1. Amar a Deus sobre todas as coisas.
A ideia é singela: se Deus é amor, amando Deus, amaremos a todas as suas criaturas. Três páginas de qualquer livro de História demonstram que ou Deus não é amor ou não foi levado a sério. Os que apregoam seu amor a Deus, como o povinho do Vaticano e das infinitas igrejas, realmente são recompensados: não pagam impostos e enriquecem com a crença dos fiéis. Vira e mexe, o amor que sobra é o amor à grana. Incrível que Deus deixe isso rolar há tantos séculos.
2. Não tomar Seu santo nome em vão.
Deus sempre foi invocado pra justificar todo tipo de crime, desde queima de judeus pela Inquisição espanhola à venda de lugar garantido no céu. A maioria absoluta de ditadores sanguinários se dizia (se diz) devota a Deus e a seus mandamentos. Poucos desses ditadores foram punidos enquanto vivos. Como as notícias que temos sobre o que se passa depois da morte são incertas, pra dizer o mínimo, melhor não levar em conta. De qualquer forma, Deus devia providenciar justiça em vida, pelos menos pra reforçar a propagando da sua causa.
3. Guardar domingo e festas de guarda.
Isso foi substituído pelo futebol e o programa do Faustão sem que se tenha notado diferença no destino da humanidade.
4. Honrar pai e mãe.
Mesmo que pai e mãe sejam um Temer, uma Margareth Thatcher, um Cunha, um Serra? Ou os Nardoni? Eis um mandamento que parece escrito por pais inseguros e autoritários.
5. Não matar.
Como é que é? Deus oferece o mais lucrativo de todos os negócios e depois espera que ninguém queira lucrar? Com quem este cara pensa que está lidando?
Passo a palavra a Muniz Bandeira:
“Os EUA gastam 900 bilhões de dólares por ano com as instalações militares e serviço de inteligência, entre outras despesas. De 2001 a 2016, gastaram cerca de 4,7 trilhões apenas nas guerras no Afeganistão e no Iraque, segundo estudo realizado na Brown University. Com a sua ‘arrogância imperial’, para usar um termo do professor Jeffrey Sachs, da Columbia University, produzem um massivo déficit público”.
6. Não pecar contra a castidade.
Ao contrário do que dizem, a carne não é fraca. É forte, muito forte – a carne, mesmo com uma das mãos amarrada, dobra as determinações de muito crente durão. Não por nada a fila de padrecos pedófilos é interminável.
O pior é que o pecado masculino contra a castidade é encarado como natural. Paciência, o fulano precisava trocar o óleo, sabe como é. Mas se o pecado é feminino, pode dar morte, apedrejamento e outras formas de enquadramento moral.
A única mulher que conseguiu levar vantagem nesse imbróglio foi a Virgem Maria. Veja bem, virgem, quando a dona era casada fazia tempo e foi barriga de aluguel de Deus. As Sagradas Escrituras não dizem nada sobre o hímen de Maria logo após o parto. Imagino que esteja intacto até hoje.
7. Não roubar.
A lei de Deus, dizem, vale pra todos, ou Deus não joga mas fiscaliza. A lei dos homens é aquela bagunça conhecida de todos nós. Não faz muito, um sujeito que roubou uns salames foi considerado perigosíssimo pelo juiz e foi condenado à cadeia; os policiais que executaram mais de cem presos foram inocentados; juíza que recebia grana de traficante foi condenada impiedosamente à aposentadoria com vencimentos integrais; e enquanto isso, no desgoverno Temer…
8. Não levantar falso testemunho.
Não só é permitido como ainda se premia. Vide Curitiba e arredores, isto é, Oiapoque, Supremo, Chuí. Vide a imprensa escrita e televisada que fez disso um grande e complexo negócio.
9. Não desejar a mulher do próximo.
Decididamente Deus não entende de biologia. Se o mandamento fosse “Não passarás a mão (ou algum outro membro) na bunda da mulher do próximo”, ainda dava pra considerar. Pensando bem, porque este mandamento exclui as mulheres, exceto as lésbicas? Ou Deus acha que as mulheres não desejam nunca os homens das próximas ou acha que são um caso perdido que nem merece consideração. Isso começa a cheirar a perseguição.
10. Não cobiçar as coisas alheias.
Não é redundante? Ou esqueceram que não é pra roubar?
É o mesmo caso de não desejar a mulher do próximo. Deus tem medo não só dos fatos, mas dos desejos humanos. Me parece que estamos diante de mais uma prova de que o homem não foi feito à imagem e semelhança de Deus. Se fosse, não precisava de regras, ainda mais idiotas como esta, incapaz de levar em conta a psicologia mais tosca.
Ou Deus é como nós, só que com superpoderes, tipo onisciência e onipresença. Minha nossa! Um homem com superpoderes, como qualquer leitor da Marvel sabe, é um perigo.
Ernani Ssó é escritor, vive em Porto Alegre. Colabora com os sites Coletiva Net e Sul21, e virou colaborador fixo do Seguinte:
A carica do colunista na capa do site é do Cado, caricaturista gaúcho.