Curti o depoimento do diretor médico da Santa Casa Fernando Issa, há pouco na Câmara, em sessão na qual não compareceu o anunciado secretário da Saúde Régis Fonseca. O médico foi honesto ao reconhecer erros. Sem meias verdades, aquelas que sempre tem um lado mais próximo da mentira.
Ouviu o ‘pau geral’ no Dom João Becker – cometido por vereadores de oposição e governo; críticas e ações que reputo desnecessárias como falas de que, “ao lado da Sogil o hospital é o câncer de Gravataí”, e até vereador que em protesto saiu do plenário e virou às costas à sessão – mas não dourou a pílula.
O médico, que está na cidade desde dezembro de 2020 e cuja formação e vida profissional é toda ligada à Santa Casa, admitiu problemas no atendimento e principalmente na emergência.
– A nova emergência é nossa obsessão – disse, confirmando o anúncio da obra para esta quarta-feira, o que o prefeito Luiz Zaffalon tratava com sigilo, mas quem me segue no Twitter soube com exclusividade nesta tarde.
– Em 67 anos só um prédio foi construído. Gravataí cresceu com a GM e outras empresas, recebe pacientes de mais de 150 municípios, tem 300 mil habitantes e o hospital é o mesmo – constatou.
Acrescento eu: com apenas 188 leitos e 30 UTIs.
Simbólico diálogo que o médico confidenciou, em seu primeiro dia no Becker, vindo da UTI do hospital Santa Rita.
– O que houve que está este caos? – perguntou.
– Hoje até está bom – respondeu colega médico com mais tempo na aldeia.
Conforme Issa, os projetos para a nova emergência e a ampliação da UTI clínica estão prontos desde 2019, mas a execução foi atrasada devido à pandemia. A obra será feita onde hoje fica o Hospital de Campanha (HC), que será fechado nesta sexta-feira.
– Em uma semana depois de reunimos para desmobilizar o HC os números explodiram e chegamos ao pior momento da pandemia em março. Aumentamos as 32 UTIs para 99 e a Prefeitura garantiu mais 15 leitos da Prefeitura no PAM. Chegamos a ter 140 pacientes. No HC, um espaço para 10 recebeu 60 HC pessoas, todos em respiradores. Com medo de uma tragédia, um incêndio, fechamos um bloco cirúrgico em Porto Alegre para acomodar pacientes de Gravataí. Mas foi uma ação emergencial porque não poderíamos virar às costas na maior pandemia dos últimos 100 anos – lembrou, explicando que não basta entrar no SUS da Santa Casa para garantir nos hospitais da rede atendimento em alta complexidade:
– As pessoas perguntam: “mas se já estou na Santa Casa em Gravataí, porque não faço a cirurgia na Santa Casa em Porto Alegre”? Acontece que as transferências são geridas pelo Governo do Estado e concorrer hospitais de todo RS. O Becker não é credenciado como um hospital de alta complexidade.
O médico também confirmou aos vereadores estudos permanentes para abertura de UTI Neonatal – “complexo, porque o Estado considera ter leitos suficientes na região” e de uma unidade transfusional de sangue.
O diretor médico disse que a meta da Santa Casa é “fazer os gravataienses confiarem no Becker”.
– Nosso primeiro sinal visível para a comunidade é a nova emergência – disse, listando também “ações invisíveis”, como as novas equipes de intensivistas, obstetrícia, cardiologia e ortopedia, além da abertura de residência médica, convênio com a Unisinos coordenado por professores com doutorado.
– Sabemos da expectativa de Gravataí com a vinda da Santa Casa. Agora começa parte boa – previu, garantindo:
– A nova emergência será como a do Nora Teixeira, hospital padrão da Santa Casa. Vai ficar melhor que a dos convênios.
Dados apresentados mostram que, entre julho de 2020 e julho de 2021 o Becker realizou 546.541 mil exames, 6.435 cirurgias, 13.574 consultas eletivas, 55.380 consultas de urgência e 10.100 internações.
Confrontado com o repasse de quase R$ 150 milhões para Santa Casa desde que chegou a Gravataí, Fernando Issa prometeu apresentar os balanços, mas assegurou:
– Gastamos mais do que recebemos. Há desequilíbrio financeiro que a Santa Casa absorve.
Ao fim, Alan Vieira (MDB), o presidente da Câmara, ao agradecer o depoente, resumiu o que parece o pensamento dos vereadores:
– A população só quer dizer: a Santa Casa chegou.
É isso.
A Santa Casa é uma ‘grife’ e a cobrança é proporcional, da mesma forma que a fiscalização dos vereadores tem o tamanho que necessita um contrato de R$ 50 milhões por ano, o maior de Gravataí.
Mas o Becker não é diferente de outros hospitais SUS em um Brasil onde nos últimos quatro anos foram fechados mais de 30 mil leitos e 3 milhões de pessoas pararam de pagar planos de saúde.
A realidade se impõe.
Ruim com Santa Casa, pior sem ela. Como tratei ainda em 2019 em Nos números, Santa Casa melhorou hospital de Gravataí; estatísticas e o que vem por aí, "inegável é que pelo menos a Santa Casa tem portas abertas para o SUS. Outro grupo que queria comprar o Becker só atenderia particular e convênio. Um ‘Moinhos de Ventos’ é bom, mas só para quem pode pagar".
Torçamos pelo cumprimento das promessas e fiscalizemos.
Assista a sessão na íntegra
LEIA TAMBÉM
Deus é gravataiense: mais 6 milhões para o Becker; O saber gastar de Zaffa