Uma ‘não notícia’ acendeu o alerta em Gravataí, que já tratei em janeiro em A GM vai embora de Gravataí; O ’Tchau, Ford!’ e nós, artigo que precisa ser lido além da manchete.
Políbio Braga, jornalista gaúcho com trânsito na montadora e convidado para viagens como ao Pantanal, escreveu terça:
– A GM nega peremptoriamente que esteja determinada a fechar seu complexo automotivo de Gravataí, RS, concentrando toda a produção em São José dos Campos.
Bastou para o vereador Dilamar Soares suspeitar:
– Onde há fumaça há fogo.
O vereador é talvez o político da aldeia que mais adverte para os riscos da ‘GMdependência’, como já tratei em artigos como O contágio da GM e o favelão Gravataí; O Dom Quixote de la Aldeia.
Antes de verificar se tem acidente no fim da freada, justifico a manchete alarmante sobre o ‘favelão’.
Quase metade da arrecadação municipal (o orçamento está próximo de R$ 1 bi, sem contar os R$ 3 bilhões produzidos e a empregabilidade que influenciam no PIB, o dinheiro que circula na economia local), advém da arrecadação referente aos impostos gerados pela venda dos carros fabricados no complexo automotivo do Parque dos Anjos.
Como o impacto do retorno dos tributos chega a pleno dois anos depois, Gravataí sentirá a falta de anticorpos para suportar o contágio econômico da pandemia em 2020 e 2021, já que montadora parou, ou reduziu a produção a um terço, por 10 dos últimos 12 meses.
O PIB inevitavelmente caiu contagiado pela crise do coronavírus, como detalhei na semana passada em Tombo do PIB na pandemia custa a Gravataí um ano de hospital; ou 8 Pontes do Parque.
Se a cúpula da General Motors descarta “peremptoriamente” um pinote do Brasil, como aconteceu com a Ford, fato é que os planos já anunciados pela montadora são de, até 2035, encerrar a produção de veículos movidos a combustão e passar a produzir apenas veículos leves (incluindo picapes e SUVs) movidos por eletricidade ou outro combustível sem emissões, como hidrogênio.
A fabricante norte-americana também ampliou o investimento em modelos elétricos e autônomos em 35%, ou US$ 27 bilhões (R$ 146 bilhões) nos próximos cinco anos.
Conforme informações da Fundação Perseu Abramo, para o Brasil, a GM confirmou que a eletrificação irá se repetir no mesmo prazo, tornando-se assim a primeira fabricante no país a formalizar a aposentadoria de carros a combustão. Mas ainda não se manifestou se as medidas implicarão no encerramento integral da produção da GM no Brasil ou se a marca montará modelos elétricos nas unidades de Gravataí e São José dos Campos e São Caetano do Sul, em São Paulo.
O estudo aponta que o grande problema de se produzir um veículo elétrico em série no Brasil é que isso jamais ocorreu. Houve apenas experimentos pontuais que começaram com a Gurgel e culminaram na montagem de algumas unidades do Renault Twizy no Paraná. A adaptação dos parques industriais exigiria investimentos pesados.
Mais: a cadeia de fornecedores seria outro problema, já que a maioria dos componentes do trem de força dos veículos elétricos é importada, incluindo a caríssima bateria de íon-lítio. Por conta dos valores, a nacionalização dessas peças só seria possível em um trabalho conjunto com governo, instituições de pesquisa e desenvolvimento, faculdades e empresas.
Essa conjunção de esforços é improvável no momento em que a área nacional de pesquisa e inovação sofre séria ameaça com seguidos cortes de recursos federais por parte do governo Jair Bolsonaro.
Como conclusão o estudo aponta que as políticas globais de mobilidade elétrica das grandes empresas são ajustadas para cada região, considerando limitações de investimento, linhas de montagem e valor médio dos veículos novos; por isso a surpresa da GM oferecer no Brasil só carros elétricos em 14 anos.
O único elétrico da marca vendido no país é o Bolt, por altíssimos R$ 260 mil, que o jornalista Silvestre Silva Santos e o cinejornalista Guilherme Klamt, do Seguinte:, detalharam em COM VÍDEO | Testamos o carro elétrico da GM.
Considerando que o hatch é o elétrico mais barato da GM também nos Estados Unidos, a melhor alternativa para oferecer um modelo eletrificado por um valor mais atraente seria montá-lo no Brasil — ou trazê-lo do México e Argentina, para evitar os 35% de imposto de importação. Ou, na pior das hipóteses, encerrar a produção de veículos no Brasil, seguindo o caminho da Ford.
Ao fim, perfeita é a alegoria do burro e do cavalo, lembrada por Dilamar na sessão da Câmara desta terça. O burro pede ajuda para o cavalo para ajudar a transportar parte da carga, mas o cavalo nega, até o burro arriar e o cavalo ter que carregar sozinho.
– Em 2024 – alertou o vereador, usando como corte o próximo ano de eleição para prefeituras – o peso insustentável pode estar lá para carregar, seja o burro ou o cavalo.
Como jornalismo é dar nome às coisas, inevitavelmente a primeira carga a ser dividida é a da previdência municipal, como já alertei em GM parada custa 1 Ponte do Parque por mês; Antecipo o remédio amargo de Zaffa. Logo o prefeito Luiz Zaffalon envia o projeto à Câmara de Vereadores. Se com GM o déficit de R$ 1 bi para pagar aposentadorias do funcionalismo inviabiliza as contas de Gravataí em 15 anos, sem a GM para os que estiverem vivos…
Parafraseando Carville: "É a pandemia estúpido!".
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