O vídeo, postado sexta-feira pelo ministro Paulo Pimenta, defendendo a conclusão da duplicação da ERS-118 como “obra de logística mais importante a ser feita no Rio Grande do Sul” e considerando “um “equivoco” pedagiar a rodovia, não foi um anúncio de investimento do governo Lula na obra.
Assista ao vídeo, gravado às margens da rodovia, e, abaixo, explico.
No momento mais crítico das enchentes que enfrentamos, a RS-118 se tornou o principal corredor humanitário do estado. A duplicação da via é imprescindível para evitar que cidades fiquem isoladas em situações de emergência. Uma obra que vai proporcionar desenvolvimento e garantir… pic.twitter.com/9m20DIfFco
— Paulo Pimenta (@Pimenta13Br) July 6, 2024
Para quem prefere ler, decupo o vídeo, no qual o ministro extraordinário de Apoio a Reconstrução do Rio Grande do Sul disse que a duplicação dos 16 quilômetros que ligam Gravataí e Viamão “é obra de logística mais importante a ser feita no Rio Grande do Sul”.
“Agora, no momento mais crítico da tragédia, ela se tornou o principal corredor humanitário da região metropolitana”, lembrou, acrescentando que “a duplicação dessa obra vai trazer desenvolvimento para uma região que tem enorme potencial de crescimento industrial e comercial, além de resolver o problema da mobilidade urbana”.
“São milhares de pessoas que se deslocam todos os dias de Viamão, de Alvorada… Essa obra é uma obra urbana, portanto seria um grande equívoco imaginar ela ser feita com pedágio”, disse ainda, seguindo: “É uma obra prioritária para a reconstrução do RS, porque ela é uma via alternativa para que a gente nunca mais viva uma situação como nós vivemos. Porto Alegre ficou trancada, sem aeroporto, sem rodoviária, sem acesso, e toda região metropolitana se deslocava por aqui”.
“Essa é uma obra prioritária. Do ponto de vista da logística não há nenhuma obra mais importante do que essa no Estado do Rio Grande do Sul: a duplicação da ERS-118”, concluiu.
As declarações de Pimenta causaram dúvidas no grupo de WhatsApp do Movimento RS 118 Sem Pedágio. Seria um anúncio de recursos do governo federal, ou uma ‘federalização’ de uma rodovia que o governador Eduardo Leite (PSDB) incluiu nas metas de parcerias público-privadas (PPPs) divulgadas pela Secretaria de Parcerias e Concessões do Estado (Separ)?
A deputada estadual Stela Farias (PT), que organizou agenda na qual o RS 118 Sem Pedágio entregou ofício ao ministro, o que reportei em RS 118 Sem Pedágio ganha ‘apoio’ do ministro Pimenta; O sonho, a realidade e o advogado do diabo, mais uma vez, enviou áudio ao grupo.
– Não é um anúncio – alertou, explicando que o ministro “comprou a pauta” e se “comprometeu a fazer a defesa da obra” dentro do fundo de recuperação do RS.
– Convencemos o Ministério – disse a parlamentar.
Sigo eu, mais uma vez encarnando o ‘advogado do diabo’, como em uma série de artigos sobre a polêmica da 118, como Governo Leite confirma projeção de ‘pedágio gourmet’ em bloco onde estão ERS-118 e ERS-020 de Gravataí; O advogado do diabo ; Audiência pública: ninguém quer pedágio e Leite é “mentiroso”. Ok, mas o que fazer da ERS-118?; O advogado do diabo ; Patrícia Alba e os ‘antipedágio’ propõe custear restante da duplicação da ERS-118 com emendas parlamentares; Ainda, o advogado do diabo e o mais recente em março, quando reportei a viagem na qual a deputada estadual de Gravataí Patrícia Alba (MDB), representando o RS 118 Sem Pedágio, apresentou a parlamentares em Brasília o projeto de duplicação com custeio por emendas de bancada e individuais; leia em Patrícia Alba representa RS 118 Sem Pedágio em Brasília na busca por emendas parlamentares para custear duplicação entre Gravataí e Viamão; O advogado do diabo, mais uma vez.
Em resumo, nos textos sobre a ameaça do pedágio no trecho urbano cobro a apresentação de soluções daqueles que fazem oposição à privatização da rodovia, para além das críticas à verdade múltipla do governador que disse na campanha que não pedagiaria, mas incluiu a rodovia em estudos do plano de parcerias-público privadas.
Inegável é que o Movimento 118 Sem Pedágio busca alternativas. Se não para manutenção da rodovia, para a duplicação do trecho de 16 quilômetros da ERS-118, entre Gravataí – no entroncamento com a Freeway –, e o acesso à ERS-040, em Viamão, sem a necessidade de pedagiamento.
Insisto, porém, há uma distância maior que 16 quilômetros entre o sonho e a realidade.
O custo dos 21 quilômetros já duplicados tinha orçamento inicial de R$ 70 milhões, apesar de, pelos escandalosos 20 anos pelos quais se arrastaram as obras, ter consumido 400 MILHÕES!.
Pela proposta pré-enchente, seria preciso captar pelo menos R$ 50 milhões em emendas parlamentares ao longo das obras. Para efeitos de comparação, a bancada federal gaúcha indicou no Orçamento-Geral da União para 2024 cerca de R$ 300 milhões para 17 prioridades.
Escrevi: “Sou eu o chato, ou é uma complicada engenharia política mobilizar 33 deputados, parte do interior do Estado, para captar R$ 50 milhões para duplicar a rodovia?”.
Agora, no pós-enchente, a nova alternativa é apelar para o governo federal fazer a obra. No vídeo, Pimenta se compromete publicamente em defender a duplicação, mesmo que sem explicitar como. Considera a “obra de logística mais importante a ser feita no Rio Grande do Sul”, num rol de investimentos para reconstrução do RS que inclui dinheiro para proteção contra enchentes, casas para quem perdeu tudo, reconstrução da infraestrutura de cidades inteiras e socorro aos negócios, cujos cálculos chegam a impalpáveis DUZENTOS BILHÕES.
“Difícil, não?”, questionei no último artigo. A associação de Pimenta à prioridade da duplicação me faz responder de forma um pouco mais otimista: “fácil não é”.
Entretanto entendo, sem dúvida nenhuma, que politicamente o RS 118 Sem Pedágio já se pavimentou. Atrair o apoio de Pimenta ‘duplica’ o movimento contra o ‘pedágio gourmet’ que o governo Leite vai sim propor para a 118 – não só para completar o trecho que falta, mas, principalmente, sob argumento de que o DAER não tem orçamento para manutenção da rodovia.
Pressiona o governador a deixar claro para a sociedade se o pedágio é ou não sua convicção.
Ao fim, restam apresentadas, em 2024, duas alternativas, para pelo menos parte do problema: a conclusão da duplicação. Uma, com dinheiro da bancada gaúcha no Congresso, outra bancada pelo governo Lula.
Sem torcida ou secação, reputo ainda restam mais próximas do sonho que da realidade, mas positivas para o debate sobre a ‘privatização à brasileira’ da ERS-118: aquela que após R$ 400 milhões em investimentos públicos na duplicação – e, agora, mais a elevada em Gravataí, de R$ 27 milhões, e a iluminação completa, por R$ 20 milhões –, entrega a rodovia para exploração pela iniciativa privada.