Está história não me recordo muito bem em que época aconteceu. Só sei que estava perambulando pela noite de Porto Alegre, quando me deparei com o inferninho mais boca braba que até aquele momento havia frequentado. Ficava na Comendador Coruja. Entrei, sentei e já gritei:
– Uma ceva bem gelada para mim e uísque de chá para minha acompanhante!.
Eu sabia que as gurias dos inferninhos tomavam chá em vez de uísque, já que, se tomassem uísque, não se aguentariam acordadas a noite inteira.
Aquela noite a casa estava lotada e eu ali bebericando minha cerveja. A música nestes lugares era sempre a chamada dor de cotovelo. Estava tudo muito bom, tudo muito legal, até que, de repente, as luzes se acenderam e a casa ficou tomada de policiais.
Um deles gritou:
– Vadios para direita e vadias para a esquerda!
Eu, numa manguaça daquelas, fiquei sentado na mesa. A dona do inferninho me fazia sinais para levantar e ir para o lado dos vadios; e eu nem aí. Foi então que um policial falou para mim:
– Tu tá surdo? Não ouviu a ordem?
Calmamente respondi que tinha ouvido, mas como não me enquadrava em nenhuma daquelas opções, resolvi ficar no meu lugar. Ao que, então, ele resdpondeu:
– Não complica magrão. Te manda para o lado dos vadios!
O policial gritou novamente, aí para todos os frequentadores:
– Quem tiver carteira de trabalho que mostre para o policial e será liberado!
Foi então que me dei conta que havia esquecido a CTPS em meu quarto. Pensei: “estou frito!”.
Começou a revista e eu suando frio, afinal, depois de ter dado uma de trabalhador, não tinha como provar.
Quando faltava só um à minha frente, o policial gritou aos colegas:
– Suspendendo a revista. A viatura lotou!
Ufa! Respirei aliviado. Escapei por um triz. Se não fosse o último da fila, teria ido tomar um chá de banco na delegacia.
Depois daquela vez procurei não mais esquecer minha CTPS em casa, pois naquela época o único documento válido era a carteira de trabalho assinada. Caso contrário, você tinha que assinar um TC, um termo circunstanciado, se comprometendo a arrumar um emprego em 30 dias. Se não conseguisse, poderia ser autuado por vadiagem.
Os tempos eram outros, o emprego era pleno e só não trabalhava quem não queria. Imagine naquela época alguém num inferninho às duas da madrugada, em plena quarta-feira: quase sempre, trabalhador não era. Se esta regra fosse válida para os dias atuais, aonde o sistema ia colocar 10.000.000 de “vadios”?
Agora, desempregados mesmo.