Foi preciso voto de minerva para Câmara aprovar mais uma viagem. E, desta vez, é sem diárias, mas pagando passagens. Algumas linhas sobre a polêmica da já apelidada 'meia viagem'
As viagens de vereadores foram um tabu na Câmara durante toda a legislatura.
As altas temporadas por Brasília, Salvador, Maceió, Natal e Florianópolis eram defendidas como direito sagrado dos parlamentares.
Os congressos – com seus nomes compridos e retorno impalpável à municipalidade – surgiam como necessários e nobres instrumentos de formação dos políticos.
As estadias, nunca abaixo de cinco dias, e intermináveis noites, eram sempre justificadas pela busca de recursos por Ministérios ou emendas parlamentares que raramente pingavam nas contas da Prefeitura, do Hospital ou de onde quer que seja.
Na blindagem corporativa das viagens, parlamentares assumiam, na tribuna e, muito mais, fora dela, o papel de verdadeiros sindicalistas da classe.
O espírito de corpo também servia para ameaçar vereadores que iam às redes sociais manifestar sua contrariedade às viagens.
Muitos foram durante os três anos e pouco de mandato avisados de que “expor o Parlamento” poderia trazer como consequência um processo na Comissão de Ética e até a cassação do mandato.
Bullyings à parte, a ‘casa de amigos’ toleraria o voto contrário, desde que silencioso.
O estouro veio às vésperas da eleição, com reportagens do Grupo RBS, de repercussão estadual e nacional, que surpreenderam até familiares dos políticos.
A Câmara de Gravataí, com 21 vereadores, gastara mais em viagens do que a Câmara de São Paulo, com 55.
Quase UM MILHÃO DE REAIS em diárias, inscrições e passagens aéreas.
Poucos dias depois, as urnas deram o aviso prévio. A ‘bancada das diárias’ perdeu mais de 8 mil votos e campeões de viagens não conseguiram a reeleição.
Enquanto apenas um viajante aumentou a votação, os cinco vereadores que sempre votaram contra e nunca viajaram foram reeleitos entre os mais votados.
Logo após a apuração, nas conversas de comitê e na troca de mensagens pelo WhatsApp, vereadores que votaram favoráveis a viagens durante a legislatura, já avisavam que mudariam de posição.
Iriam ouvir o clamor das ruas, por humildade, respeito aos eleitores ou, que seja, por sobrevivência.
Já na primeira sessão da Câmara após a eleição, o ibope das viagens foi a teste, com um requerimento para congresso em Santa Catarina.
Os autores: dois vereadores NÃO REELEITOS!
A viagem – ou deboche, como preferir – foi rejeitada.
Aos cinco vereadores que sempre votaram contra, se somaram outros seis, além de duas abstenções e uma ausência.
Na sessão desta terça-feira, uma nova polêmica envolveu o CâmaraTur e o transponder confirmou novos tempos no legislativo.
A prática está mostrando que, se a farra não acabar, é bem possível que encolha a milhagem.
O vereador Beto Pereira (PSDB), que não concorreu à reeleição, apresentou requerimento solicitando autorização para participar da Marcha dos Prefeitos em Brasília, de 22 a 25 de novembro, “abrindo mão das diárias”.
Mesmo assim, a nova bateria antiaérea de vereadores não aceitou aprovar a viagem por ela ter custos aos cofres públicos.
Afinal, não haveria o pagamento das diárias, mas das passagens aéreas sim.
A autorização para um constrangido Beto viajar só se deu com o voto de minerva, de desempate, de um irritado presidente Nadir Rocha (PMDB).
– Estão fazendo politicagem com um direito do vereador!
Não há dúvidas de que o tema vai provocar intensa turbulência na próxima legislatura.
Hoje, com a amizade extremamente cansada, os anfitriões esperam os últimos convidados irem embora.
O voto dos vereadores
A FAVOR DA VIAGEM:
– Nadir Rocha (PMDB)
– Evandro Soares (DEM)
– Juarez Souza (PMDB)
– Roberto Andrade (PP)
– Tanrac Saldanha (PRB)
– Carlito Nicolait (PSB)
– Beto Pereira (PSDB)
– Fred Pinho (PSDB)
– Gerson Rovisco (PV)
– Márcio Souza (PV)
– Maribel Wagner (REDE)
CONTRA A VIAGEM
– Alex Peixe (PDT)
– Alan Vieira (PMDB)
– Alex Tavares (PMDB)
– Clebes Mendes (PMDB)
– Paulinho da Farmácia (PMDB)
– Carlos Fonseca (PSB)
– Paulo Silveira (PSB)
– Alemão da KIpão (PSD)
– Dilamar Soares (PSD)
– Dimas Costa (PSD)
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