RAFAEL MARTINELLI

‘Sangue’ na B3: R$ 6,6 bi em 75 minutos antes do tarifaço de Trump que atinge RS — e Gravataí

Arte de rua de Banksy

“Compre quando há sangue nas ruas, mesmo que o sangue seja o seu”, é uma frase creditada a Baron Rothschild, sobre o mercado financeiro, um mundo onde o acaso raramente é inocente. Quando uma sequência de operações bilionárias acontece em questão de minutos, logo antes de um evento político com forte impacto econômico, os alarmes devem soar. E não apenas nos escritórios da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mas também nas instituições de Estado responsáveis por garantir a soberania e a integridade econômica do país.

Foi exatamente isso que ocorreu em 9 de julho, quando R$ 6,6 bilhões em contratos futuros de dólar foram negociados em apenas 75 minutos na B3, a bolsa de valores brasileira — horas antes do chamado ‘tarifaço’ imposto por Donald Trump contra o Brasil.

O Rio Grande do Sul é o segundo estado mais prejudicado pelo tarifaço de 50% que Donald Trump ameaça impor aos produtos brasileiros, com perdas estimadas em R$ 1,9 bilhão, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Para usar um exemplo de Gravataí, empresas como a Prometeon –– que tem os EUA como principal cliente de pneus –– estão no caminho do atropelo pela sanção com base na premissa mentirosa de que os EUA teriam prejuízo comercial com o Brasil. A GM mundial, sem detalhar a operação gravataiense e brasileira, projeta redução de lucro em US$ 5 bilhões por conta de tarifas de Trump mundo afora.

Essas transações concentradas na B3, que envolvem nomes como BTG Pactual, BGC Liquidez e Tullett Prebon, não são apenas volumosas. São, sobretudo, oportunas demais para não levantarem suspeitas. A reportagem de Cleber Lourenço e Deborah Magagna para o ICL Notícias expõe o núcleo do problema: ordens incomuns, em sequência, com alta exposição e riscos enormes — tudo isso justo antes de um anúncio que alterou o câmbio e, por consequência, o valor de bilhões de reais em contratos.

É evidente que grandes operações no mercado fazem parte da rotina de fundos, bancos e corretoras. Mas quando múltiplos ‘players’ realizam ordens de milhares de contratos de dólar futuro — alguns acima de 4 mil contratos, algo considerado raríssimo, segundo especialistas — isso precisa ser tratado não como uma coincidência, mas como um possível sinal de crime financeiro: insider trading, ou uso de informação privilegiada.

A Advocacia-Geral da União (AGU) já pediu a investigação dessas transações ao Supremo Tribunal Federal (STF), e o Congresso se articula para criar uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI). Ambos os movimentos são não apenas desejáveis, mas imprescindíveis. O que está em jogo vai muito além de operações suspeitas na Bolsa: trata-se da possível utilização do mercado financeiro como ferramenta de sabotagem econômica.

Parlamentares como o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) apontam para algo ainda mais grave — uma articulação transnacional, com envolvimento direto de atores políticos brasileiros ligados ao bolsonarismo e à extrema direita dos EUA. A corretora BGC Liquidez, por exemplo, é controlada por Howard Lutnick, atual Secretário de Comércio sob a gestão Trump. Além disso, há declarações públicas do deputado filho de golpista Eduardo Bolsonaro e do influencer neto de ditador Paulo Figueiredo admitindo que já sabiam das sanções com antecedência — revelações feitas em entrevista ao podcast Inteligência Ltda. Isso não é trivial: é uma confissão velada de que o tarifaço era previsível para alguns, enquanto o restante do país operava no escuro.

O economista Eduardo Moreira, fundador do Instituto Conhecimento Liberta (ICL), foi claro: “Insider trading fere o princípio de isonomia dos mercados”. É uma prática ilegal porque distorce a lógica da livre concorrência. Aqueles que detêm informação privilegiada conseguem ganhos exponenciais enquanto os demais investidores, inclusive o Tesouro Nacional, arcam com os prejuízos.

No caso das operações do dia 9 de julho, não se trata apenas de ilegalidade. Trata-se de um possível ataque coordenado à economia brasileira, com uso de ferramentas sofisticadas de guerra híbrida — como define a nota da liderança do PT. Quando um parlamentar brasileiro e um lobista estrangeiro atuam deliberadamente para impor sanções contra o próprio país, e isso coincide com movimentos suspeitos no mercado, estamos diante de algo mais profundo: uma tentativa de desestabilização do Estado via instrumentos financeiros.

Esse episódio precisa de investigação profunda, com quebra de sigilos bancários e fiscais, responsabilização de agentes e, se necessário, cooperação internacional com a SEC (a CVM americana), que também já foi acionada após denúncias feitas pelo gestor Spencer Hakimian. Ele apontou movimentações semelhantes em Wall Street, com lucros de até 50% em poucas horas, como revelou no Brasil o jornalista Luis Nassif. Segundo Hakimian, a administração Trump é “a mais abertamente corrupta de todos os tempos”.

O Brasil precisa, mais do que nunca, demonstrar que não é terra de ninguém. O mercado financeiro não pode ser um playground para elites políticas e econômicas que operam com informações sigilosas e destroem a confiança nas instituições. Os crimes de colarinho branco, se comprovados, devem ser punidos com a mesma severidade dos ataques explícitos à democracia. Porque minar a economia nacional por dentro, lucrando com o caos, é também uma forma de golpismo.

E o recado do Estado deve ser firme: ninguém — ninguém — vai lucrar impunemente com a sabotagem da soberania brasileira.


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