opinião

Só há vilões na crise venezuelana; vergonhas a débito e crédito

Leitores canhotos, destros e isentões me provocaram durante o sábado, cobrando um artigo sobre a ‘guerra’ com a Venezuela.

Comento.

O Brasil se meteu em uma arapuca, um vexame diplomático para o governo Jair Bolsonaro, que só não é pior do que essa bestial Guerra Ideológica Nacional, travada no Grande Tribunal das Redes Sociais por mal informados e informados do mal.

Ou a ideia era estourar essa bomba de efeito moral?

Parênteses: sobre o PT, perguntem a Gleisi, que foi à posse de Nicolás Maduro. Não é um petista quem governa o país, nem soube eu de Lula ter bancado o Gauidó e se autodeclarado presidente sem eleição em cima da esteira de ginástica de sua solitária em Curitiba.

Quem desnecessariamente nos presenteia com esse momento lamentável, com apenas 50 dias de governo, é o ‘mito’, que em Gravataí recebeu sete de cada dez votos.

Vamos aos fatos, os chatos que atrapalham argumentos, canalhices preconcebidas, grenais ideológicos e posts infantis exortando mais burrice e ódio.

A fala do general vice-presidente diz muito sobre os militares não concordarem com os civis do bolsonarismo que fizeram o Brasil entrar nessa de servir como cavalo de Tróia para uma suposta ajuda humanitária – que nada mais é do que pressão externa sobre a soberania de um país vizinho que, além de ter um exército muito mais bem armado que o nosso, tem condições de resolver seus próprios problemas.

Ah, mas a Venezuela vive uma tragédia! Sim, aqui também, sabia? Só para lembrar, no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), elaborado pela ONU, e que leva em consideração a esperança de vida da população, a escolaridade e o PIB per capita dos países do mundo para elaborar um ranking entre 0 e 1, a campeã Noruega tem, 0,944. A Venezuela é a 71º, com 0.767. O Brasil? Levamos 7 a 1: somos o 79º, com 0.754.

– Nos pautamos pela não intervenção. O problema interno da Venezuela tem que ser resolvido pelos venezuelanos – sensatamente disse à BBC Hamilton Mourão, enquanto o presidente aplaudia, do ‘gabinete de crise’, seu chanceler Ernesto ‘I Love Olavo’ Araújo enviar à fronteira e ver retornarem meia dúzia de caminhões com comida e remédios para colaborar com a afronta patrocinada por Trump contra Nicolás Maduro.

O que ganha o governo brasileiro, além do risco de tiros atravessarem as fronteiras, vindos de armas chinesas ou russas? O que faríamos em caso de um acidente desses? Ou qual seria a postura do Brasil em uma intervenção trumpista na Venezuela, armando rebeldes ou em um, pelo menos até agora, impensável bombardeio, o que provocaria o antagonismo de Rússia e China?

Se Maduro cair, o que parece cada vez mais inevitável pela própria pressão, certa ou errada, das ruas venezuelanas, é Trump quem comemora. Se ficar, como Bashar al-Assad na Síria, o fiasco diplomático resta aos lindeiros Brasil e a Colômbia, prepostos metidos nessa enrascada enquanto suas economias não crescem um digito.

– O roteiro de Trump tem um monte de coisas parecidas com Cuba – resumiu à BBC News Mundo Michael Shifter, presidente do Diálogo Interamericano, um centro de pesquisas sobre a região com sede em Washington.

Quem está gostando disso só pode estar louco ou completamente alienado. O que está acontecendo na Venezuela há tempos passa longe das ideologias. É mais uma guerra entre gangues num país que tem a maior reserva de petróleo do mundo: 297,7 bilhões de barris, de 1532,0 do mundo todo.

Não parece óbvio o interesse geopolítico dos norte-americanos? Se fosse por ajuda humanitária, poderiam rezar pelo Haiti. Democracia? Não existe há mais de mil e uma noites na Arábia. Falemos sério…

Os números mostram que Hugo Chávez se tornou presidente de um país estagnado, de inflação elevada, desigual e com elevado índice de pobreza. Em 1998, o IDH era de 0,489. Sob sua presidência, entre 99 e a morte em 2013, o índice subiu até chegar ao 0,771. Se no período o PIB crescia em média 1% ao ano, nos últimos três anos de Maduro a retração chegou aos 18%.

Bom, então Chávez era Simon Bolívar, e Maduro não entendeu direito o passarinho pelo qual disse ter o falecido se comunicado com ele? Nem uma coisa, nem outra. Esse pensamento binário não funciona na vida real, aquela que se vive fora das redes sociais ou da paixão das campanhas eleitorais. E, ademais, quem tem que decidir qual o melhor canalha para governar o país é o povo venezuelano. Se a oposição denuncia fraude eleitoral, também há depoimentos em contrário, como do juiz gaúcho André Luis de Moraes Pinto, enviado pela Associação Juízes para a Democracia, que classificou o sistema eleitoral como "exemplarmente blindado a fraudes".

Fato é que a tragédia econômica da Venezuela, de inflação projetada em 10 milhões por cento (!), foi provocada pela total dependência da exportação do petróleo, cujo preço do barril hoje vale menos da metade do que nos anos chavistas, e amplificada pelas sanções econômicas dos que hoje oferecem ajuda humanitária e incentivam uma crise política cada vez mais insustentável.

Ao fim, da observação sobre o passado da Venezuela como paupérrimo quintal dos EUA, e do presente onde, em troca do amor bolivariano a Maduro, quem mexe com o dinheiro do petróleo são os militares, ao que parece testemunhamos não mais do que uma viscosa disputa de facções.

A quem interessar possa não passar vergonha no débito ou crédito das redes sociais, certeza apenas que a lamentável crise venezuelana vai além de memes de Facebook ou crazy news de WhatsApp.

Não achei os mocinhos ainda, só vilões.

Ah, e as vítimas de sempre.

A verdade entre elas.

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