Que as manifestações de 7 de setembro sirvam para que os brasileiros tomem consciência de que não serão as armas que lhes devolverão a convivência hoje ameaçada por aqueles que deveriam trabalhar para que brotem as flores de uma nova concórdia. O Seguinte: reproduz o artigo de Juan Arias, publicado pelo El País
Quase às vésperas da manifestação a favor de Bolsonaro marcada para o dia do 199º aniversário da Independência, que a grande maioria dos brasileiros acredita que será pacífica, o presidente fez um elogio às armas e zombou das flores. Com sua já típica linguagem grosseira, ao parabenizar o boxeador Hebert Conceição, medalhista olímpico em Tóquio, em uma cerimônia militar, o presidente falou-lhe de guerra e de armas. E zombou das flores: “Enfia a porrada, guerreiro, é isso aí. Com flores não se ganha a guerra, não, pessoal”. E acrescentou que quando se fala em armas, “se você quer paz, tem que se preparar para a guerra”, um clássico adágio romano que alguém deve lhe ter soprado ao ouvido, já que a história e a literatura antiga não parecem ser o forte do capitão que, aparentemente, nunca leu um livro inteiro.
Que o clamor pela guerra, pelos conflitos, pela violência e pelo autoritarismo faça parte da alma de Bolsonaro, já o sabíamos. Assim como seu amor pelas armas, a ponto de considerar preferível passar fome a ficar desprovido de fuzil. O que não sabíamos é seu desprezo pelas flores. É verdade que ninguém jamais viu o capitão reformado ou qualquer um de seus filhos com uma flor na mão. Apenas com armas. Ele deve ter medo das flores, talvez porque elas, ao longo da história do mundo, em todas as mitologias, na literatura, nos símbolos, sempre falam de paz, de paixão, de amor, de perdão e de gosto pela vida e pela amizade.
Bolsonaro tem razão em odiar as flores, pois é verdade que elas são o antídoto para o que ele ama e sonha, como a luta, a guerra, o confronto, o ódio, o desprezo pela vida e a ausência de compaixão pela dor alheia.
Alguém deveria lembrar ao presidente que despreza as flores que elas são o símbolo de tudo o que o ser humano mais busca, como a vida, o afeto, o prazer, a beleza, a amizade e até a religião. Basta lembrar que os livros sagrados de todas as religiões, a começar pela Bíblia, estão impregnados de elogios às flores como algo libertador.
As flores estão ausentes apenas nos páramos da violência, embora até nas guerras, nas tumbas dos caídos, aqueles que amam a paz depositem buquês de flores. Ainda não vi um batismo, um casamento, um aniversário ou um funeral onde os que querem comemorar a vida se presenteiem com fuzis ou pistolas. Os momentos de maior paixão estão prenhes de flores.
Eu teria um calafrio se alguém me desse um fuzil no meu aniversário. No entanto, nunca tenho medo de quem chega à porta da minha casa com uma flor na mão. Não é verdade que as guerras, os conflitos, pessoais ou nacionais, só se ganham com armas e mortos, com violência. A diplomacia, o diálogo, os acordos, a busca de pontos de convergência não necessitam de canhões para evitar uma guerra.
O Brasil vive um momento crucial em que aqueles que deveriam cultivar campos de flores, símbolos de encontros festivos, recuperação de seus melhores valores, recebem ameaças de conflitos e guerras que, como sempre na história, levam à miséria e envenenam a convivência.
Oxalá as manifestações de 7 de setembro sirvam para que os brasileiros tomem consciência de que não serão as armas que lhes devolverão a convivência hoje ameaçada por aqueles que deveriam trabalhar e se esforçar para que brotem as flores de uma nova concórdia. Em um país onde seus governantes estão destruindo a natureza e suas riquezas naturais e os nativos das florestas são tratados como escravos, não é de estranhar que quem representa a nação zombe das flores e enalteça a força das armas.
Triste para o Brasil que continua apostando na paz e na concórdia, embora, felizmente, ainda seja a grande maioria.