RAFAEL MARTINELLI

Prefeito de Cachoeirinha protocola impeachment contra presidente da Câmara e registra BO por agressão; entenda as denúncias

Cristian e Delegado, no Hotel Alano, mostram a documentação original do pedido de impeachment de Jussara

Em seu CPF, o prefeito Cristian Wasem (MDB) ingressou nesta segunda-feira com um pedido de impeachment contra a presidente da Câmara, Jussara Caçapava (Avante).

Em meio ao protocolo formal na sede do Legislativo, Cristian afirma ter sido atingido por uma garrafa de água arremessada por Ildo Jr., ex-secretário municipal e filho do falecido vereador Ildo Caçapava — marido de Jussara.

O prefeito registrou ocorrência policial por agressão, a Brigada Militar foi acionada e sua equipe denuncia que um celular usado para registro da confusão teria sido tomado por adversários políticos.

Cristian e o vice-prefeito Delegado João Paulo Martins (PP) são alvos de dois processos de impeachment em andamento na própria Câmara. Caso percam o mandato ainda em 2025, Jussara — alvo do pedido apresentado nesta segunda — assumiria a Prefeitura.

“Entreguei meu celular com senha, outros vão destruir os seus”

A manhã começou com um pronunciamento no Hotel Alano, onde Cristian e João Paulo — com escolta da Brigada Militar — apresentaram denúncias, fizeram um balanço dos três anos de governo e relacionaram os processos de cassação que enfrentam a um “golpe político”.

O prefeito afirmou que sua gestão “limpou o nome de Cachoeirinha financeira, administrativa e politicamente” desde 2021, período em que assumiu interinamente após o afastamento do ex-prefeito Miki Breier pelo TRF4.

– Fechamos as portas para a corrupção e incomodamos muita gente – disse.

O prefeito descreveu os processos de cassação como um “golpe político”, atribuindo autoria ao grupo que chama de “Família Caçapava”, e afirmou que já existiam tentativas de assumir a Prefeitura “nos bastidores” desde a crise que derrubou Miki Breier.

– Apresento o pedido de cassação como cidadão – afirmou, apelando por “uma reflexão” dos vereadores e dizendo entender lógico que, assim como aconteceu em relação a ele e o vice, seja instaurada investigação sobre a presidente do legislativo.

– É papel fiscalizar. Principalmente quando acontece dentro da própria casa, debaixo do nariz – disse, lembrando não ser réu em nenhuma das investigações já feitas contra ele, como compra de telas interativas, alvo de operação da Polícia Federal, e de cestas básicas.

– Não tenho apontamentos criminais. No episódio das cestas, fui traído. Ali fizemos uma limpa. Incomodou – disse.

– Entreguei meu celular com senha nas duas investigações que enfrentei. Talvez hoje alguns destruam seus celulares – acrescentou.

Ele citou o conjunto de irregularidades que, segundo ele, justificam o impeachment da presidente da Câmara — com destaque para problemas em licitações, contratações emergenciais, suposta manipulação de processos e ausência de transparência.

Ao mencionar a reforma do prédio do Legislativo, destacou: “Uma escada custou R$ 145 mil, o valor de um apartamento”.

Cristian ainda questionou a capacidade administrativa da Mesa Diretora sob a presidência de Jussara: “O Orçamento da Câmara é de R$ 26 milhões. Como será ao administrar o Orçamento da Prefeitura, de mais de R$ 600 milhões, mais um financiamento de 78 milhões de dólares (R$ 420 milhões na cotação do dia) com um banco chinês?”.

Ao reforçar que pretende levar o caso ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas do Estado e ao DEIC, o prefeito concluiu: “Não seremos feitos reféns. A política não vai sequestrar a gestão. Não entro em negociata. Posso até ser cassado, mas vou sair da Prefeitura como entrei: de cabeça erguida e mãos dadas com minha mulher (Fabi Medeiros)”.

Ele voltou a enquadrar o conflito como uma “batalha espiritual: “O Senhor dos Exércitos está conosco”.

“Assino embaixo”, diz vice-prefeito

Durante o pronunciamento, o vice João Paulo Martins também subiu o tom contra os processos de impeachment que enfrenta.

– Assino embaixo – disse ao endossar as denúncias apresentadas por Cristian.

O delegado de polícia aposentado afirmou que existem “62 procedimentos de dispensa de licitação e somente 47 lançados no Portal Transparência” relativos à gestão da Câmara, classificando os métodos identificados como “assustadores”.

– Parecia a certeza de que não daria em nada – pontuou Cristian.

Sobre o Impeachment 1.0, do qual já foi inocentado, afirmou: “No primeiro processo fui denunciado sem estar como prefeito em nenhuma das ações que embasavam o pedido de impeachment”.

E, em relação ao Impeachment 2.0, cujo parecer da comissão processante aprovou o prosseguimento contra ele e Cristian, declarou: “Aí veio o segundo processo, onde foram procurar alguma coisa nos únicos 12 dias em que assumi a Prefeitura, quando o prefeito estava na China buscando financiamento. Não fiz nada de errado”.

– Fomos inocentados na AIJE – acrescentou Cristian, sobre a Investigação Judicial Eleitoral que tinha como pilares as principais denúncias do Impeachment 1.0.

– Então, veio o Impeachment 2.0. É um golpe – concluiu.

7 contratos da Câmara são alvo do pedido de impeachment

A denúncia entregue por Cristian, com mais de 30 páginas, apresenta um conjunto vasto de supostas irregularidades atribuídas à presidente da Câmara.

O documento cita violações à Lei 14.133/21, indícios de direcionamento de contratos, dispensas ilegais, conflitos de interesse, empresas sem habilitação técnica, processos ocultos ou incompletos, pagamentos sem comprovação, além de falta de publicidade e de documentos obrigatórios.

Entre os pontos expostos no pedido:

1. Dispensa 1/2025: empresa sem registro técnico, falta de documentos e laudo entregue antes da abertura do processo

O prefeito sustenta que a contratação de empresa para um laudo estrutural apresenta falhas graves, como: ausência de orçamentos obrigatórios nos autos, empresa contratada sem registro no CREA/CAU, laudo com data anterior ao início formal da licitação, empenho emitido antes da homologação e vínculos pessoais entre responsáveis pelas empresas convidadas, sugerindo orçamentos coordenados.

2. Dispensa 5/2025: obra elétrica de R$ 634 mil com empresa de telecomunicações e orçamentos ocultos

A denúncia afirma que o processo foi conduzido sem projeto básico, sem planilha de custos e com cronograma invertido — o contrato teria sido assinado antes da homologação.

Também aponta que o engenheiro responsável assinava por duas empresas concorrentes, a empresa teria estrutura física incompatível com a obra, não houve justificativa para o preço e orçamentos não foram divulgados, impedindo controle público.

3. Dispensa 17/2025: reforma de R$ 842 mil com empresa recém-criada e aditivo que elevou o total para mais de R$ 1 milhão

O documento afirma que a contratação de empresa com apenas seis meses de existência e capital de R$ 10 mil foi “fabricada” como emergencial, apesar do longo intervalo entre o laudo e a assinatura do contrato.

O ponto mais grave destacado é o conflito de interesses: o mesmo engenheiro que atestou a emergencialidade seria o responsável técnico da empresa contratada.

4. Concorrência 1/2025: contrato de R$ 2 milhões para publicidade

O prefeito cita elementos que classificou como “vícios insanáveis”, como: semelhanças do edital com edital de outro município, subcomissão com conflitos de interesse, atos praticados por comissão antes de sua criação formal, ausência de documentos de transparência no portal oficial, recomendação do controle interno ignorada pela presidência e alegações falsas sobre “parâmetros de anos anteriores”.

5. Dispensa 29/2025: segurança armada sem comprovação de urgência e empresa sem autorização da Polícia Federal

A denúncia aponta que: já havia contrato vigente de vigilância, não existe registro de episódios que justificassem emergência, o contrato teria sido assinado antes mesmo da homologação, a empresa funciona em endereço residencial e não há prova de autorização da PF para atuar com segurança privada.

6. Dispensa 25/2025: empresa de eventos contratada para copeiragem com valores 60% maiores que contrato anterior

Segundo o documento, a empresa, voltada para eventos, não teria aptidão para serviços de copa.

A contratação teria ocorrido: sem comprovação de urgência, com cronograma invertido — contrato antes de parecer e homologação e com preço inflado em relação ao contrato anterior da mesma Câmara.

7. Dispensas 15/2025, 31/2025, 33/2025 e 36/2025: série de contratações da mesma empresa para serviços diversos

A denúncia afirma que a empresa foi contratada para serviços que vão de manutenção de ar-condicionado a projeto de rede lógica, apesar de: endereço inconsistentes entre CNPJ e cadastro, falta de registro técnico no momento da contratação, valores até 570% superiores aos do contrato anterior da mesma Câmara e ausência de comprovação dos serviços supostamente executados.

Impeachment 2.0 mantém pressão sobre prefeito e vice

A escalada desta segunda ocorre seis dias após a Comissão Processante do Impeachment 2.0 aprovar o parecer de Otoniel Gomes (MDB) pelo prosseguimento do processo contra Cristian e João Paulo.

Todos os argumentos das defesas foram rejeitados, e o processo agora segue para a fase de instrução, que pode durar até 90 dias.

O relatório final poderá recomendar a cassação ou arquivamento. Caso seja levado ao plenário, são necessários ao menos 12 votos entre os 17 vereadores — número já alcançado nas votações de admissibilidade.

O mesmo rito pode valer para o caso da presidente, caso o protocolo seja aceito.

O outro lado

Até o fechamento desta reportagem, a presidente da Câmara não havia se manifestado sobre as acusações feitas pelo prefeito, sobre o episódio da garrafa d’água ou sobre o conteúdo da denúncia.

Os demais citados também não responderam.

A íntegra do vídeo-denúncia

Ainda nesta segunda-feira o Seguinte: publica a íntegra do pronunciamento de 1h do prefeito e vice.


LEIA TAMBÉM

Comissão processante aprova parecer e mantém andamento do Impeachment 2.0 contra prefeito e vice de Cachoeirinha

“É uma batalha espiritual”: Após absolvição pela Justiça Eleitoral, Cristian alerta para risco de Cachoeirinha perder investimentos em caso de cassação pela Câmara; leia todas as versões

Renunciar para quê? O absurdo jurídico e político do boato sobre o prefeito Cristian e o impeachment em Cachoeirinha

Participe de nossos canais e assine nossa NewsLetter

Facebook
WhatsApp
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Conteúdo relacionado

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Receba nossa News

Publicidade