RAFAEL MARTINELLI

Quando o ‘povo pelo povo’ cansar, a realidade se impõe: governos terão que manter abrigos, reconstruir e prevenir; O que Zaffa, Leite e Lula estão fazendo

Abrigo no CTG Aldeia dos Anjos, em Gravataí

A Prefeitura de Gravataí está mapeando os mais de 50 abrigos voluntários instalados para socorrer flagelados pelas inundações. O objetivo é fazer um cadastro oficial para poder estruturar o abastecimento e garantir a viabilidade financeira dos atuais abrigos, mas principalmente daqueles disponíveis a funcionar por mais tempo.

Impopular, sei, mas preciso alertar: uma hora o “povo pelo povo” esgota as forças; ao fim deste artigo faço uma advertência sobre o “civil salva civil”.

Reputo governo – municipal, estadual e federal – é mais necessário do que nunca nas zonas de catástrofe do ‘Grande Rio da Região Metropolitana’.

De 2,5 mil abrigados, apenas 150 são do município. Aos demais só resta certeza de ainda possuir o bem maior, a vida. Há gente de cidades arrasadas, como Canoas e Eldorado, além da zona norte de Porto Alegre.

– Estamos preparados para manter famílias por um longo prazo – garantiu o prefeito Luiz Zaffalon, que ao Seguinte: já tinha projetado a necessidade de manter abrigamentos por até 6 meses; leia em Gravataí é uma ilha em meio ao Grande Rio da Região Metropolitana. Uma ‘ilha do bem’; entenda o cenário.

– Ontem providenciei convênio com abrigos para ajudar em despesas como água, luz, gás e etc, usando inicialmente os 500 mil que o governo federal anunciou que vai liberar para Gravataí – informou, sobre a verba de ‘ajuda humanitária’ confirmada pelos ministros Waldez Góes (Integração Nacional) e Paulo Pimenta (Comunicação) sábado, em visita a Gravataí; leia em Ministros em Gravataí: Zaffa pede ‘decreto pandemia’ para Prefeitura socorrer flagelados da inundação; A conta da catástrofe.

Conforme André Brito, diretor da Secretaria de Assuntos para Segurança, que foi designado pelo prefeito para coordenar o acolhimento, os abrigos cadastrados oficialmente, além da garantia de alimentação, vestuário e abastecimento de água, recebem equipes do serviço social, da saúde da família e áreas como psicologia.

A Guarda Municipal também inclui os abrigos nas rondas e segurança presencial.

– Não houve nenhuma ocorrência grave. Não há registros de abusos ou importunações. A maioria dos incidentes acontece entre familiares. Também não tivemos nenhuma denúncia ou comprovação oficial de saques em áreas alagadas – informa.

– O que posso dizer é que essas pessoas, talvez no momento mais difícil de suas vidas, tem vivido em uma harmonia exemplar. Não é fácil a convivência de 100, 150 pessoas, vindas de diferentes lugares e culturas, em um mesmo ambiente. É preciso lembrar que o abrigo não é um lar – acrescenta.

Conforme ele, que é guarda municipal concursado, abrigos onde estão crianças afastadas judicialmente das famílias, mulheres com medidas protetivas ou alvos de facções criminosas tem controle maior pela inteligência da Guarda e órgãos de segurança, como Brigada Militar, Polícia Civil, Ministério Público e Judiciário.

O coordenador confirma a estratégia do governo de cadastrar os abrigos já projetando o fechamento voluntário de alguns.

– No calor da emoção e naquela corrente de solidariedade muita gente queria abrir abrigos para 10, 20, 30, 50 e até 100 pessoas, mas acreditando que seria temporário, por uma, duas semanas. Alertamos que a crise duraria mais. Estamos mapeando os que ficarão abertos por mais tempo, até porque não podemos ficar transferindo, de um abrigo a outro, famílias que já estão traumatizadas – explica.

André Brito garante o abastecimento dos abrigos credenciados e alerta que há fake news sobre a suposta demora na logística da Prefeitura.

– Não demora mais do que uma manhã. Mas como órgão público, precisamos prestar contas. Não acreditem naqueles que falam que tem política na distribuição. A única política aqui é da solidariedade, tanto do governo e dos servidores públicos, quanto pelos milhares de voluntários e doadores de todo país, a quem só temos agradecimentos – diz.

Além dos R$ 500 mil de ajuda humanitária do governo federal (são 200 milhões para todos atingidos no RS), a Prefeitura também aguarda recursos de programa anunciado pelo governo Eduardo Leite que vai destinar R$ 12 milhões para serem distribuídos em abrigos gaúchos.

Sobre obras em Gravataí, Zaffa prepara um plano emergencial – leia em Prefeito Zaffa sonha com um novo Aeroporto Salgado Filho em Gravataí; A ‘Porto Alegre Alta’ que pode emergir da catástrofe – e aguarda o Plano Municipal de Drenagem, que já prevê a necessidade de R$ 300 milhões em obras; leia em Obras anti-alagamento custam investimento dos últimos quatro anos em toda Gravataí; Você está pronto para essa conversa?.

O governador também revogou os decretos que encareceriam o custo da cesta básica dos gaúchos.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também prepara uma ajuda financeira de R$ 5 mil (parcela única) para cerca de 100 mil famílias, em um investimento de R$ 500 milhões, além da inclusão no Bolsa Família de quem foi desabrigado e perdeu o sustento temporariamente, garantindo uma renda mínima de R$ 600.

Os R$ 5 mil por pessoa tem o objetivo de garantir recursos para que as famílias possam recuperar suas casas e adquirirem bens básicos como fogão, geladeira, sofá e camas – o que ajuda a agilizar o retorno de abrigados para suas casas, assim que terminar a inundação.

O governo Lula também suspendeu o pagamento da dívida do Rio Grande do Sul com a União por um período de três anos, o que garante uma folga orçamentária de R$ 11 bilhões exclusivamente para ações de reconstrução. No tuíte abaixo, o jornalista Fernando Horta explica resumidamente, para quem não entendeu. Reproduzo e, abaixo, sigo.

Os próximos anúncios de Lula devem ser relativos ao PAC Desastres, Minha Casa, Minha Vida e socorro às finanças dos municípios, permitindo pedalar dívidas, a previdência e precatórios, além financiamento para os negócios.

Também a ex-presidente Dilma Rousseff anunciou a liberação, a juros abaixo do mercado, de 1,115 bilhão de dólares, o equivalente a 5,75 bilhões de reais, em crédito do NDB, Novo Banco de Desenvolvimento, também conhecido como Banco dos Brics, o qual preside, para o governo gaúcho enfrentar o estado de calamidade pública.

Ao fim, são diários os anúncios e esforços dos entes de estado. A frase “o povo pelo povo” pode ser bonita, mas há uma realidade que se impõe.

Reduzir a importância dos governos só serve a aproveitadores políticos, que torcem pelo caos e o criam, com fake news, com objetivo de tirar a credibilidade das instituições democráticas e bagunçar ainda mais o país.

Por vezes, ainda mais em ambientes de convulsão social e em determinados territórios, “o povo pelo povo” pode ser uma senha para um faroeste, onde se rasga o contrato social e aí impera o “salve-se quem puder!” – invariavelmente, o mais forte, mesmo que por meios escusos.

Fato é que, além de ser o futuro executor das obras estruturais necessárias, de reconstrução e prevenção para que a catástrofe não se repita, é o ‘estado’ que será o responsável pelos flagelados quando voluntários cansarem, esgotarem seus recursos ou mesmo tiverem que reconstruir suas casas, negócios, ou cuidar de familiares atingidos.

A cobrança tem que ser feita sobre o ‘estado’, não a decretação de sua inexistência.

Associo-me ao que disse a jornalista Daniela Lima na GloboNews, alertando sobre as forças obscuras que estão por trás dessa história do “civil salva civil”, e de que “o estado nada faz” ou “o estado só atrapalha”.

Assista.

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