que, avisada a respeito, a Prefeitura nada fizera.

O pai correu, então, à Secretaria correspondente, para pedir providências, mas, depois do almoço, voltou ao local, e tudo seguia igual. Foi, então, ao gabinete do prefeito, que lhe garantiu que o problema seria resolvido de imediato. Mas, uma hora mais tarde, o burro jazia no mesmo lugar e já estava pra lá de malcheiroso.   

Nessa hora, ele tomou uma decisão.  Pediu aos moradores que estivessem, ali, para seu enterro, às 6 da tarde. E, na hora marcada, chegou com flores, velas e o repórter do jornal local, que se encarregou da cobertura, que, segundo comentou depois, deu assunto para alguns dias na cidade.

 

 

Meu pai turista

 

Meu pai não se conformou quando lhe mostrei as fotos da Praça de São Marcos, de Veneza, na volta de uma viagem que fiz sozinha, décadas atrás. Perguntou onde estavam as pombas, e respondi que havia chegado antes.

Ocorre que estive na Praça às 4 da madrugada, na minha primeira noite na cidade, pois estava tão emocionada por estar lá que não tinha conseguido dormir. Anos depois, fomos juntos a Veneza, e ele me pediu que espalhasse milho de pipoca sobre seus braços abertos e posou para as fotos coberto de pombas, como um espantalho. E, muito sério, explicou-me: “Estás vendo? Era assim que tinhas de ter feito!”.

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