Está na moda atropelar a fiscalização de trânsito usando como habeas corpus a ‘indústria da multa’. É coraçãozinho certo no Grande Tribunal das Redes Sociais. Danem-se as estatísticas. Até ser o próprio, ou de alguém próximo, o sangue nas ruas é dos outros. Mais importantes parecem os Ks medidos pelo Google Analytics no perfil de Facebook.
Trato disso porque, em Cachoeirinha, os vereadores de Cachoeirinha Marco Barbosa, Jaqueline Ritter e Rubens Otávio pedem ao Ministério Público apuração sobre a "falta de estudos para a definição dos locais, retirada de equipamentos e ainda a análise anual que seria necessária para ser decidido se os pardais devem ser mantidos ou retirados", como informa o site O Repórter.
Joaquim Fortunato, secretário de Mobilidade Urbana, e a diretora Tatiana Boazão garantem que os estudos existem e serão publicados no site da Prefeitura.
Nada preocupa mais os parlamentares?
Fica bastante parecido com o presidente Jair Bolsonaro, que parece assobiar e andar para projetos como a reforma previdência, estacionando no Congresso para apresentar um projeto que é um ‘liberou geral’ para a imprudência – e pelo qual deveria ser responsabilizado por homicídio culposo, a cada crescimento percentual no número de acidentes no trânsito.
Parece-me óbvio que se uma via é sinalizada para determinada velocidade, só é multado quem ultrapassa o limite, como, registre-se, aconteceu com o ‘mito’ e com a primeira-dama Michelle, por exemplo, que já excedeu o número atual de pontos, que agora o marido dobra e, como disse ontem, gostaria de triplicar.
A história da extinção de multa para quem não carrega a criança na cadeirinha é a prova da tragédia destes tempos.
Vamos aos fatos, os chatos que atrapalham argumentos:
Informa o Globo que “desde que foi determinada em 2008 a obrigatoriedade da cadeirinha adaptada para o transporte de crianças com até sete anos e meio de idade, o número de mortes na faixa etária de 0 a 7 anos no trânsito caiu no país. O total de indenizações por morte pagas pelo DPVAT, por exemplo, registrou queda de 60%, de 1.703 casos, em 2008, para 680, no ano passado, segundo dados da administradora do seguro”.
Informa o Estadão que “das crianças que morrem hoje no trânsito brasileiro, 40% estavam na condição de ocupantes de veículos, sendo hoje a principal forma de óbito desse público no País. Atropelamentos vêm na segunda colocação, representando 32% do total de mortes. Números de 2017 do Datasus, plataforma de dados do Ministério da Saúde, mostram que do total de 697 crianças até nove anos que morreram por acidentes de trânsito no Brasil, 279 estavam dentro de veículos (automóvel, triciclo motorizado, caminhonete, veículo de transporte pesado e ônibus). Naquele ano, foram registrados 221 óbitos desse público por atropelamento (32%). Como terceira principal razão, representando 18% das mortes de crianças, está a categoria "outros": veículos de tração animal como carroça, veículos de uso agrícola como trator e veículos não especificados por imprecisão da informação no momento de preenchimento dos dados”.
É um exagero comparar os dois casos? Sim. Mas inegável é que uma ação existe como consequência da outra. Bolsonaro joga para a torcida porque políticos, páginas de redes sociais e cidadãos de bem transformaram em verdade a pós-verdade da tal ‘indústria da multa’.
Só falta ser apresentado projeto “solicitando a Egrégia Casa Legislativa que vidas perdidas no trânsito sejam registradas como morte natural”. Apesar de que, com projeto ou não, a aceleração desse pensamento irresponsável ainda levará a essa realidade.
Não ajudem a passar pano nos imprudentes, vereadores!
Dá likes, rende votos, mas ameaça vidas.
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